Resolução do Parlamento Europeu, de 14 de fevereiro de 2019, sobre o direito à manifestação pacífica e o uso proporcionado da força (2019/2569(RSP))
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta os Tratados da UE, nomeadamente os artigos 2.º, 3.º, 4.º, 6.º e 7.º do Tratado da União Europeia (TUE),
– Tendo em conta a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a seguir designada «a Carta»),
– Tendo em conta a Convenção Europeia dos Direitos Humanos (CEDH) e a jurisprudência conexa do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH),
– Tendo em conta a sua resolução, de 16 de janeiro de 2019, sobre a situação dos direitos fundamentais na União Europeia em 2017(1),
– Tendo em conta o artigo 123.º, n.º 2, do seu Regimento,
A. Considerando que a UE assenta nos valores do respeito pela dignidade humana, pela liberdade, pela democracia, pela igualdade, pelo Estado de Direito e pelos direitos humanos, incluindo os direitos das pessoas pertencentes a minorias; que estes valores são comuns aos Estados-Membros numa sociedade caracterizada pelo pluralismo, pela não discriminação, tolerância, justiça, solidariedade e igualdade entre homens e mulheres;
B. Considerando que o Estado de Direito constitui a coluna dorsal da democracia e é um dos princípios fundadores da UE, funcionando com base na presunção da confiança mútua entre os Estados-Membros da conformidade com a democracia, o Estado de Direito e os direitos fundamentais, tal como consagrado na Carta dos Direitos Fundamentais e na CEDH;
C. Considerando que a UE se comprometeu a respeitar a liberdade de expressão e de informação, bem como a liberdade de reunião e de associação;
D. Considerando que o artigo 11.º da CEDH e o artigo 12.º da Carta estabelecem que qualquer pessoa tem direito à liberdade de reunião pacífica e à liberdade de associação, incluindo o direito de, com outrem, fundar e filiar-se em sindicatos para a defesa dos seus interesses;
E. Considerando que, nos termos do artigo 11.º da CEDH, «[o] exercício deste direito só pode ser objeto de restrições que, sendo previstas na lei, constituírem disposições necessárias, numa sociedade democrática, para a segurança nacional, a segurança pública, a defesa da ordem e a prevenção do crime, a proteção da saúde ou da moral, ou a proteção dos direitos e das liberdades de terceiros»;
F. Considerando que, ainda nos termos do artigo 11.º da CEDH, a liberdade de reunião não impede «que sejam impostas restrições legítimas ao exercício destes direitos pelos membros das forças armadas, da polícia ou da administração do Estado»;
G. Considerando que o artigo 12.º da Carta afirma igualmente que «[o]s partidos políticos ao nível da União contribuem para a expressão da vontade política dos cidadãos da União»;
H. Considerando que a liberdade de associação deve ser protegida; que o dinamismo da sociedade civil e o pluralismo dos meios de comunicação desempenham um papel crucial na promoção de uma sociedade aberta e pluralista e na participação dos cidadãos no processo democrático, bem como no reforço da responsabilização dos governos;
I. Considerando que a liberdade de reunião está associada à liberdade de expressão, tal como garantido pelo artigo 11.º da Carta e pelo artigo 10.º da CEDH, nos termos dos quais todas as pessoas têm direito à liberdade de expressão. Este direito compreende a liberdade de opinião e a liberdade de receber e de transmitir informações ou ideias, sem que possa haver ingerência de quaisquer poderes públicos e sem consideração de fronteiras;
J. Considerando que o exercício desta liberdades, porquanto implica deveres e responsabilidades, pode ser sujeito a certas formalidades, condições, restrições ou sanções previstas pela lei e necessárias numa sociedade democrática, a bem da segurança nacional, da integridade territorial ou da segurança pública, da defesa da ordem e da prevenção do crime, da proteção da saúde ou da moral, da proteção da honra ou dos direitos de outrem, para impedir a divulgação de informações confidenciais, ou para garantir a autoridade e a imparcialidade do poder judicial, como estabelecido no artigo 10.º da CEDH;
K. Considerando que o artigo 52.º da Carta estipula que «qualquer restrição ao exercício dos direitos e liberdades reconhecidos pela presente Carta deve ser prevista por lei e respeitar o conteúdo essencial desses direitos e liberdades»;
L. Considerando que, nos termos do artigo 4.º, n.º 2, do TUE, a União «respeita as funções essenciais do Estado [dos Estados-Membros], nomeadamente as que se destinam a garantir a integridade territorial, a manter a ordem pública e a salvaguardar a segurança nacional.»; que, «[e]m especial, a segurança nacional continua a ser da exclusiva responsabilidade de cada Estado-Membro»;
M. Considerando que, de acordo com a jurisprudência do TEDH e do Tribunal de Justiça da União Europeia, todas as restrições aos direitos fundamentais e às liberdades cívicas devem respeitar os princípios da legalidade, da necessidade e da proporcionalidade;
N. Considerando que as autoridades responsáveis pela aplicação da lei de vários Estados-Membros foram criticadas por subverterem o direito de manifestação e empregarem uma força excessiva;
1. Exorta os Estados-Membros a respeitarem os direitos à liberdade de reunião pacífica, à liberdade de associação e à liberdade de expressão;
2. Salienta que o debate público é vital para o funcionamento das sociedades democráticas;
3. Condena a adoção, nos últimos anos, de leis restritivas em matéria de liberdade de reunião por vários Estados‑Membros;
4. Condena o recurso às intervenções violentas e desproporcionadas das autoridades de vários Estados-Membros durante protestos e manifestações de cariz pacífico; incentiva as autoridades competentes a assegurarem uma investigação transparente, imparcial, independente e eficaz sempre que haja suspeitas ou alegações de utilização desproporcionada da força; recorda que os organismos responsáveis pela aplicação da lei devem ser sempre responsabilizados pelo exercício das suas funções e o seu cumprimento dos quadros jurídicos e operacionais relevantes;
5. Insta os Estados-Membros a zelarem por que o uso da força pelas autoridades policiais seja sempre lícito, proporcionado, necessário e em último recurso, e que preserve a vida humana e a integridade física; assinala que o uso indiscriminado da força contra multidões viola o princípio da proporcionalidade;
6. Regista o importante papel desempenhado pelos jornalistas e repórteres fotográficos na divulgação de casos de violência desproporcionada e condena todas as situações em que tenham sido visados deliberadamente;
7. Considera que a violência contra manifestantes pacíficos nunca pode ser uma solução num debate ou na política;
8. Reconhece que a polícia, que também conta com muitos feridos, está a atuar em condições difíceis, nomeadamente devido à hostilidade de alguns manifestantes, mas também em consequência de uma excessiva carga de trabalho; condena todo o tipo de violência contra pessoas ou bens perpetrado por manifestantes violentos e militantes, cuja única intenção é a de provocar a violência e prejudicar a legitimidade de protestos pacíficos;
9. Incentiva as autoridades policiais dos Estados-Membros a participarem ativamente na formação ministrada pela Agência da União Europeia para a Formação Policial (CEPOL) em «Ordem pública – policiamento de grandes eventos»; exorta os Estados-Membros a partilharem as melhores práticas neste domínio;
10. Salienta a importância de garantir a segurança dos agentes das forças da ordem, polícias e soldados envolvidos em operações de manutenção da segurança durante as manifestações públicas de protesto.
11. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, aos governos e parlamentos dos Estados-Membros, ao Conselho da Europa, à Organização para a Segurança e a Cooperação na Europa e às Nações Unidas.