Resolução do Parlamento Europeu, de 10 de fevereiro de 2021, sobre a aplicação do artigo 43.º da Diretiva 2013/32/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa a procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de proteção internacional (2020/2047(INI))
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta a Declaração Universal dos Direitos do Homem, aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 1948, e o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Políticos,
– Tendo em conta a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança,
– Tendo em conta a Convenção Europeia dos Direitos Humanos (CEDH),
– Tendo em conta a Convenção relativa ao Estatuto dos Refugiados de 1951 e o respetivo Protocolo de 1967, nomeadamente o direito à não repulsão,
– Tendo em conta a Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia (a «Carta»), nomeadamente os artigos 1.º, 3.º, 4.º, 6.º, 7.º, 18.º, 19.º, 20.º e 47.º,
– Tendo em conta o Pacto Global para Migrações Seguras, Ordeiras e Regulares adotado pela Assembleia Geral das Nações Unidas em 19 de dezembro de 2018,
– Tendo em conta o artigo 78.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia,
– Tendo em conta a Diretiva 2013/32/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, relativa a procedimentos comuns de concessão e retirada do estatuto de proteção internacional(1) (Diretiva Procedimentos de Asilo),
– Tendo em conta a jurisprudência na matéria do Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) e do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos (TEDH),
– Tendo em conta a Diretiva 2013/33/UE do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece normas em matéria de acolhimento dos requerentes de proteção internacional (Diretiva Condições de Acolhimento)(2),
– Tendo em conta o acordo provisório entre o Parlamento Europeu e o Conselho, de 14 de junho de 2018, sobre a reformulação da Diretiva Condições de Acolhimento,
– Tendo em conta o Regulamento (UE) 2016/399 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de março de 2016, que estabelece o código da União relativo ao regime de passagem de pessoas nas fronteiras (Código das Fronteiras Schengen)(3),
– Tendo em conta o Regulamento (UE) n.º 604/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 26 de junho de 2013, que estabelece os critérios e mecanismos de determinação do Estado-Membro responsável pela análise de um pedido de proteção internacional apresentado num dos Estados-Membros por um nacional de um país terceiro ou por um apátrida (Regulamento Dublim III)(4),
– Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 16 de abril de 2020, intitulada «COVID-19: Orientações sobre a aplicação das disposições pertinentes da UE em matéria de procedimentos de asilo e de regresso e sobre a reinstalação» (C(2020)2516),
– Tendo em conta a avaliação de execução europeia do Serviço de Estudos do Parlamento Europeu (EPRS), de novembro de 2020, sobre procedimentos de asilo na fronteira(5),
– Tendo em conta o estudo do Gabinete Europeu de Apoio em matéria de Asilo (EASO), de setembro de 2020, intitulado «Border Procedures for Asylum Applications in EU+ Countries» (Procedimentos na fronteira para pedidos de asilo nos países UE+), e a publicação da EASO de setembro de 2019 intitulada «Guidance on asylum procedure: operational standards and indicators» (Orientações sobre o procedimento de asilo: normas e indicadores operacionais),
– Tendo em conta o relatório de 2020 sobre os direitos fundamentais elaborado pela Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia (FRA),
– Tendo em conta o parecer 3/2019 da FRA, de 4 de março de 2019, intitulado «Update of the 2016 Opinion of the European Union Agency for Fundamental Rights on fundamental rights in the ‘hotspots’ set up in Greece and Italy» (Atualização do parecer de 2016 da Agência dos Direitos Fundamentais da União Europeia sobre os direitos fundamentais nos centros de registo criados na Grécia e em Itália),
– Tendo em conta o relatório da FRA, de 8 de dezembro de 2020, intitulado «Migration: Fundamental Rights Challenges at Land Borders» (Desafios em matéria de direitos fundamentais nas fronteiras terrestres),
