Resolução do Parlamento Europeu, de 12 de fevereiro de 2019, sobre a aplicação da Diretiva relativa aos cuidados de saúde transfronteiriços (2018/2108(INI))
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta a Diretiva 2011/24/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de março de 2011, relativa ao exercício dos direitos dos doentes em matéria de cuidados de saúde transfronteiriços(1),
– Tendo em conta o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, nomeadamente o artigo 114.º e o artigo 168.º,
– Tendo em conta o Regulamento (CE) n.º 883/2004 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 29 de abril de 2004, relativo à coordenação dos sistemas de segurança social(2),
– Tendo em conta o Regulamento (UE) 2016/679 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 27 de abril de 2016, relativo à proteção das pessoas singulares no que diz respeito ao tratamento de dados pessoais e à livre circulação desses dados e que revoga a Diretiva 95/46/CE (Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados)(3),
– Tendo em conta as Conclusões do Conselho, de 6 de junho de 2011, sobre «Rumo a sistemas de saúde modernos, reativos e sustentáveis»(4),
– Tendo em conta os programas de saúde plurianuais para os períodos 2003-2008(5), 2008‑2013(6) e 2014-2020(7), respetivamente,
– Tendo em conta os relatórios da Comissão de 4 de setembro de 2015 e de 21 de setembro de 2018 sobre a aplicação da Diretiva relativa ao exercício dos direitos dos doentes em matéria de cuidados de saúde transfronteiriços (COM(2015)0421 e COM(2018)0651),
– Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 25 de abril de 2018, sobre a viabilização da transformação digital dos serviços de saúde e de prestação de cuidados no Mercado Único Digital, a capacitação dos cidadãos e a construção de uma sociedade mais saudável (COM(2018)0233),
– Tendo em conta o relatório da Comissão, de 18 de julho de 2018, sobre os dados dos Estados-Membros relativos aos cuidados de saúde transfronteiriços em 2016(8),
– Tendo em conta a Decisão de Execução 2011/890/UE da Comissão, de 22 de dezembro de 2011, que estabelece as normas para a criação, a gestão e o funcionamento da rede de autoridades nacionais responsáveis pela saúde em linha(9),
– Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 6 de maio de 2015, intitulada «Estratégia para o Mercado Único Digital na Europa» (COM(2015)0192),
– Tendo em conta o Plano de ação para a saúde em linha 2012-2020, em especial a dimensão transnacional explícita (COM(2012)0736),
– Tendo em conta a Avaliação intercalar da Comissão do Plano de Ação para a saúde em linha 2012-2020 (COM(2017)0586),
– Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 11 de novembro de 2008, sobre as doenças raras (COM(2008)0679) e a Recomendação do Conselho, de 8 de junho de 2009, relativa a uma ação europeia em matéria de doenças raras(10),
– Tendo em conta o relatório de execução da Comissão, de 5 de setembro de 2014, sobre a sua Comunicação sobre doenças raras (COM(2014)0548),
– Tendo em conta as Recomendações sobre Redes Europeias de Referência para as Doenças Raras do Comité de Peritos da UE em matéria de Doenças Raras (EUCERD), de 31 de janeiro de 2013, e a respetiva adenda, de 10 de junho de 2015,
– Tendo em conta a nota de enquadramento do Tribunal de Contas sobre o sistema de cuidados de saúde transfronteiriços na UE, de maio de 2018(11),
– Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 20 de setembro de 2017, intitulada «Impulsionar o crescimento e a coesão nas regiões fronteiriças da UE» (COM(2017)0534),
– Tendo em conta a Proclamação Interinstitucional sobre o Pilar Europeu dos Direitos Sociais(12),
– Tendo em conta o artigo 52.º do seu Regimento, bem como o artigo 1.º, n.º 1, alínea e), e o anexo 3 da Decisão da Conferência dos Presidentes, de 12 de dezembro de 2002, sobre o processo de autorização para elaborar relatórios de iniciativa,
– Tendo em conta o relatório da Comissão do Ambiente, da Saúde Pública e da Segurança Alimentar e o parecer da Comissão do Mercado Interno e da Proteção dos Consumidores (A8-0046/2019),
A. Considerando que os sistemas de saúde a um preço comportável para todas as pessoas na UE e nos seus Estados-Membros são cruciais para garantir um elevado nível de saúde pública, coesão social e justiça social, preservando e garantindo o acesso universal, e que a qualidade de vida dos doentes é reconhecida enquanto componente importante da avaliação de custos/benefícios no setor da saúde;
