Resolução do Parlamento Europeu, de 13 de dezembro de 2018, sobre a tecnologia de cadeia de blocos: uma política comercial orientada para o futuro (2018/2085(INI))
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta o artigo 207.º, n.º 3, e o artigo 218.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE),
– Tendo em conta o Acordo Geral sobre o Comércio de Serviços,
– Tendo em conta o Acordo sobre as Tecnologias da Informação da Organização Mundial do Comércio (OMC),
– Tendo em conta o Programa de Trabalho da OMC sobre o comércio eletrónico,
– Tendo em conta o Acordo de Facilitação do Comércio da Organização Mundial do Comércio (OMC),
– Tendo em conta a Convenção de Quioto Revista da Organização Mundial das Alfândegas,
– Tendo em conta a sua resolução, de 26 de maio de 2016, sobre moedas virtuais(1),
– Tendo em conta a sua resolução, de 5 de julho de 2016, sobre uma nova estratégia inovadora e orientada para o futuro em matéria de comércio e investimento(2),
– Tendo em conta a sua resolução, de 12 de dezembro de 2017, «Rumo a uma estratégia comercial digital»(3),
– Tendo em conta a sua resolução, de 16 de maio de 2017, sobre a avaliação dos aspetos externos do desempenho e da gestão das autoridades aduaneiras como instrumento destinado a facilitar o comércio e a combater o comércio ilícito(4),
– Tendo em conta a sua resolução, de 12 de setembro de 2017, sobre o impacto do comércio internacional e das políticas comerciais da UE nas cadeias de valor mundiais(5),
– Tendo em conta a Declaração Conjunta sobre o comércio e a capacitação económica das mulheres, adotada por ocasião da Conferência Ministerial da OMC, em Buenos Aires, em dezembro de 2017(6),
– Tendo em conta o Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de abril de 2016, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados e que revoga a Diretiva 95/46/CE (Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados ou RGPD)(7),
– Tendo em conta a proposta da Comissão sobre as disposições horizontais aplicáveis aos fluxos de dados transfronteiras para fins da proteção de dados pessoais (em acordos comerciais e de investimento da UE),
– Tendo em conta o relatório da Comissão ao Parlamento Europeu, ao Conselho, ao Comité Económico e Social Europeu e ao Comité das Regiões sobre a implementação da estratégia de política comercial «Comércio para Todos - Uma política comercial progressiva para controlar a globalização» (COM(2017)0491),
– Tendo em conta o relatório do conselheiro científico principal do Serviço Científico do Governo do Reino Unido, de 2016, «Distributed Ledger Technology: beyond blockchain» (Tecnologia do livro-razão distribuído: para além da cadeia de blocos)(8),
– Tendo em conta o Livro Branco do Centro das Nações Unidas para a Facilitação do Comércio e o Comércio Eletrónico (UN/CEFACT) sobre as aplicações técnicas da cadeia de blocos, de 2018,
– Tendo em conta a declaração, de 10 de abril de 2018, de 21 Estados-Membros da UE e da Noruega sobre a criação de uma parceria europeia para a cadeia de blocos(9), após a qual cinco outros Estados-Membros aderiram à parceria, aumentando o número atual para 27 países signatários,
– Tendo em conta o lançamento pela Comissão do Observatório e Fórum da UE para a Tecnologia de Cadeia de Blocos, em 1 de fevereiro de 2018(10),
– Tendo em conta as conclusões do Conselho de 19 de outubro de 2017(11),
– Tendo em conta o artigo 52.º do seu Regimento,
– Tendo em conta o relatório da Comissão do Comércio Internacional, bem como os pareceres da Comissão da Indústria, da Investigação e da Energia e da Comissão das Liberdades Cívicas, da Justiça e dos Assuntos Internos (A8-0407/2018),
A. Considerando que, para efeitos do presente relatório, "cadeia de blocos" é entendida, salvo indicação em contrário, como uma tecnologia do livro-razão distribuído privada e autorizada, que consiste numa base de dados constituída por blocos sequenciais de dados que são acrescentados em consenso com os operadores de rede;
B. Considerando que os diversos estudos de caso e indústrias obterão diferentes serviços de uma mistura de cadeia de blocos privadas/públicas, autorizadas/não autorizadas;