– Tendo em conta as diretrizes e os princípios recomendados sobre direitos humanos nas fronteiras internacionais do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos,
– Tendo em conta o Acordo Interinstitucional entre o Parlamento Europeu, o Conselho da União Europeia e a Comissão Europeia, de 2016, sobre Legislar Melhor,
– Tendo em conta a sua Resolução, de 30 de maio de 2018, sobre a interpretação e aplicação do Acordo Interinstitucional «Legislar melhor»(6),
– Tendo em conta o relatório da Comissão das Liberdades Cívicas, da Justiça e dos Assuntos Internos, de 22 de maio de 2018, sobre a proposta de regulamento do Parlamento Europeu e do Conselho que institui um procedimento comum de proteção internacional na União Europeia e que revoga a Diretiva 2013/32/UE,
– Tendo em conta o artigo 54.º do seu Regimento, bem como o artigo 1.º, n.º 1, alínea e), e o anexo 3 da Decisão da Conferência dos Presidentes, de 12 de dezembro de 2002, sobre o processo de autorização para elaborar relatórios de iniciativa,
– Tendo em conta o relatório da Comissão das Liberdades Cívicas, da Justiça e dos Assuntos Internos (A9-0005/2021),
A. Considerando que a presente resolução visa apresentar aos colegisladores informações fundamentadas sobre a atual aplicação dos procedimentos nas fronteiras, avaliando a forma como os Estados-Membros aplicam o artigo 43.º da Diretiva Procedimentos de Asilo e as disposições conexas; considerando que a presente resolução não se destina a substituir o relatório completo sobre a execução da Diretiva Procedimentos de Asilo da Comissão, há muito aguardado, nem as negociações legislativas relativas à proposta de alteração do Regulamento Procedimentos de Asilo;
B. Considerando que, muitas vezes, não são recolhidos ou não são disponibilizados ao público dados desagregados e comparáveis relativos à aplicação do artigo 43.º da Diretiva Procedimentos de Asilo; considerando que não estão disponíveis os custos financeiros dos procedimentos de fronteira; considerando que a privação de liberdade pode acarretar custos humanos significativos, em especial se os centros de detenção nas fronteiras forem inadequados ou se não forem aplicadas garantias processuais ou se estas garantias forem aplicadas de forma inadequada;
C. Considerando que a Diretiva Procedimentos de Asilo não apresenta uma definição clara dos procedimentos de fronteira nem especifica os seus objetivos; considerando que o artigo 43.º, n.º 1, da Diretiva Procedimentos de Asilo permite que os Estados-Membros recorram a procedimentos de fronteira; considerando que 14 Estados-Membros aplicam procedimentos de fronteira e que três desses Estados-Membros, abrangidos pela avaliação de execução europeia do EPRS, têm invocado motivos que ultrapassam o âmbito previsto na Diretiva Procedimentos de Asilo; considerando que os Estados-Membros podem prever procedimentos de apreciação da admissibilidade e/ou de apreciação quanto ao mérito na fronteira ou em zonas de trânsito, em circunstâncias bem definidas; considerando que a maioria dos Estados-Membros também avalia a possibilidade de aplicação do sistema de Dublim nas fronteiras ou nas zonas de trânsito; considerando que os procedimentos na fronteira representam apenas uma percentagem reduzida de todos os processos analisados pelos órgãos de decisão, exceto no caso da Grécia, onde mais de 50 % dos pedidos são tratados através de procedimentos acelerados, em conformidade com a Declaração UE-Turquia;
D. Considerando que o artigo 43.º da Diretiva Procedimentos de Asilo não especifica explicitamente em que fronteiras os Estados-Membros podem fazer uso de procedimentos na fronteira; considerando que a avaliação de execução europeia do EPRS considera que pelo termo «fronteira», constante do artigo acima referido, deve entender-se as fronteiras externas da UE; considerando que dois Estados-Membros aplicam igualmente procedimentos de fronteira nas fronteiras internas e mantêm detidos os requerentes em instalações policiais;