B. Considerando que a Diretiva 2011/24/UE (a seguir referida como «a diretiva»), em conformidade com o artigo 168.º, n.º 7, do TFUE, respeita a liberdade de cada Estado‑Membro tomar as decisões adequadas em matéria de cuidados de saúde e não interfere nas escolhas éticas fundamentais das autoridades competentes dos Estados-Membros, nem as põe em causa; que existem diferenças nos respetivos serviços prestados pelos Estados-Membros, bem como na forma como são financiados; que a diretiva oferece aos cidadãos europeus outras possibilidades em termos de cuidados de saúde, para além das existentes no seu próprio país;
C. Considerando que a saúde pode ser entendida como um direito fundamental, de acordo com o artigo 2.º (sobre o direito à vida) e com o artigo 35.º (sobre proteção da saúde), da Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia;
D. Considerando que os sistemas de saúde na UE enfrentam desafios devido ao envelhecimento da população, às restrições orçamentais, ao aumento da incidência das doenças crónicas e raras, às dificuldades em assegurar cuidados de saúde básicos nas regiões rurais e ao elevado preço dos medicamentos; que os Estados-Membros são responsáveis pelo desenvolvimento, pela manutenção e pelo intercâmbio a nível transfronteiriço de informações sobre um catálogo atualizado das carências de medicamentos, a fim de garantir o acesso a medicamentos essenciais;
E. Considerando que os cuidados de saúde de que os cidadãos necessitam podem, por vezes, ser mais bem prestados noutro Estado-Membro, devido à proximidade, à facilidade de acesso, à natureza especializada dos cuidados ou à falta de capacidade, por exemplo, a falta de medicamentos essenciais, no seu próprio Estado-Membro;
F. Considerando que os resultados do relatório sobre o funcionamento da diretiva demonstram que, em 2015, nem todos os Estados-Membros aplicavam, de forma completa ou correta, a diretiva;
G. Considerando que o setor da saúde é uma componente vital da economia da UE, que ascende a 10 % do seu PIB, valor que pode aumentar para 12,6 % até 2060 devido a fatores socioeconómicos;
H. Considerando que, segundo o artigo 20.º da diretiva em referência, a Comissão deve apresentar um relatório de execução sobre o funcionamento da diretiva de três em três anos; que a Comissão deve avaliar constantemente e apresentar informações de forma regular sobre os fluxos de doentes, as dimensões administrativas, sociais e financeiras da mobilidade dos doentes e o funcionamento das redes europeias de referência (RER) e dos pontos de contacto nacionais;
I. Considerando que, segundo o relatório da Comissão, de 21 de setembro de 2018, sobre a aplicação da diretiva, continua a ser difícil para os cidadãos descobrir como podem fazer uso dos seus direitos em termos de cuidados de saúde transfronteiriços; que são necessárias maior clareza e transparência quanto às condições em que funcionam os prestadores de cuidados de saúde, a fim de garantir uma mobilidade segura dos pacientes;
J. Considerando que a Comunicação da Comissão, de 25 de abril de 2018, sobre saúde em linha refere que os sistemas de saúde e de cuidados de saúde exigem reformas e soluções inovadoras para se tornarem mais resilientes, acessíveis e eficazes; que, por conseguinte, a utilização de novas tecnologias e instrumentos digitais deve ser reforçada para melhorar a qualidade e a sustentabilidade dos serviços de cuidados de saúde;
K. Considerando que a diretiva proporciona uma base jurídica clara para a cooperação e a colaboração europeias no que diz respeito à avaliação das tecnologias da saúde (ATS), à saúde em linha, às doenças raras e às normas de segurança e qualidade dos serviços e produtos de saúde;
L. Considerando o direito dos cidadãos da UE de acederem a cuidados especializados no seu próprio Estado-Membro; que, porém, o número de doentes que fazem uso do seu direito a cuidados de saúde transfronteiriços, tal como previsto na diretiva, incluindo exames médicos preventivos, rastreios e controlos de saúde, está a aumentar, embora muito lentamente;
M. Considerando que os programas de vacinação não são abrangidos pela presente diretiva, embora constituam uma das políticas mais eficazes da UE, e tendo em conta as dificuldades de acesso à vacinação em alguns Estados-Membros;
N. Considerando que nem todos os Estados-Membros conseguiram fornecer dados ou informações sobre os doentes que se deslocam ao estrangeiro e que a recolha de dados nem sempre é comparável entre Estados-Membros;
O. Considerando que 83 % das pessoas inquiridas numa recente sondagem da Comissão aprovaram a divulgação de dados médicos para efeitos de investigação e melhoria das condições de saúde dos doentes(13); que qualquer integração futura dos sistemas de saúde do ponto de vista digital deve garantir que os sistemas de saúde e os doentes sejam responsáveis pela guarda e gestão desses dados, a fim de garantir a equidade, a sustentabilidade e segurança para os doentes;