C. Considerando que cada bloco numa cadeia de blocos contém um algoritmo que verifica os dados de blocos anteriores, o que permite a diferentes partes realizarem transações com uma confiança e responsabilidade acrescidas, uma vez que os dados armazenados num livro-razão não podem ser facilmente falsificados;
D. Considerando que a tecnologia da cadeia de blocos de fonte aberta é a base para a ascensão das cadeias de bloco autorizadas em todo o mundo, ajudando a elevar o nível de confiança dos participantes numa determinada rede empresarial;
E. Considerando que a cadeia de blocos pode permitir que determinados administradores definam claramente as funções, responsabilidades, níveis de acesso e direitos de validação dos participantes;
F. Considerando que o comércio mundial assenta numa cadeia de abastecimento com um valor estimado de 16 biliões de euros, que é caracterizada por elevados custos de transação, e por uma burocracia onerosa, que contribuem para a complexidade dos processos e a vulnerabilidade dos sistemas ao erro;
G. Considerando que foram lançadas iniciativas-piloto com um potencial promissor para reduzir os custos dos transportes, tornar a indústria mais respeitadora do ambiente e melhorar o desempenho económico;
H. Considerando que pelo menos 202 iniciativas públicas de cadeias de blocos em 45 países em todo o mundo e economias nas regiões da Ásia-Pacífico, das Américas e do Médio Oriente estão, nomeadamente, a investigar as tecnologias das cadeias de blocos para o comércio;
I. Considerando que a cadeia de blocos pode reforçar e melhorar a qualidade das políticas comerciais da UE, de que são exemplo os acordos de comércio livre e os acordos de reconhecimento mútuo – particularmente dos operadores económicos autorizados –, bem como as decisões da adequação dos dados e as medidas de defesa comercial;
J. Considerando que a cadeia de blocos possui um grande potencial para aumentar a transparência e a rastreabilidade de toda a cadeia de abastecimento, elevar o nível de confiança dos participantes numa determinada rede, simplificar os controlos aduaneiros e o cumprimento da regulamentação, reduzir os custos das transações, reforçar a imutabilidade e a segurança dos dados e constituir um instrumento de combate à corrupção; que aos potenciais benefícios estão associados a múltiplos desafios, como a cibersegurança;
K. Considerando que a cadeia de blocos pode fornecer um quadro de transparência numa cadeia de abastecimento, reduzir a corrupção, detetar a evasão fiscal, permitir o acompanhamento de pagamentos ilícitos e combater o branqueamento de capitais baseado no comércio; que existem riscos associados à utilização de aplicações não autorizadas da cadeia de blocos para atividades criminosas, incluindo a evasão fiscal, a elisão fiscal e o branqueamento de capitais baseado no comércio; que a Comissão e os Estados-Membros devem acompanhar e abordar estas questões com caráter de urgência;
L. Considerando que a cadeia de blocos ainda está a evoluir no domínio do comércio internacional, carecendo, por conseguinte, de uma abordagem favorável à inovação, propícia e encorajadora, que, ao mesmo tempo, promova a proteção dos consumidores, dos investidores e do ambiente, aumente o valor social da tecnologia, reduza o fosso digital e melhore as competências digitais dos cidadãos;
M. Considerando que a tecnologia da cadeia de blocos pode fornecer a todas as partes, públicas e privadas, envolvidas no comércio, acesso permanente em tempo real a uma base de dados imutável e com registo do tempo que contém documentos relativos a transações, ajudando assim a desenvolver a confiança, a evitar problemas de cumprimento e a combater o uso de bens contrafeitos ou documentos falsos;
N. Considerando que algumas áreas metropolitanas e regiões da UE já começaram a desenvolver esta tecnologia através de programas e projetos específicos, com base nas suas próprias características, e a criar redes para a divulgação de boas práticas;
Política comercial da União Europeia