E. Considerando que alguns Estados-Membros detêm requerentes de asilo no quadro de procedimentos de fronteira sem que exista uma base jurídica no respetivo direito nacional; considerando que, além de garantias insuficientes para os requerentes, tal pode também resultar na negação do direito de visita por deputados ao Parlamento;
F. Considerando que a detenção no quadro de procedimentos de fronteira se rege pelas mesmas normas que a detenção de requerentes noutros locais do território de um Estado-Membro; considerando que a Diretiva Condições de Acolhimento estipula que os requerentes só podem ser detidos como último recurso depois de todas as medidas alternativas à detenção não privativas de liberdade terem sido devidamente ponderadas, e que a detenção deve basear-se nos princípios da necessidade e da proporcionalidade; considerando que, se a detenção for ordenada por uma autoridade administrativa, os Estados-Membros submetem a legalidade da detenção a um controlo judicial acelerado, que se efetua oficiosamente e/ou a pedido do requerente; considerando que, no caso dos menores, os Estados‑Membros devem, no âmbito do atual quadro jurídico, envidar todos os esforços ao seu alcance para não os manter em detenção e para os colocar em alojamentos adequados para menores;
G. Considerando que, apesar do aumento significativo de alegadas violações dos direitos fundamentais nas fronteiras externas da UE, os Estados-Membros não são obrigados a criar um mecanismo de controlo independente que garanta a proteção dos direitos fundamentais nas fronteiras externas;
H. Considerando que devem ser prestadas informações claras, bem como uma assistência adequada, aos nacionais de países terceiros ou apátridas no âmbito dos procedimentos de fronteira, incluindo assistência jurídica e serviços de interpretação, especialmente no que respeita à possibilidade de apresentar um pedido de proteção internacional;
I. Considerando que, segundo a avaliação de execução europeia do EPRS, as garantias processuais previstas na Diretiva Procedimentos de Asilo, em particular o direito à informação, a assistência jurídica e a interpretação, não são aplicadas, ou apenas são aplicadas de forma restritiva, pelos Estados-Membros examinados na avaliação;
J. Considerando que a avaliação de execução europeia do EPRS revela vários casos de incumprimento da Diretiva Procedimentos de Asilo; que a Comissão instaurou processos por infração contra apenas dois Estados-Membros;
Observações gerais
1. Observa que a Comissão realizou consultas às partes interessadas e manteve conversações com o Parlamento e os Estados-Membros, no quadro elaboração do Novo Pacto em matéria de Migração e Asilo; salienta, no entanto, que, apesar da obrigação legal de elaboração de relatórios que lhe incumbe e dos requisitos decorrentes do Acordo Interinstitucional «Legislar Melhor», a Comissão nunca apresentou um relatório sobre a execução da Diretiva Procedimentos de Asilo e que, em 2016 e em 2020, apresentou propostas de um regulamento relativo a procedimentos de asilo sem prever qualquer avaliação de impacto; espera que a Comissão apresente este relatório, que é aguardado desde 2017;
2. Reitera a importância de uma abordagem baseada em dados concretos para orientar uma elaboração de políticas coerente;
3. Observa que a monitorização e a recolha de dados estatísticos são essenciais para garantir a conformidade com o direito da UE; insta os Estados-Membros a coligirem estatísticas sobre: i) o número de pedidos apreciados no contexto de procedimentos na fronteira e a categoria de requerentes em causa; ii) os tipos de motivos invocados para o recurso a um procedimento na fronteira e a sua frequência; iii) os resultados dos procedimentos de fronteira, tanto em primeira instância como na fase de recurso, e iv) o número e as categorias de pessoas não encaminhadas para procedimentos na fronteira;
Âmbito