P. Considerando que a mobilidade dos doentes na UE coberta pelo âmbito de aplicação da diretiva continua a ser relativamente baixa e não teve um impacto orçamental significativo na sustentabilidade dos sistemas nacionais de saúde;
Q. Considerando que os Estados-Membros são responsáveis pelo acesso aos cuidados de saúde de que as pessoas necessitam e por garantir o reembolso de todos os custos correspondentes; que os serviços de saúde dos Estados-Membros são responsáveis pela definição dos critérios que permitem que os cidadãos recebam cuidados de saúde noutro Estado-Membro; que, num número considerável de Estados-Membros, os obstáculos com que os doentes se deparam quando recorrem aos sistemas de saúde continuam a ser significativos; que os encargos administrativos podem provocar atrasos nos reembolsos; que esta situação apenas agrava a fragmentação do acesso aos serviços e que, por conseguinte, deve ser melhorada através da coordenação entre os Estados-Membros;
R. Considerando que o Cartão Europeu de Seguro de Doença (CESD) é regulado pelo regulamento relativo à coordenação dos sistemas de segurança social e que a sua aplicação varia consideravelmente de Estado-Membro para Estado-Membro; que uma aplicação uniforme do CESD e uma maior coordenação entre os Estados-Membros são essenciais para reduzir os encargos administrativos existentes e garantir um reembolso rápido e não discriminatório aos doentes, garantindo simultaneamente a livre circulação dos cidadãos da UE;
S. Considerando que os doentes ainda se deparam com dificuldades práticas e legais ao utilizarem receitas médicas noutros Estados-Membros;
T. Considerando que o papel dos pontos de contacto nacionais (PCN) consiste em garantir que os doentes recebem a informação correta para poderem tomar uma decisão informada;
U. Considerando que os pontos de contacto nacionais (PCN) ainda não são suficientemente conhecidos do público, o que tem um impacto negativo na sua eficácia; Considerando que a eficiência e o alcance dos PCN dependem do apoio que recebem da UE e dos Estados-Membros, dos mecanismos estabelecidos para a comunicação, do intercâmbio de boas práticas e de dados, incluindo informações de contacto, e de orientações para a referenciação dos doentes;
V. Considerando que existem grandes variações entre os vários PCN no que diz respeito ao funcionamento, à acessibilidade, à visibilidade e à afetação dos recursos, tanto em termos de qualidade como de quantidade;
W. Considerando que, de acordo com uma sondagem Eurobarómetro de maio de 2015(14), os doentes não estão suficientemente informados dos seus direitos em matéria de cuidados de saúde transfronteiriços e menos de 20 % dos cidadãos pensam estar bem informados;
X. Considerando que a prestação de cuidados de saúde a nível transfronteiriço só será eficaz se os doentes, os profissionais de saúde e outras partes interessadas estiverem devidamente informados sobre o assunto e se as regras que o regem forem facilmente acessíveis;
Y. Considerando que os doentes, os prestadores de cuidados e os profissionais de saúde continuam a deparar-se com grandes lacunas de informação no que diz respeito aos direitos dos doentes em geral e, nomeadamente, àqueles que são previstos pela diretiva;
Z. Considerando que os profissionais da saúde tratam de questões extremamente sensíveis ligadas aos seus doentes, o que exige uma comunicação clara e compreensível; que as barreiras linguísticas podem dificultar a transferência de informações entre os profissionais de saúde e os seus doentes;
AA. Considerando que existe uma margem considerável para melhorar e simplificar os procedimentos de reembolso em vários Estados-Membros, nomeadamente no que diz respeito às receitas médicas, aos medicamentos órfãos, aos compostos e produtos farmacêuticos de carácter medicinal e aos tratamentos e procedimentos de seguimento;
AB. Considerando que, atualmente, seis Estados-Membros e a Noruega não têm qualquer sistema de autorização prévia, dando, assim, liberdade de escolha aos doentes e reduzindo os encargos administrativos;
AC. Considerando que existem vários acordos bilaterais entre Estados-Membros e regiões limítrofes que poderiam servir de base às boas práticas de excelência para continuar a desenvolver os cuidados de saúde transfronteiriços em toda a UE;
Execução
1. Congratula-se com as medidas tomadas pela Comissão para avaliar se os Estados-Membros transpuseram corretamente a diretiva;