1. Reconhece que, apesar dos êxitos comerciais anteriores, os ACL da UE têm um grande potencial por explorar e têm ainda de ser plenamente utilizados, uma vez que, em média, apenas 67 % dos exportadores da UE e 90 % dos importadores da UE utilizam as tarifas preferenciais tanto na UE como nos países ou regiões parceiros, e apoia a análise de soluções técnicas que possam aumentar a utilização dos ACL e as exportações; assinala que as empresas de exportação poderiam carregar toda a documentação para uma aplicação de uma autoridade pública suportada pela cadeia de blocos e, deste modo, provar que cumprem as condições de tratamento preferencial concedidas por um acordo de comércio livre, tais como a qualificação para as regras preferenciais de origem, as regras sanitárias e fitossanitárias e as disposições relativas ao comércio e ao desenvolvimento sustentável; considera que a cadeia de blocos pode reforçar as disposições em matéria de cumulação nos acordos de comércio livre;
2. Entende que os procedimentos para a obtenção de certificação, relativamente a regras de origem tanto preferenciais como não preferenciais, são dispendiosos e complexos para as empresas; considera que, no caso das regras preferenciais, a cadeia de blocos pode ajudar a estabelecer a nacionalidade económica de um bem; considera, além disso, no caso das regras não preferenciais, que a cadeia de blocos poderia apoiar a utilização proporcionada pela União de instrumentos de defesa comercial, na medida em que pode assegurar a transparência quanto à origem das mercadorias que entram no mercado europeu e dar uma visão de conjunto do fluxo de importações para assegurar condições de concorrência mais equitativas para as empresas;
3. Salienta que a cadeia de blocos tem potencial para apoiar a agenda comercial e de desenvolvimento sustentável, na medida em que pode criar confiança na proveniência das matérias-primas e das mercadorias, processos de produção e cadeias de abastecimento transparentes e no respetivo cumprimento das regras internacionais no âmbito dos direitos laborais, sociais e ambientais, tendo em conta a especial relevância para os minerais de conflito, o comércio ilícito de bens culturais, o controlo das exportações e a corrupção; salienta que a cadeia de blocos pode contribuir para o trabalho de sustentabilidade das empresas e promover uma conduta empresarial responsável;
4. Considera que os acordos de reconhecimento mútuo dos operadores económicos autorizados dão às empresas a possibilidade de diversificar as suas cadeias de abastecimento através de uma redução dos custos e do tempo associados às alfândegas transfronteiras; observa que existem questões de execução que importa abordar; é sua convicção de que a cadeia de blocos tem potencial para reduzir a insegurança associada à execução dos acordos de reconhecimento mútuo dos operadores económicos autorizados, graças à continuidade da troca de dados;
Aspetos externos do regime alfandegário e de facilitação do comércio
5. Congratula-se vivamente com o Acordo de Facilitação do Comércio; encara este acordo como uma base para os membros da OMC explorarem novas formas de facilitar o comércio, nomeadamente por meio da cadeia de blocos; acolhe com agrado os esforços desenvolvidos pela UE para manter e reforçar a OMC e o seu compromisso relativamente a um sistema comercial baseado em regras com vista a garantir condições de concorrência equitativas e a aplicar regras comerciais de nível mundial;
6. Considera que a cadeia de blocos poderá dar às autoridades aduaneiras a possibilidade de obterem automaticamente as informações necessárias para a declaração aduaneira, reduzir a necessidade de proceder a verificações manualmente e de efetuar registos em papel, bem como fornecer informações exatas e atualizadas sobre o estatuto e as características das mercadorias que entram na UE a todas as partes relevantes em simultâneo, melhorando assim as capacidades de deteção e localização e a transparência;
7. Considera que a digitalização permitirá aumentar a eficácia e a transparência do intercâmbio de informações; considera que a cadeia de blocos pode permitir que os produtores, os laboratórios, os operadores logísticos, os reguladores e os consumidores tenham acesso a todas as informações necessárias, tais como a proveniência, os ensaios, a certificação e a concessão de licenças, e procedam à sua divulgação; regista que a cadeia de blocos pode igualmente ajudar na emissão adequada de certificados eletrónicos; considera a digitalização e o uso de aplicações ao longo das cadeias de abastecimento como uma condição indispensável e um complemento ao pleno funcionamento da cadeia de blocos; observa que existem diferenças substanciais entre os Estados-Membros no que respeita à digitalização;