4. Salienta que, na atualidade, os procedimentos na fronteira constituem exceções à regra legalmente definida segundo a qual assiste aos requerentes de asilo o direito de entrar no território de um Estado-Membro; constata que muitos pedidos de proteção internacional são apresentados na fronteira ou numa zona de trânsito de um Estado‑Membro antes de ser adotada uma decisão sobre a entrada do requerente; observa que, nesses casos, os Estados-Membros só podem prever procedimentos de fronteira nos casos previstos de forma exaustiva nos artigos 31.º, n.º 8, e 33.º da Diretiva Procedimentos de Asilo e em conformidade com os princípios básicos e as garantias fundamentais do capítulo II da diretiva em apreço; assinala que a transposição e a aplicação dos procedimentos de fronteira nos termos da Diretiva Procedimentos de Asilo variam entre Estados-Membros, em virtude de uma ausência de uniformidade em toda a UE; observa que a maioria dos Estados-Membros aplica procedimentos de fronteira apenas num número reduzido de casos e que vários Estados-Membros se abstêm, por princípio, de utilizar procedimentos de fronteira; salienta, no entanto, que três dos sete Estados-Membros examinados na avaliação de execução europeia do EPRS aplicam procedimentos de fronteira invocando motivos que ultrapassam o âmbito previsto no artigo 43.º da Diretiva Procedimentos de Asilo, e exorta-os a absterem-se de o fazer; insta, além disso, os Estados-Membros a absterem-se de aplicar procedimentos de fronteira nas fronteiras internas;
5. Observa que todas as pessoas que solicitam proteção internacional têm interesse em que os seus pedidos sejam tratados com a maior celeridade e eficiência possíveis, contanto que todos os pedidos sejam objeto de uma avaliação individual e que as garantias processuais e os direitos concedidos aos requerentes nos termos da legislação da União sejam aplicáveis e possam ser efetivamente exercidos;
A ficção da não entrada e detenção
6. Recorda que os procedimentos na fronteira implicam a análise de um pedido de asilo na fronteira ou numa zona de trânsito antes de ser tomada uma decisão sobre a entrada no território de um Estado-Membro; reafirma que a recusa de entrada ao abrigo do Código das Fronteiras Schengen não deve prejudicar a aplicação de disposições especiais relativas ao direito de asilo e a proteção internacional; observa, por conseguinte, que os Estados-Membros têm a obrigação de avaliar se um requerente de asilo necessita de proteção;
7. Assinala, além disso, que, nos termos do artigo 9.º, n.º 1, da Diretiva Procedimentos de Asilo, os requerentes devem ser autorizados a permanecer no território dos Estados‑Membros, incluindo na fronteira ou em zonas de trânsito em que o pedido de proteção internacional foi apresentado;
8. Salienta que o facto de um requerente não ter entrado legalmente no território do Estado-Membro, quando, na realidade permanece nesse território, constitui uma ficção jurídica; salienta que esta ficção jurídica afeta apenas o direito de entrada e permanência, mas não significa que o requerente não esteja sob a jurisdição do Estado‑Membro em causa;
9. Salienta que existe a probabilidade de os requerentes sujeitos a procedimentos de fronteira serem mantidos em detenção durante a análise dos seus pedidos de asilo; salienta, além disso, que todos os Estados-Membros objeto de análise na avaliação de execução europeia efetuada pelo EPRS mantêm em detenção requerentes de asilo no âmbito dos procedimentos de fronteira;
10. Reafirma que, em conformidade com o disposto na Diretiva Condições de Acolhimento, os Estados-Membros não podem manter uma pessoa detida pelo simples facto de se tratar de um requerente, e que os requerentes só podem ser mantidos em detenção em condições excecionais claramente definidas; recorda o seu acordo provisório conjunto com o Conselho sobre a reformulação da Diretiva Condições de Acolhimento, que prevê que os Estados-Membros não mantenham um requerente detido com base na sua nacionalidade; salienta que a Diretiva Condições de Acolhimento estipula que a detenção deve continuar a ser uma medida de último recurso, deve ser aplicada por um período tão curto quanto possível e apenas enquanto forem aplicáveis os motivos enunciados no artigo 8.º, n.º 3, da diretiva em referência, e que as pessoas mantidas em detenção devem ter a possibilidade de apresentar recurso contra a sua privação de liberdade; reafirma que o direito à liberdade consagrado no artigo 6.º da Carta e no artigo 5.º da CEDH também se aplica nas fronteiras da UE; lamenta que não tenham sido praticamente desenvolvidas e aplicadas alternativas à detenção no quadro dos procedimentos na fronteira, e incentiva os Estados-Membros a tomarem as medidas necessárias para garantir a disponibilidade de tais alternativas;