2. Regista os benefícios da diretiva em apreço ao clarificar as regras em matéria de cuidados de saúde transfronteiriços e ao garantir o acesso a cuidados de saúde transfronteiriços seguros e de elevada qualidade na União, bem como ao contribuir para a mobilidade dos doentes, em conformidade com a jurisprudência do Tribunal de Justiça; manifesta a sua desilusão pelo facto de um número significativo de Estados‑Membros não ter aplicado eficazmente os requisitos para garantir os direitos dos doentes; exorta, portanto, os Estados-Membros a garantirem a sua aplicação adequada, assegurando um elevado nível de proteção da saúde pública que contribui para a melhoria da saúde dos cidadãos, respeitando, simultaneamente, o princípio da livre circulação de pessoas no mercado interno;
3. Convida a Comissão a apresentar os seus relatórios trienais de avaliação sobre o funcionamento da diretiva e a apresentá-los ao Parlamento e ao Conselho em conformidade; salienta a importância de recolher informações, para fins estatísticos, sobre os doentes que se deslocam ao estrangeiro para efeitos de tratamento e de analisar as razões do fluxo de doentes entre países; convida igualmente a Comissão a publicar, se tal for exequível e numa base anual, a repartição dos serviços prestados e os montantes totais pagos por cada Estado-Membro a título de prestações de cuidados de saúde transfronteiriços;
4. Convida a Comissão a incluir a qualidade de vida dos doentes e os resultados dos cuidados de saúde na sua avaliação de custos/benefícios da execução da presente diretiva;
5. Recorda aos Estados-Membros o compromisso assumido tendo em vista prestar à Comissão a assistência e todas as informações disponíveis para realizar a avaliação e a elaboração dos citados relatórios;
6. Convida a Comissão a estabelecer orientações para a aplicação, em particular nos pontos de interação da diretiva e do regulamento relativos à coordenação dos sistemas de segurança social, e a assegurar uma melhor coordenação, a este respeito, entre todas as partes interessadas nas instituições;
7. Realça que os Estados-Membros devem transpor a diretiva de forma correta, para garantir cuidados de saúde transfronteiriços de elevada qualidade e de fácil acesso para os doentes, respeitando os prazos de aplicação estabelecidos pela regulamentação em vigor; reconhece que podem ser introduzidas melhorias específicas no que diz respeito ao acesso a medicamentos receitados e à continuidade do tratamento prescrito; solicita à Comissão que explore a possibilidade de incluir os programas de vacinação no âmbito de aplicação da presente diretiva;
8. Observa com satisfação o impacto positivo de iniciativas como o Cartão Europeu de Seguro de Doença (CESD), que é emitido gratuitamente e permite que qualquer pessoa que esteja segurada ou coberta por um regime legal de segurança social obtenha tratamento médico noutro Estado-Membro a título gratuito ou a custo reduzido; salienta a importância de uma cooperação bem-sucedida entre as instituições, a fim de evitar a utilização abusiva do CESD;
9. Salienta a necessidade de assegurar clareza e transparência sobre as condições em que operam os prestadores de cuidados de saúde; realça a importância de os prestadores e profissionais de cuidados de saúde terem um seguro de responsabilidade civil profissional, conforme previsto na presente diretiva e na Diretiva 2005/36/CE, a fim de melhorar a qualidade dos serviços de saúde e de aumentar a proteção dos doentes;
Financiamento
10. Recorda que o financiamento dos cuidados de saúde transfronteiriços cabe aos Estados‑Membros, que reembolsam os custos em conformidade com a regulamentação em vigor; recorda ainda que a Comissão apoia a cooperação prevista no capítulo IV da diretiva através dos programas de saúde;
11. Manifesta, neste contexto, sérias preocupações quanto à proposta de redução do financiamento do programa de saúde; reitera o seu apelo para que o programa de saúde seja restabelecido como um sólido programa independente, com um aumento do financiamento no próximo quadro financeiro plurianual (QFP) 2021-2027, de molde a realizar os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas em matéria de saúde pública, sistemas de saúde e problemas relacionados com o ambiente e assegurar uma política de saúde ambiciosa centrada nos desafios transfronteiriços, nomeadamente um aumento dos esforços comuns da União na luta contra o cancro, na prevenção, na deteção precoce e na gestão de doenças crónicas, incluindo doenças genéticas, pandémicas e cancros raros, no combate à resistência antimicrobiana e na garantia de acesso mais fácil aos cuidados de saúde a nível transfronteiriço;