8. Considera que a adoção de tecnologias de cadeia de blocos em toda a cadeia de abastecimento pode aumentar a eficácia, a velocidade e o volume do comércio mundial, limitando os custos associados às transações internacionais e ajudando as empresas a identificar novos parceiros comerciais, e levar a um aumento da confiança dos consumidores no comércio digital;
9. Sublinha a aplicação da cadeia de blocos, nomeadamente nas seguintes formas:
a)
Reforço da segurança tanto da proveniência como dos direitos de propriedade intelectual dos bens, reduzindo assim o risco de entrada na cadeia de abastecimento de bens ilícitos, incluindo bens falsos e contrafeitos;
b)
Prestação de informações precisas às autoridades quanto ao momento em que uma mercadoria pode ter sido danificada/manipulada numa cadeia de abastecimento;
c)
Melhoria da transparência e da rastreabilidade ao permitir que todos os participantes registem as suas transações e partilhem essas informações na rede;
d)
Salvaguarda da defesa e a confiança dos consumidores, fornecendo aos consumidores informações pormenorizadas sobre as mercadorias e contribuindo para o trabalho de sustentabilidade das empresas;
e)
Redução dos custos da gestão da cadeia de abastecimento, eliminando a necessidade de intermediários e dos custos associados, juntamente com o requisito físico de produzir, transportar e tratar documentação em papel;
f)
Melhoria da aplicação correta de pagamentos de IVA e de direitos e a cobrança de receitas no âmbito da política comercial, e
g)
Redução do tempo total em que as mercadorias estão em trânsito através da automatização de tarefas que são normalmente realizadas através de meios manuais; regista os benefícios associados, nomeadamente para as cadeias de abastecimento de entregas à medida («just-in-time»), tanto para a redução de custos como da pegada de carbono do setor da logística;
10. Regista que os criminosos podem manipular o comércio legítimo para ocultar as suas atividades ilícitas, tais como o branqueamento de capitais baseado no comércio, manipulando a documentação necessária com declarações falsas, tais como a sobrevalorização ou a subvalorização da mercadoria em causa; considera que a cadeia de blocos pode permitir que os serviços aduaneiros e outras autoridades tomem as medidas necessárias de modo atempado, imediato e coordenado, para expor fluxos financeiros ilícitos;
Fluxos transfronteiriços de dados e proteção de dados
11. Reconhece que os fluxos de dados transfronteiras desempenham uma função essencial para o comércio internacional de bens e serviços e para a conceção da arquitetura das cadeias de blocos;
12. Salienta a capacidade da cadeia de blocos para validar transações ao longo de toda uma cadeia internacional de abastecimento, através da definição de níveis de acesso e de procedimentos de validação para os participantes;
13. Assinala a ligação que existe entre a cadeia de blocos e os fluxos de dados transfronteiras relativos ao comércio; assinala que a existência de uma rede privada autorizada de vários livros-razão pode criar confiança entre plataformas, integrando dados provenientes de várias fontes; reconhece a importância dos fluxos de dados transfronteiras para o crescimento e o emprego; destaca a distinção entre dados pessoais e não pessoais na cadeia de blocos;
14. Reconhece o desafio representado pela relação entre a cadeia de blocos e a implementação do RGPD; salienta que a aplicação do cadeia de blocos deve estar em conformidade com toda a legislação da UE, existente e futura, em matéria de proteção de dados e de privacidade; sublinha que a tecnologia da cadeia de blocos pode oferecer soluções para as disposições em matéria de «proteção de dados desde a conceção» na implementação do RGPD, com base no princípio comum de garantir a segurança dos dados e a sua gestão autónoma; destaca o impacto limitado do RGPD nas transações comerciais devido à inexistência de dados pessoais nas cadeias de blocos privadas autorizadas; reconhece, no entanto, a necessidade de salvaguardas e de supervisão regulamentar; sublinha que o RGPD apenas se aplica quando estejam em causa dados pessoais; convida a Comissão a aprofundar a análise a esta questão;