11. Manifesta preocupação com o facto de alguns Estados-Membros manterem os requerentes detidos no quadro de procedimentos na fronteira sem uma base jurídica relevante para a detenção ao abrigo de procedimentos de fronteira no direito nacional, uma vez que tal pode dar lugar a garantias insuficientes; salienta que, se os Estados-Membros optarem por recorrer à detenção, devem prever, para esse fim, uma base jurídica no direito nacional;
12. Recorda que, nos processos apensos C-924/19 PPU e C-925/19 PPU, o TJUE deliberou que o facto de um requerente ser livre de deixar a zona de trânsito para se deslocar para um país terceiro não significa que o requerente não esteja em detenção;
13. Está profundamente preocupado com os relatos de violações graves dos direitos humanos e de condições de detenção deploráveis em zonas de trânsito ou em centros de detenção nas zonas fronteiriças; insta os Estados-Membros a garantirem condições de acolhimento dignas nas instalações fronteiriças, em conformidade com as normas previstas na Diretiva Condições de Acolhimento; recorda, a este respeito, que os requerentes mantidos em detenção devem ser tratados no pleno respeito pela sua dignidade humana;
14. Recorda que o superior interesse da criança deverá constituir uma das principais preocupações dos Estados-Membros ao aplicarem a Diretiva Procedimentos de Asilo, de acordo com a Carta e com a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança de 1989; observa que o Comité dos Direitos da Criança das Nações Unidas esclareceu que as crianças não podem, em circunstância, alguma, ser detidas por motivos relacionados com a imigração; reitera a sua posição sobre o Regulamento Procedimentos de Asilo, segundo a qual os menores não devem, em caso algum, ser detidos no âmbito de procedimentos na fronteira, reafirmando que estes procedimentos só podem ser aplicados a menores se existir uma alternativa à sua detenção; exorta os Estados-Membros que atualmente aplicam procedimentos de fronteira a menores a criarem alternativas à detenção, em conformidade com o interesse superior da criança; solicita aos Estados-Membros que só apliquem procedimentos de fronteira se existirem tais alternativas não privativas de liberdade;
Recusa de entrada e controlo
15. Destaca as recentes conclusões da FRA, nomeadamente o facto de o número de alegados casos de violações dos direitos fundamentais assinalados nas fronteiras externas ter aumentado significativamente nos últimos anos; observa que tal inclui inúmeros casos de recusa de entrada sem registo dos pedidos de asilo, nomeadamente no contexto dos procedimentos na fronteira; reafirma que os Estados-Membros são obrigados a impedir a passagem não autorizada das fronteiras e recorda que esta obrigação não prejudica os direitos que assistem aos requerentes de proteção internacional; concorda com a posição da FRA quanto ao facto de a regularidade e a gravidade destes alegados incidentes constituírem uma grave preocupação em matéria de direitos fundamentais; reafirma que a recusa automática de entrada, a repulsão e as expulsões coletivas são proibidas ao abrigo do direito internacional e do direito da UE; salienta, além disso, que, nos termos do artigo 8.º da Diretiva Procedimentos de Asilo, os Estados-Membros têm o dever de informar as pessoas sobre a possibilidade de requerer asilo caso existam indícios de que necessitam de proteção, e que as pessoas a quem é recusada a entrada devem ter acesso a vias de recurso efetivas, em conformidade com o direito da UE e a CEDH; lamenta todos os casos em que os Estados-Membros não acatam as suas obrigações nesta matéria e exorta-os a respeitarem plenamente essas obrigações; insta a Comissão a velar de forma efetiva pelo cumprimento destas obrigações por parte dos Estados-Membros, nomeadamente através da suspensão dos pagamentos da UE em caso de deficiências graves;