12. Sublinha a importância do Fundo Social Europeu, do Fundo Europeu Estrutural e de Investimento em matéria de saúde e do Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional, incluindo o programa Interreg, na melhoria dos serviços de saúde e na redução das desigualdades entre as regiões e grupos sociais dos Estados-Membros no domínio da saúde; solicita que os fundos estruturais e de coesão sejam igualmente utilizados para melhorar e facilitar o acesso aos cuidados de saúde transfronteiriços no próximo QFP;
Mobilidade dos doentes
13. Faz notar que são quatro as razões para a reduzida mobilidade dos doentes: i) alguns Estados-Membros atrasaram-se bastante na aplicação da diretiva; ii) a sensibilização dos cidadãos para os seus direitos gerais de reembolso é extremamente reduzida; iii) alguns Estados-Membros impuseram determinados obstáculos que limitam os cuidados de saúde transfronteiriços, como ónus administrativos; e iv) as informações sobre os doentes que procuram cuidados de saúde noutro Estado-Membro com base na diretiva estão em falta ou estão incompletas;
14. Observa que alguns sistemas de autorização prévia parecem ser excessivamente burocráticos e/ou restritivos atendendo ao número de pedidos efetuados em cada ano; solicita à Comissão que prossiga os diálogos estruturados com os Estados-Membros, proporcionando uma maior clareza no que respeita aos requisitos de autorização prévia e às respetivas condições de reembolso;
15. Solicita à Comissão que desenvolva orientações destinadas aos Estados-Membros para permitir que as pessoas, mediante autorização prévia, comparem os tratamentos efetuados no estrangeiro com o tratamento disponível no próprio Estado-Membro, tendo a eficiência de custos para os doentes enquanto linha de orientação;
16. Recorda aos Estados-Membros que quaisquer restrições à aplicação da diretiva, como os requisitos em matéria de autorização prévia ou as limitações em termos de reembolso, devem ser necessárias e proporcionadas e não devem redundar numa discriminação arbitrária ou social, nem em obstáculos injustificados à livre circulação de doentes e serviços ou numa sobrecarga dos sistemas de saúde públicos nacionais; insta os Estados-Membros a terem em conta as dificuldades dos doentes com baixos rendimentos que têm de efetuar pagamentos antecipados no contexto de um tratamento transfronteiriço; observa que os sistemas de autorização prévia visam permitir o planeamento por parte dos Estados-Membros e proteger os doentes de tratamentos que suscitem preocupações sérias e específicas relativamente à qualidade ou segurança dos cuidados prestados;
17. Verifica com preocupação que, em determinados Estados-Membros, as companhias seguradoras têm discriminado de forma arbitrária ou criado obstáculos injustificados à livre circulação de doentes e de serviços, com consequências financeiras negativas para os doentes;
18. Insta os Estados-Membros a informarem a Comissão de qualquer decisão que vise introduzir limitações ao reembolso dos custos, nos termos do artigo 7.º, n.º 9, da diretiva, indicando as razões para tal decisão;
19. Lamenta que alguns Estados-Membros concedam, pontualmente, níveis de reembolso inferiores aos cuidados de saúde transfronteiriços fornecidos por prestadores de cuidados de saúde privados ou não contratados nos seus próprios territórios do que aos cuidados de saúde transfronteiriços prestados por prestadores de cuidados de saúde públicos ou contratados; considera que deve ser assegurado o mesmo nível de reembolso para cuidados de saúde privados e cuidados de saúde públicos, desde que possa ser garantida a segurança e qualidade desses cuidados;
20. Solicita à Comissão e aos Estados-Membros que trabalhem em conjunto tendo em vista avaliar, harmonizar e simplificar os procedimentos de reembolso para os doentes que recebam cuidados de saúde transfronteiriços, incluindo o esclarecimento relativo ao reembolso de tratamentos e procedimentos de acompanhamento, bem como criar balcões únicos nacionais de coordenação juntos das seguradoras de saúde;
21. Lamenta que a aplicação da diretiva no domínio da «telemedicina» – serviços de saúde prestados à distância – tenha conduzido a uma certa falta de clareza no que respeita aos regimes de reembolso, uma vez que alguns Estados-Membros reembolsam ou proporcionam consultas de clínica geral e de especialidade à distância, enquanto outros não o fazem; insta a Comissão a apoiar a adoção das regras de reembolso, em conformidade com os artigos 7.º, n.º 1, e 4.º, n.º 1, para que estas também se apliquem à telemedicina, se for caso disso; incentiva os Estados-Membros a harmonizarem as suas abordagens em matéria de reembolso da telemedicina;
Regiões fronteiriças