15. Reconhece a necessidade de as cadeias de blocos serem concebidas em conformidade com o direito a ser esquecido e observa que os utilizadores verificados da cadeia de blocos e de aplicações de cadeias de blocos devem ter sempre acesso a todos os dados relacionados com transações em que estejam, direta ou indiretamente, envolvidos, em função dos seus direitos de acesso;
16. Reitera o seu apelo para que sejam elaboradas disposições que permitam o pleno funcionamento do ecossistema digital e promovam os fluxos de dados transfronteiras em acordos de comércio livre; regista, a este respeito, que as decisões de adequação não antecipam o fluxo livre de dados não pessoais; por conseguinte, apela à Comissão que negoceie compromissos vinculativos e coercivos quanto às transferências de dados nos acordos de comércio livre, incluindo dados não pessoais;
17. Salienta que a tecnologia de cadeia de blocos representa um novo paradigma de armazenamento e gestão de dados capaz de descentralizar formas de interação humana, mercados, banca e comércio internacional; destaca que o desenvolvimento da tecnologia de cadeia de blocos oferece oportunidades e representa um desafio em termos de proteção de dados, transparência e criminalidade financeira, uma vez que os dados são imutáveis a partir do momento em que são introduzidos e partilhados com todas as partes participantes, o que também garante a sua segurança e integridade; solicita que tudo seja feito, nomeadamente a nível nacional, para garantir o caráter não falsificável e imutável da tecnologia e para que não seja posto em causa o direito fundamental à proteção de dados;
18. Reconhece o desafio colocado pela relação entre as tecnologias de cadeia de blocos e a aplicação do quadro da UE em matéria de proteção de dados, nomeadamente o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD), e recorda que, como resultado, esta relação pode revelar um conflito entre a proteção dos direitos fundamentais, por um lado, e a promoção da inovação, por outro lado; sugere a necessidade de velar por que a cadeia de blocos esteja em plena conformidade com o quadro da UE em matéria de proteção de dados e respeite plenamente os princípios estabelecidos no Direito da UE, em particular no que toca ao tratamento de dados pessoais enquanto direito fundamental nos termos do artigo 8.º, n.º 1, da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e do artigo 16.º, n.º 1, do TFUE;
19. Realça, além disso, que a tecnologia de cadeia de blocos, em parte fruto do conflito acima descrito, não apoia, de modo algum, automaticamente a soberania dos dados, pelo que deve ser especificamente concebida para o efeito, uma vez que também pode representar um risco para a proteção de dados;
20. Salienta que, se concebida de forma adequada, a tecnologia de cadeia de blocos pode estar em consonância com as disposições relativas à «proteção de dados desde a conceção», que dá aos titulares dos dados um maior controlo sobre os respetivos dados, em consonância com o RGPD; destaca, além disso, que, normalmente os dados pessoais numa cadeia de blocos não são anónimos, pelo que são abrangidos pelo RGPD; reitera que a tecnologia de cadeia de blocos deve ser totalmente compatível com a legislação da UE, nomeadamente quando utilizada para o tratamento de dados pessoais; recomenda, a este respeito, que as tecnologias e as aplicações de cadeia de blocos integrem mecanismos que protejam os dados pessoais e a privacidade dos utilizadores e assegurem que os dados sejam totalmente anónimos, garantindo, assim, que apenas armazenam dados que não estejam relacionados com uma pessoa singular identificada ou identificável;
21. Sublinha que as futuras aplicações das tecnologias de cadeia de blocos devem pôr em prática mecanismos que protejam os dados pessoais, a privacidade dos utilizadores e assegurem que os dados sejam totalmente anónimos; insta a Comissão e os Estados‑Membros a financiarem a investigação, em particular a investigação académica, e a inovação no que se refere a novas tecnologias de cadeia de blocos, que sejam compatíveis com o RGPD e se baseiem no princípio da proteção de dados desde a conceção, como o sistema zk-SNARK (zero-knowledge Succinct Non-Interactive Arguments of Knowledge);