16. Considera importante criar um mecanismo independente de monitorização e insta os Estados-Membros a conceder aos organismos responsáveis pela monitorização acesso sem restrições às infraestruturas nas fronteiras, a fim de garantir a proteção efetiva dos direitos fundamentais e a denúncia sistemática de violações, em conformidade com as recomendações da FRA constantes do seu relatório sobre as questões suscitadas em matéria de direitos nas fronteiras terrestres; entende que um controlo independente deve igualmente verificar a qualidade do processo de tomada de decisões e os seus resultados, bem como as condições de detenção e o cumprimento das garantias processuais; considera que as instituições nacionais independentes e competentes em matéria de direitos humanos, bem como as ONG, as agências da UE, como a FRA, e as organizações internacionais, como o ACNUR, devem fazer parte dos órgãos de controlo;
Menores não acompanhados e requerentes vulneráveis que necessitam de garantias processuais especiais no procedimento de fronteira
17. Observa que o artigo 24.º da Diretiva Procedimentos de Asilo especifica que os Estados-Membros devem avaliar dentro de um prazo razoável após ter sido feito um pedido de proteção internacional se o requerente necessita de garantias processuais especiais, e que não devem aplicar o procedimento de fronteira se este quadro não permitir oferecer essas garantias;
18. Salienta que, embora os Estados-Membros tenham criado mecanismos para identificar os requerentes que necessitam de garantias processuais especiais, muitas vezes esses mecanismos não são eficazes para detetar essas necessidades e, quando as detetam, avaliam frequentemente apenas necessidades visíveis; observa que a identificação rápida e eficaz dos requerentes que necessitam de garantias processuais especiais continua a ser um desafio; salienta que as pessoas vulneráveis têm direito a que as suas necessidades de garantias processuais especiais sejam avaliadas e, caso lhes sejam aplicados procedimentos de fronteira, têm direito a receber apoio adequado ao abrigo do direito da UE; insta os Estados-Membros a velarem por que todos os requerentes que necessitam de garantias processuais especiais sejam efetivamente identificados e que lhes seja concedido pleno acesso a essas garantias e a apoio, tal como estipulado na Diretiva Condições de Acolhimento; salienta que, nos casos em que não possa ser concedido apoio adequado no âmbito do procedimento na fronteira, ou sempre que o órgão de decisão considere que o requerente necessita de garantias processuais específicas, prestando especial atenção às vítimas de tortura, violação ou outras formas graves de violência psicológica, física, sexual ou violência baseada no género, o órgão de decisão não deve aplicar, ou deve deixar de aplicar, estes procedimentos ao requerente;
19. Recorda que o artigo 25.º, n.º 6, alínea b), da Diretiva Procedimentos de Asilo prevê um conjunto limitado de circunstâncias que permitam aos Estados-Membros tratar os pedidos de menores não acompanhados por via de um procedimento de fronteira; salienta que os Estados-Membros objeto de análise não dispõem de métodos adequados de avaliação da idade; insta os Estados-Membros a garantirem o respeito do interesse superior da criança, bem como a protegerem as crianças, incluindo as vítimas de tráfico de seres humanos; salienta que a Diretiva Procedimentos de Asilo confere aos Estados‑Membros a possibilidade de isentarem os menores não acompanhados do procedimento de fronteira e de tratarem os seus pedidos em conformidade com o procedimento de asilo normal; exorta os Estados-Membros a isentarem os menores não acompanhados dos procedimentos de fronteira;
Garantias processuais
20. Observa que os procedimentos na fronteira são procedimentos acelerados e recorda que, nos termos do artigo 43.º da Diretiva Procedimentos de Asilo, os requerentes abrangidos por procedimentos na fronteira gozam dos mesmos direitos e garantias que os requerentes no quadro de procedimentos normais;