22. Encoraja os Estados-Membros e as regiões fronteiriças a aprofundarem a cooperação transfronteiriça em matéria de cuidados de saúde, de forma eficiente e financeiramente sustentável, incluindo através da transmissão de informação acessível, suficiente e facilmente compreensível, para garantir o melhor tratamento possível dos doentes; solicita à Comissão que apoie e promova um intercâmbio estrutural de boas práticas entre as regiões fronteiriças; incentiva os Estados-Membros a utilizarem essas melhores práticas para melhorar os cuidados de saúde noutras regiões também;
23. Congratula-se com a proposta da Comissão de reforçar a coesão entre as regiões fronteiriças, suprimindo algumas das barreiras jurídicas e administrativas com que se deparam através da criação de um mecanismo transfronteiriço da UE;
Informação aos doentes
24. Recorda o papel essencial dos pontos de contacto nacionais na prestação de informações aos doentes, ajudando-os a tomar uma decisão informada sobre a procura de cuidados de saúde noutros Estados-Membros da UE; insta a Comissão e os Estados-Membros a investirem mais na criação e promoção de pontos de contacto nacionais de fácil acesso e claramente visíveis e de plataformas de saúde em linha para os doentes, que devem prestar informações acessíveis digitalmente, de utilização simples e isentas de barreiras aos doentes e profissionais de saúde em múltiplas línguas;
25. Recomenda à Comissão, em conjunto com organizações de doentes, que desenvolva orientações sobre o funcionamento dos PCN, com vista a facilitar e a melhorar significativamente as modalidades de intercâmbio sistemático de informações e práticas, a criar procedimentos, formulários ou manuais harmonizados, simplificados e de utilização simples para os doentes, bem como a estabelecer uma ligação entre os PCN e as fontes de informação e de conhecimento especializado presentes nos Estados‑Membros;
26. Exorta os Estados-Membros a disponibilizarem fundos suficientes para que os seus PCN possam desenvolver informações completas e solicita à Comissão que intensifique a cooperação entre os PCN em toda a União;
27. Sublinha o potencial da saúde em linha para melhorar o acesso dos doentes a informações sobre as possibilidades dos cuidados de saúde transfronteiriços e sobre os seus direitos ao abrigo da presente diretiva;
28. Exorta os Estados-Membros a instarem os prestadores de cuidados de saúde e hospitais a facultarem antecipadamente aos doentes uma estimativa de custos precisa e atualizada para o tratamento no estrangeiro, incluindo medicamentos, honorários, internamentos e taxas adicionais;
29. Solicita à Comissão que clarifique, em benefício dos peritos nacionais e através de campanhas de informação, a complexidade da atual situação jurídica decorrente da interação entre a diretiva e o regulamento sobre a coordenação da segurança social;
30. Solicita à Comissão que organize, em colaboração com as autoridades nacionais competentes, os PCN, as RER, as organizações de doentes e as redes de profissionais de saúde, campanhas de informação públicas exaustivas, incluindo através do aproveitamento de novas oportunidades digitais destinadas a promover a sensibilização estrutural para os direitos e obrigações dos doentes ao abrigo da diretiva;
31. Insta a Comissão a encorajar os Estados-Membros a tornarem as informações mais acessíveis em relação aos procedimentos através dos quais os doentes podem apresentar reclamações quando os seus direitos ao abrigo da presente diretiva tiverem sido desrespeitados ou mesmo violados;
32. Recomenda à Comissão que desenvolva orientações sobre o tipo de informações que os PCN devem facultar, em particular no que respeita à lista de tratamentos sujeitos ou isentos de autorização prévia, bem como os critérios aplicados e os procedimentos aplicáveis;
33. Solicita à Comissão Europeia e aos Estados-Membros que avaliem a necessidade de definir as razões pelas quais o acesso aos cuidados de saúde transfronteiriços deve ser assegurado por forma a garantir a livre circulação, mas os cuidados de saúde não devem constituir um fim em si mesmo enquanto os sistemas de saúde forem de competência nacional;
34. Encoraja a Comissão a promover uma maior cooperação entre as autoridades dos Estados-Membros em geral, e não apenas através dos pontos de contacto nacionais, e a avaliar melhor as vantagens das iniciativas de cooperação existentes, em particular nas regiões transfronteiriças, garantindo o acesso dos cidadãos a cuidados de saúde seguros, de qualidade elevada e eficazes;
Doenças raras, cancros raros e redes europeias de referência (RER)