22. Considera que, para evitar a violação do direito fundamental à proteção dos dados pessoais, a tecnologia de cadeia de blocos não deve ser usada para tratar os dados pessoais enquanto a organização que a utiliza não for capaz de assegurar a conformidade com o RGPD e garantir, em particular, a proteção do direito à retificação e do direito ao apagamento dos dados;
23. Salienta que os utilizadores de tecnologias de cadeia de blocos podem, simultaneamente, ser responsáveis pelo tratamento dos dados pessoais que carregam no livro-razão e subcontratantes, em virtude do armazenamento da cópia integral do livro‑razão que instalaram no seu próprio computador;
24. Observa que, sempre que a cadeia de blocos contenha dados pessoais, a natureza imutável de algumas tecnologias de cadeia de blocos pode ser incompatível com o «direito ao apagamento dos dados» previsto no artigo 17.º do RGPD;
25. Regista com apreensão que, sempre que a cadeia de blocos contenha dados pessoais, a proliferação de cópias de dados numa cadeia de blocos pode ser incompatível com o princípio da «minimização dos dados» constante do artigo 5.º do RGPD;
26. Convida o Comité Europeu para a Proteção de Dados a publicar orientações e recomendações para garantir que a tecnologia de cadeia de blocos cumpre a legislação da UE;
27. Nota com preocupação a ausência de qualquer referência às implicações graves da aplicação da cadeia de blocos, em particular em domínios como a luta contra o branqueamento de capitais, a evasão fiscal e o financiamento do terrorismo; considera que antes da utilização de tecnologias de cadeia de blocos, há que definir o que será armazenado dentro e fora da cadeia, devendo os dados pessoais ficar fora da cadeia;
Pequenas e médias empresas (PME)
28. Entende que a inovação em torno da cadeia de blocos e a sua promoção podem gerar oportunidades económicas para internacionalizar as PME e ultrapassar os custos associados às exportações, ao facilitar a sua interação com os consumidores, as autoridades aduaneiras, as entidades reguladoras nacionais e internacionais e outras empresas envolvidas na cadeia de abastecimento; acrescenta que a infraestrutura da cadeia de blocos pode contribuir para que os produtos e serviços sejam comercializados de forma rápida e não onerosa;
29. Chama a atenção para os benefícios que a cadeia de blocos poderá trazer às PME, na medida em que permite a comunicação entre pares, cria instrumentos de colaboração e possibilita a realização de pagamentos seguros, facilitando assim a atividade empresarial e reduzindo o risco de não pagamento e os custos dos processos jurídicos associados ao cumprimento do contrato através do recurso a contratos inteligentes; reconhece a necessidade de garantir que o desenvolvimento da cadeia de blocos no comércio internacional inclua as PME; salienta que, de momento, os contratos inteligentes podem não ter atingido maturidade suficiente para serem considerados juridicamente vinculativos no âmbito de qualquer regulamentação setorial, sendo necessária uma avaliação mais aprofundada dos riscos;
30. Reconhece as oportunidades, nomeadamente para as PME, decorrentes da introdução da tecnologia de cadeia de blocos no âmbito da política comercial da UE, que pode trazer, entre outros benefícios, custos de transação mais baixos e uma maior eficiência; reconhece, além disso, que a tecnologia de cadeia de blocos oferece o potencial para aumentar a confiança no atual sistema comercial, proporcionando um registo imutável das transações; admite, no entanto, que, em casos não abrangidos pela política comercial da UE, a aplicação desta tecnologia pode acarretar riscos de branqueamento de capitais e facilitar o financiamento da criminalidade organizada;
Interoperabilidade, escalabilidade e interações com tecnologias conexas
31. Toma em consideração os desafios de escalabilidade associados à implementação de sistemas de cadeia de blocos no contexto da expansão das redes de comércio internacional;