21. Salienta que foram detetados problemas significativos no que respeita ao acesso a assistência jurídica e à respetiva qualidade em todos os Estados-Membros examinados; salienta que a assistência jurídica é fundamental para garantir procedimentos de asilo equitativos; recomenda que esteja garantida assistência jurídica gratuita em primeira instância, logo que o pedido de asilo seja registado; exorta os Estados-Membros a viabilizarem também um acesso efetivo a assistência jurídica na prática e a garantirem a disponibilidade de um número suficiente de advogados qualificados;
22. Observa que a Diretiva Procedimentos de Asilo confere aos Estados-Membros a possibilidade de permitirem o acesso de ONG ao procedimento na fronteira para fins de prestação de assistência aos requerentes; lamenta que, no âmbito dos procedimentos de fronteira, muitos Estados-Membros não regulamentem esse acesso nas infraestruturas fronteiriças, nos pontos de passagem e nas zonas de trânsito para organizações não governamentais especializadas, já que estas organizações podem desempenhar um papel fundamental para garantir os direitos jurídicos e processuais dos requerentes e para melhorar a qualidade das decisões em primeira instância;
23. Salienta que os procedimentos na fronteira se caracterizam por uma combinação de prazos de tramitação curtos e uma situação de detenção; considera que se afigura necessário estabelecer prazos processuais eficazes para minimizar a privação temporária da liberdade de circulação em caso de detenção de pessoas; recorda que os Estados-Membros podem introduzir prazos mais curtos, mas razoáveis, sem prejuízo da realização de uma análise adequada e completa e do acesso efetivo do requerente aos princípios básicos e às garantias fundamentais consagrados na Diretiva Procedimentos de Asilo; observa que o prazo para a adoção de uma decisão num procedimento de fronteira varia entre dois e 28 dias em função dos Estados-Membros e para a interposição de um recurso varia entre dois a sete dias; salienta que a imposição de prazos curtos pode dificultar uma preparação exaustiva da entrevista ou do recurso e, por conseguinte, a realização de um procedimento justo, em particular se não forem aplicadas de forma efetiva as garantias processuais consagradas na Diretiva Procedimentos de Asilo;
24. Reitera a obrigação que incumbe aos Estados-Membros de facultar aos requerentes acesso a assistência, defesa e informações processuais, tal como previsto na Diretiva Procedimentos de Asilo; salienta a necessidade de os requerentes terem acesso em tempo útil a informações adequadas e compreensíveis sobre os procedimentos na fronteira e os seus direitos e obrigações; salienta que devem ser assegurados serviços presenciais de interpretação em todas as fases do procedimento de fronteira; recorda que as entrevistas pessoais são o corolário da obrigação dos Estados-Membros de conferir aos requerentes a possibilidade efetiva de exporem os fundamentos do seu pedido e os elementos essenciais destinados ao procedimento de análise, devendo ser conduzidas por pessoal com formação adequada; salienta que os requerentes devem dispor de tempo suficiente para preparar a entrevista; observa com preocupação que os Estados‑Membros examinados na avaliação de execução europeia do EPRS não cumprem as suas obrigações ao abrigo da Diretiva Procedimentos de Asilo relacionadas com as garantias processuais no contexto dos procedimentos de fronteira, e salienta que as dificuldades dos requerentes no acesso a garantias processuais podem ter graves repercussões nos seus direitos garantidos pela Carta; insta os Estados-Membros a transporem e a aplicarem integralmente as salvaguardas consagradas na Diretiva Procedimentos de Asilo;
25. Observa que, nos termos da Diretiva Procedimentos de Asilo, cabe aos Estados‑Membros decidir se os recursos têm efeito suspensivo automático; recorda, no entanto, que o TJUE reconheceu que um recurso contra uma decisão de regresso, cuja execução é suscetível de expor o nacional de país terceiro a um grave risco de repulsão, deve ter um efeito suspensivo;
Procedimentos na fronteira e um grande número de chegadas