35. Destaca a importância da cooperação a nível da UE para garantir a partilha eficiente de conhecimentos, informações e recursos destinados a combater eficazmente as doenças raras e crónicas, incluindo os cancros raros, em toda a UE; incentiva, nesse contexto, a Comissão a apoiar o estabelecimento de centros especializados em doenças raras na UE, que devem ser plenamente integrados nas RER;
36. Recomenda que seja dado seguimento às medidas já tomadas para reforçar a sensibilização e a compreensão do público sobre as doenças raras e cancros raros e aumentar o financiamento da I&D; solicita à Comissão que continue a garantir o acesso a informações, medicamentos e tratamentos médicos por parte de doentes com doenças raras em toda a UE, e a promover um melhor acesso a diagnósticos precoces e corretos; insta a Comissão a abordar a questão da taxa reduzida de registo de doenças raras e a desenvolver e promover normas comuns para o intercâmbio de dados relativos a registos de doenças raras;
37. Salienta a necessidade aguda de melhorar os modelos de adesão dos doentes, que se devem basear nas conclusões mais fiáveis de meta-análises e estudos empíricos em grande escala e refletir as realidades da prática médica e facultar recomendações no sentido de melhorar a dedicação do doente ao tratamento, em particular na gestão de doenças crónicas, sendo este um fator fundamental para avaliar a eficiência e eficácia dos sistemas de saúde;
38. Sublinha a importância e o valor acrescentado da mobilidade de profissionais de cuidados de saúde ao nível da UE, tanto ao longo das suas carreiras académicas como profissionais, bem como do papel especial que desempenham na melhoria dos conhecimentos e competências no âmbito de doenças raras;
39. Propõe que a Comissão lance um novo convite ao desenvolvimento de novas RER e continue a apoiar o desenvolvimento e a expansão do modelo das RER, de modo a reduzir as disparidades geográficas e as lacunas em matéria de conhecimentos especializados; insiste, contudo, em que um alargamento das RER não deve pôr em causa o funcionamento das RER existentes, na sua fase inicial;
40. Lamenta a incerteza que rodeia os princípios de funcionamento das redes europeias de referência e a sua interação com os sistemas nacionais de saúde e outros programas da UE; insta, por conseguinte, a Comissão a apoiar os Estados-Membros e as RER na definição de regras claras e transparentes em matéria de referenciação dos doentes e a chegar a um acordo sobre o tipo de apoio a prestar pelos Estados-Membros às RER;
41. Insta a Comissão a pôr em marcha um plano de ação, através do Programa Comum Europeu sobre Doenças Raras, para o desenvolvimento e financiamento sustentável das redes europeias de referência e das redes de doentes que as apoiam; incentiva os Estados-Membros a apoiarem os prestadores de cuidados de saúde no âmbito das redes europeias de referência (RER) e a integrarem estas redes nos seus sistemas de saúde, adaptando os respetivos quadros jurídicos e regulamentares e remetendo para as RER nos seus planos nacionais em matéria de doenças raras e de cancros;
Reconhecimento mútuo das receitas eletrónicas
42. Deplora as dificuldades com que se deparam os doentes, especialmente nas zonas fronteiriças, para garantir o acesso e o reembolso de medicamentos noutros Estados‑Membros, devido às diferenças de disponibilidade e de regras administrativas em toda a UE; insta os Estados-Membros e as suas respetivas autoridades de saúde a lidarem com as questões jurídicas e práticas que dificultam o reconhecimento mútuo de receitas médicas em toda a UE e insta a Comissão a adotar medidas de apoio nesse sentido;
43. Deplora as dificuldades com que se deparam os doentes para garantir o acesso e o reembolso de medicamentos noutros Estados-Membros, devido às diferenças de disponibilidade e de regras em toda a UE;
44. Apela à Comissão para elaborar um plano de ação que tenha em vista uma solução sistemática para o problema dos preços excessivamente elevados dos medicamentos e da grande disparidade de preços nos diversos Estados-Membros;
45. Insta a Comissão a tomar medidas para garantir que as receitas médicas emitidas pelos centros de especialização ligados às RER são aceites para reembolso em todos os Estados-Membros;
46. Regozija-se com o apoio do Mecanismo Interligar a Europa (MIE) no âmbito dos esforços para garantir o desenvolvimento bem-sucedido dos projetos-piloto em curso no domínio do intercâmbio de receitas eletrónicas e dos historiais dos doentes e abrir caminho para que outros Estados-Membros o façam até 2020; insiste em que este apoio seja prosseguido no próximo QFP;
Saúde em linha