32. Toma nota da proliferação de diferentes cadeias de blocos que registam dados de uma transação em diferentes livros-razão privados e públicos; reconhece que existe uma necessidade crescente de desenvolver normas de interoperabilidade a nível mundial para integrar transações inscritas em várias cadeias de blocos que registam os movimentos de um produto ao longo de uma cadeia de abastecimento, a fim de encorajar a interoperabilidade entre sistemas, incluindo sistemas operativos antigos; insta a Comissão a reforçar a colaboração com os organismos de normalização ISO e outros organismos de normalização pertinentes;
33. Considera as possíveis interações entre tecnologias de cadeia de blocos com outras inovações no domínio do comércio internacional; sublinha a necessidade de analisar as oportunidades e os desafios relacionados com os desenvolvimentos nas tecnologias da cadeia de blocos; apela à realização de mais atividades de investigação sobre a sua aplicabilidade à transformação digital e à automatização do comércio internacional, bem como ao setor público, em particular no âmbito do Programa Europa Digital;
Conclusões
34. Solicita à Comissão que acompanhe a evolução no domínio da cadeia de blocos, especialmente os projetos-piloto e iniciativas em curso que digam respeito à cadeia de abastecimento internacional e a aspetos externos dos processos aduaneiros e regulamentares; convida a Comissão a elaborar um documento estratégico horizontal, que envolva todas as direções-gerais, sobre a adoção das tecnologias de cadeia de blocos na gestão do comércio e da cadeia de abastecimento, bem como no domínio da propriedade intelectual e, nomeadamente, no combate à contrafação; convida a Comissão a debruçar-se sobre os aspetos judiciais e de governação da cadeia de blocos e a avaliar a questão de saber se a cadeia de blocos oferece melhores soluções para as tecnologias existentes e emergentes que possam dar resposta aos atuais desafios da política comercial da UE; solicita à Comissão que acompanhe a evolução no domínio da cadeia de blocos, especialmente os projetos-piloto e iniciativas em curso que digam respeito à cadeia de abastecimento internacional; convida a Comissão a elaborar um documento estratégico sobre a adoção das tecnologias de cadeia de blocos na gestão do comércio e da cadeia de abastecimento; considera que é imperativo atrair diferentes intervenientes no domínio da cadeia de blocos para projetos e iniciativas em cadeias de abastecimento internacionais, bem como promover o desenvolvimento conjunto de projetos, a fim de integrar, entre outros, os domínios da identidade, da proveniência e do armazenamento de dados de diferentes parceiros;
35. Solicita à Comissão que elabore uma série de orientações para a aplicação da cadeia de blocos ao comércio internacional, a fim de assegurar à indústria e às autoridades aduaneiras e regulamentares um nível de segurança jurídica suficiente que encoraje a utilização da cadeia de blocos e promova a inovação neste domínio; regista que legislar sobre a tecnologia com base nas aplicações limitaria a inovação e a criação de novas aplicações; sublinha a importância de a UE, e, em particular, a indústria europeia, demonstrar liderança e apropriação no domínio das tecnologias da cadeia de blocos, e assegurar igualdade de condições em matéria de concorrência a nível mundial, bem como nos domínios do desenvolvimento e do ambiente regulamentar; sublinha a importância do diálogo e do intercâmbio de práticas, bem como da criação de competências e de competências digitais; insta a Comissão a colaborar com os Estados-Membros no lançamento e na supervisão de projetos-piloto com recurso à tecnologia da cadeia de blocos no comércio internacional, a fim de testar os seus benefícios;
36. Incentiva a Comissão a colaborar com os Estados-Membros para simplificar e reforçar o fluxo de informações relativas à facilitação do comércio, através, nomeadamente, da adoção de tecnologias da informação e da comunicação adequadas;