26. Constata que, nos termos do artigo 43.º, n.º 3, da Diretiva Procedimentos de Asilo, na eventualidade de chegada de um grande número de nacionais de países terceiros ou de apátridas que apresentem pedidos de proteção internacional na fronteira ou em zonas de trânsito, esses procedimentos podem igualmente ser aplicados nos locais em que esses nacionais de países terceiros ou apátridas estiverem alojados, normalmente nas imediações da fronteira ou das zonas de trânsito, pelo tempo da sua estadia nesses locais;
27. Recorda que as salvaguardas previstas no capítulo II da Diretiva Procedimentos de Asilo se aplicam igualmente no caso de um grande número de chegadas; considera essencial dispor de pessoal e recursos suficientes neste domínio; observa com preocupação que, nestes casos, a correta aplicação dos procedimentos de fronteira pode constituir um desafio, comportar riscos de violação dos direitos fundamentais e suscitar preocupações em matéria de eficiência;
28. Partilha das preocupações expressas pela FRA, pelo Alto Comissário das Nações Unidas para os Refugiados e pelo Relator Especial das Nações Unidas para os direitos humanos dos migrantes sobre o respeito pelas garantias processuais e pelos direitos fundamentais nos procedimentos acelerados de fronteira utilizados nos centros de registo gregos; lamenta as graves lacunas em matéria de direitos fundamentais existentes nos centros de registo europeus identificadas pela FRA;
29. Constata que as agências da UE podem prestar apoio aos Estados-Membros em caso de chegada de um grande número de requerentes de asilo aos pontos de passagem fronteiriça, com vista a assegurar um procedimento célere e equitativo a todos os requerentes; observa, em particular, que o EASO pode prestar assistência operacional em várias etapas do processo de asilo e que a Frontex pode prestar assistência nas tarefas de rastreio, identificação e recolha de impressões digitais; observa que, até à data, o EASO apenas prestou assistência na Grécia no âmbito do chamado procedimento acelerado de fronteira em regiões insulares; salienta, além disso, que foram introduzidas melhorias, mas que persistem deficiências graves, nomeadamente uma duração média de vários meses para os procedimentos de fronteira; espera que a prevista Agência da União Europeia para o Asilo venha a contribuir para colmatar estas deficiências;
Aplicação de procedimentosde fronteira
30. Recorda que a aplicação dos procedimentos de fronteira continua a ser deixada ao critério dos Estados-Membros; reafirma que, se os Estados-Membros aplicarem procedimentos de fronteira, devem prever condições que garantam um procedimento justo e adequado e permitam que os requerentes de proteção internacional sejam informados de forma célere e com clareza sobre o resultado dos seus pedidos; observa que, especialmente em casos mais complexos, a eficácia das garantias processuais, como o direito a assistência jurídica, pode ficar comprometida; salienta que a aplicação de procedimentos eficazes deve ser indissociável de garantias processuais; sublinha que, nos casos em que não é possível adotar uma decisão no prazo máximo de quatro semanas, o pedido deve ser tratado em conformidade com as outras disposições da Diretiva Procedimentos de Asilo; solicita aos Estados-Membros que respeitem integralmente, na lei e na prática, as garantias processuais consagradas na Diretiva Procedimentos de Asilo;
31. Insta os Estados-Membros a procederem a um intercâmbio permanente de boas práticas quanto à correta aplicação dos atuais procedimentos na fronteira e a partilhá-las com a Comissão;
32. Apela aos Estados-Membros para que avaliem de forma crítica a questão de saber se a sua atual capacidade operacional é suficiente para garantir o cumprimento das suas obrigações nos procedimentos de fronteira; insta os Estados-Membros a reforçarem a cooperação e a assistência no plano operacional, sempre que necessário;
33. Exorta a Comissão a supervisionar de forma eficaz a aplicação do artigo 43.º e das disposições conexas da Diretiva Procedimentos de Asilo e a tomar medidas em caso de incumprimento, nomeadamente mediante a abertura de procedimentos de infração sempre que tal se justifique;
o o o
34. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho e à Comissão.