47. Reconhece que a saúde em linha pode ajudar a garantir a sustentabilidade dos sistemas de saúde, através da redução de determinados custos, e pode constituir uma parte importante da resposta da UE aos desafios atuais em matéria de cuidados de saúde; sublinha que a interoperabilidade da saúde em linha deve tornar-se uma prioridade, a fim de melhorar os registos mundiais dos doentes e a continuidade dos cuidados a par da garantia da privacidade dos doentes; considera que deve ser dada especial atenção à possibilidade de todos os doentes terem acesso fácil aos cuidados, sobretudo os idosos e as pessoas com deficiência; sugere, neste contexto, que os Estados-Membros tomem medidas para investir na literacia digital dos cidadãos e para reforçar as novas soluções face ao envelhecimento da população, utilizando todos os meios à sua disposição para garantir que a exclusão devido à digitalização seja evitada;
48. Congratula-se com a criação da infraestrutura de serviços digitais de saúde em linha à escala da UE (eHDSI), que promoverá o intercâmbio transfronteiriço de dados de saúde, designadamente das receitas eletrónicas e dos historiais dos doentes;
49. Convida os Estados-Membros a, com celeridade, tomarem medidas para ligarem os respetivos sistemas de saúde à eHDSI através de um PCN específico para a saúde em linha subsequente às próprias avaliações de riscos e solicita à Comissão que facilite este processo;
50. Exorta a Comissão a dar resposta, com caráter prioritário, às necessidades em matéria de saúde digital nos Estados-Membros; congratula-se com o apoio que a Comissão conferiu a recursos financeiros sustentáveis para assegurar estratégias nacionais robustas de saúde digital e criar um quadro adequado para ações conjuntas a nível da UE, a fim de prevenir a duplicação dos esforços e de garantir o intercâmbio de melhores práticas para uma utilização mais generalizada das tecnologias digitais nos Estados‑Membros;
51. Solicita aos Estados-Membros que continuem a intensificar em toda a Europa a cooperação entre as suas autoridades de saúde, a fim de conectar os dados de saúde em linha e registos pessoais com os instrumentos de prescrição em linha, permitindo aos profissionais de saúde prestarem aos seus doentes cuidados personalizados e bem informados e promovendo a cooperação entre médicos, a par do respeito pleno da legislação da UE em matéria de proteção de dados; insta a Comissão a tomar medidas com vista à facilitação de tais ações;
52. Insta os Estados-Membros a aplicarem rapidamente o Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (RGPD), a fim de salvaguardar os dados dos doentes utilizados nas aplicações de saúde em linha, e sublinha a importância, em especial no domínio da saúde, de acompanhar a aplicação do Regulamento (UE) n.º 910/2014 relativo à identificação eletrónica e aos serviços de confiança para as transações eletrónicas no mercado interno(15); sublinha a necessidade de permitir aos cidadãos acederem e fazerem uso dos seus próprios dados de saúde, em conformidade com os princípios estabelecidos no RGPD;
Brexit
53. Solicita à Comissão que negoceie um acordo sólido pós-Brexit com o Reino Unido em matéria de saúde, prestando especial atenção aos direitos transfronteiriços dos doentes e ao funcionamento das RER;
54. Congratula-se com a intenção do Tribunal de Contas Europeu de realizar uma auditoria sobre a eficácia da aplicação da diretiva e de examinar, em particular, o acompanhamento e a supervisão desta aplicação por parte da Comissão, os resultados alcançados até à data a nível da prestação de cuidados de saúde transfronteiriços e a eficácia do quadro de financiamento da UE no que diz respeito à ação financiada;
55. Insta os Estados-Membros a aplicarem, de forma adequada e em plena cooperação com a Comissão, todas as disposições da diretiva;
o o o
56. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho e à Comissão.
Decisão n.º 1786/2002/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de setembro de 2002, que aprova um programa de ação comunitária no domínio da saúde pública (2003-2008) (JO L 271 de 9.10.2002, p. 1).
Decisão n.º 1350/2007/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 23 de outubro de 2007, que cria um segundo Programa de Ação Comunitária no domínio da Saúde (2008-2013) (JO L 301 de 20.11.2007, p. 3).
Regulamento (UE) n.º 282/2014 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de março de 2014, relativo à criação de um terceiro Programa de ação da União no domínio da saúde (2014-2020) e que revoga a Decisão n.º 1350/2007/CE, JO L 86 de 21.3.2014, p. 1.
Relatório de síntese da Comissão sobre a sua consulta intitulado «Transformation Health and Care in the Digital Single Market» (A evolução dos serviços de saúde e dos cuidados de saúde no mercado único digital»), 2018, https://ec.europa.eu/health/sites/health/files/ehealth/docs/2018_consultation_dsm_en.pdf