37. Solicita à Comissão que crie, no âmbito da DG Comércio, um grupo consultivo dedicado à cadeia de blocos e elabore um documento de síntese referente aos projetos‑piloto privados autorizados no domínio da utilização extremo-a-extremo da cadeia de blocos na cadeia de abastecimento, que envolvam os serviços aduaneiros e outras autoridades transfronteiras, tendo também em conta os direitos de propriedade intelectual e o combate da contrafação; reconhece que a tecnologia da cadeia de blocos se encontra ainda nas suas fases iniciais de desenvolvimento, existindo a necessidade de uma estratégia do setor para a aplicação eficaz da cadeia de blocos;
38. Insta a Comissão a analisar modos como a cadeia de blocos poderá apoiar o comércio e o desenvolvimento sustentável; recorda a posição do Parlamento segundo a qual as medidas destinadas a apoiar uma estratégia da UE de comércio digital devem estar totalmente articuladas e contribuir para a concretização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), incluindo o ODS 5 relativo à igualdade de género e à capacitação das mulheres; recorda a posição do Parlamento relativamente à importância de promover a participação das mulheres em domínios CTEM (ciência, tecnologia, engenharia e matemática) e de reduzir as disparidades de género no acesso e na utilização de novas tecnologias;
39. Insta a Comissão a conduzir investigações em matéria de políticas quanto ao modo como a cadeia de blocos pode modernizar as políticas de defesa do comércio da União, com vista a reforçar a sua legitimidade e poder;
40. Solicita à Comissão que estude as formas de otimizar a arquitetura da cadeia de blocos por forma a excluir os dados privados da cadeia;
41. Exorta a Comissão a avaliar a forma de aumentar a facilitação do comércio e a segurança através da tecnologia da cadeia de blocos, incluindo o conceito de OEA;
42. Incentiva a Comissão a colaborar e a contribuir para o trabalho das organizações internacionais e a participar nos projetos atualmente em curso sobre a elaboração das normas e princípios que deverão estar na base da regulamentação destinada a facilitar a utilização da cadeia de blocos;
43. Solicita à União Europeia e aos seus Estados-Membros que liderem o processo de normalização e segurança da cadeia de blocos e colaborem com parceiros internacionais e todos os intervenientes e indústrias pertinentes para desenvolver normas relativas à cadeia de blocos, nomeadamente no que diz respeito à terminologia, desenvolvimento e implantação desta tecnologia no comércio e na gestão da cadeia de abastecimento; realça que a cibersegurança se reveste de importância crucial para as aplicações baseadas na tecnologia do livro-razão distribuído, nomeadamente no que diz respeito ao comércio internacional; solicita à Comissão que analise os desafios no domínio da segurança, avalie os riscos tecnológicos, como a computação quântica, e tome medidas para dar resposta a esses desafios;
44. Solicita à Comissão que colabore com os intervenientes pertinentes para analisar os desafios de interoperabilidade e de compatibilidade dos sistemas de cadeias de blocos e para elaborar um quadro que lhes dê resposta;
45. Saúda a instituição do «Observatório e Fórum da UE para a Tecnologia de Cadeia de Blocos» e incentiva-o a analisar as aplicações destinadas a facilitar o comércio internacional; solicita, por este meio, à Comissão que estude a possibilidade de alargar o mandato do Observatório e Fórum da UE para a Tecnologia de Cadeia de Blocos, envolvendo as partes interessadas a nível local e mundial, a fim de abordar futuros desafios e melhorar o apoio prestado aos decisores;
46. Exorta a Comissão a assumir a liderança na avaliação e no desenvolvimento das tecnologias de cadeia de blocos, inclusive em setores específicos, tais como os abrangidos pela política comercial da UE, e a criar um grupo consultivo sobre cadeias de blocos, que deverá incluir peritos em matéria de luta contra o branqueamento de capitais, a evasão fiscal, a proteção de dados e a criminalidade organizada;
47. Lembra a Comissão de que a UE tem uma oportunidade de se tornar um interveniente líder no domínio da cadeia de blocos e no comércio internacional, e deve ter um papel influente no delinear do seu desenvolvimento a nível mundial, em conjunto com os seus parceiros internacionais;
o o o
48. Encarrega o seu presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, à Vice-Presidente da Comissão/Alta Representante da União para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança e ao SEAE.