Decisão do Parlamento Europeu, de 9 de março de 2021, sobre o pedido de levantamento da imunidade de Clara Ponsatí Obiols (2020/2031(IMM))
O Parlamento Europeu,
– Tendo recebido um pedido de levantamento da imunidade, transmitido em 10 de fevereiro de 2020 pelo Presidente do Supremo Tribunal espanhol, e apresentado em 4 de fevereiro de 2020 pelo Presidente da Segunda Secção do Supremo Tribunal espanhol, no âmbito do processo especial n.º 3/20907/2017; tendo em conta que o referido pedido de levantamento da imunidade foi comunicado em sessão plenária em 13 de fevereiro de 2020,
– Tendo ouvido Clara Ponsatí Obiols, nos termos do artigo 9.º, n.º 6, do seu Regimento,
– Tendo em conta os artigos 8.º e 9.º do Protocolo n.º 7 relativo aos Privilégios e Imunidades da União Europeia, bem como o artigo 6.º, n.º 2, do Ato relativo à Eleição dos Deputados ao Parlamento Europeu por Sufrágio Universal Direto, de 20 de setembro de 1976,
– Tendo em conta os acórdãos proferidos pelo Tribunal de Justiça da União Europeia em 21 de outubro de 2008, 19 de março de 2010, 6 de setembro de 2011, 17 de janeiro de 2013 e 19 de dezembro de 2019(1),
– Tendo em conta a decisão da Junta Electoral Central espanhola (Comissão Eleitoral Central), de 23 de janeiro de 2020(2),
– Tendo em conta a Decisão (UE) 2018/937 do Conselho Europeu, de 28 de junho de 2018, que fixa a composição do Parlamento Europeu(3), e a Decisão (UE) 2019/1810 do Conselho Europeu tomada com o acordo do Reino Unido, de 29 de outubro de 2019, que prorroga o prazo previsto no artigo 50.º, n.º 3, do TUE(4),
– Tendo em conta o anúncio feito na sessão plenária de 10 de fevereiro de 2020 de que, nos termos da Decisão do Conselho Europeu de 28 de junho de 2018 e na sequência da saída do Reino Unido da União Europeia em 31 de janeiro de 2020, o Parlamento registou a eleição de Clara Ponsatí Obiols enquanto deputada ao Parlamento Europeu, com efeitos a partir de 1 de fevereiro de 2020,
– Tendo em conta o artigo 71.º, n.ºs 1 e 2, da Constituição Espanhola,
– Tendo em conta o artigo 5.º, n.º 2, o artigo 6.º, n.º 1, e o artigo 9.º do seu Regimento,
– Tendo em conta o relatório da Comissão dos Assuntos Jurídicos (A9‑0022/2021),
A. Considerando que o Presidente da Segunda Secção do Supremo Tribunal espanhol solicitou o levantamento da imunidade de Clara Ponsatí Obiols, deputada ao Parlamento Europeu, no que respeita ao artigo 9.º, primeiro parágrafo, alínea b), do Protocolo n.º 7 relativo aos Privilégios e Imunidades da União Europeia no âmbito do processo especial n.º 3/20907/2017 – processo penal relativo a um alegado crime de sedição, previsto nos artigos 544.º e 545.º do Código Penal espanhol;
B. Considerando que os factos subjacentes à ação penal foram alegadamente cometidos em 2017; considerando que o despacho de acusação neste caso foi proferido em 21 de março de 2018 e confirmado por despachos subsequentes de indeferimento de recursos; considerando que o inquérito foi encerrado por despacho de 9 de julho de 2018 e confirmado como definitivo em 25 de outubro de 2018; considerando que, por despacho de 9 de julho de 2018, Clara Ponsatí Obiols, entre outros, foi declarada em situação de desobediência ao tribunal e que foi tomada uma decisão de suspender a instância em relação a esta e a outras pessoas até que fossem encontrados;
C. Considerando que Clara Ponsatí Obiols foi declarada eleita por decisão da Junta Electoral Central (Comissão Eleitoral Central) espanhola, em 23 de janeiro de 2020; considerando que, na sequência da saída do Reino Unido da União Europeia em 31 de janeiro de 2020, o Parlamento registou a eleição de Clara Ponsatí Obiols enquanto deputada ao Parlamento Europeu, com efeitos a partir de 1 de fevereiro de 2020;
D. Considerando que o estatuto de deputada ao Parlamento Europeu foi confirmado em 23 de janeiro de 2020; considerando que, por conseguinte, o pedido de levantamento da imunidade diz respeito a factos e ações penais que são anteriores à obtenção do estatuto e, consequentemente, da imunidade enquanto deputada ao Parlamento Europeu;
E. Considerando que a Comissão dos Assuntos Jurídicos tomou conhecimento dos documentos apresentados aos membros da comissão por Clara Ponsatí Obiols, nos termos do artigo 9.º, n.º 6, do Regimento, e por ela considerados relevantes para o processo;
F. Considerando que as autoridades dos Estados‑Membros decidem da oportunidade dos processos judiciais;
G. Considerando que não compete ao Parlamento Europeu questionar os méritos dos sistemas jurídicos e judiciários nacionais;
H. Considerando que o Parlamento Europeu não tem competência para apreciar ou questionar a jurisdição das autoridades judiciais nacionais responsáveis pelos processos penais em causa;
I. Considerando que, de acordo com a legislação espanhola, tal como interpretada pelos tribunais nacionais e comunicada ao Parlamento pelo Estado‑Membro, a Segunda Secção Criminal do Supremo Tribunal espanhol é a autoridade competente para solicitar o levantamento da imunidade de um deputado ao Parlamento Europeu;
J. Considerando que o referido processo não diz respeito a opiniões ou votos emitidos no exercício das funções da deputada ao Parlamento Europeu para efeitos do artigo 8.º do Protocolo n.º 7 relativo aos Privilégios e Imunidades da União Europeia;
K. Considerando que o artigo 9.º, primeiro parágrafo, alínea a), do Protocolo n.º 7 relativo aos Privilégios e Imunidades da União Europeia estabelece que os deputados ao Parlamento Europeu gozam, no seu território nacional, das imunidades reconhecidas aos deputados ao Parlamento do seu país;
L. Considerando que o artigo 71.º, n.ºs 1 e 2, da Constituição espanhola prevê que:
«1. Os Deputados e Senadores gozam de um privilégio absoluto em relação às opiniões expressas no exercício das suas funções.
2. Durante o respetivo mandato, os deputados e os senadores gozam igualmente de imunidade e só podem ser detidos em caso de flagrante delito. Não podem ser acusados nem processados sem a prévia autorização da Câmara a que pertencem.»
M. Considerando que o pedido de levantamento da imunidade informa – no que diz respeito à aplicação do artigo 71.º da Constituição espanhola e, mais especificamente, à fase do processo a partir da qual não é necessário solicitar autorização parlamentar para instaurar um processo penal contra um arguido que obtém o estatuto de deputado – que um pedido de levantamento não é necessário nos casos em que o estatuto de deputado é obtido enquanto estiver pendente um processo instaurado anteriormente ou nos casos em que um deputado ao Parlamento tome posse após ter sido formalmente constituído arguido; considerando que, por conseguinte, não é necessário solicitar um levantamento da imunidade nos termos do artigo 9.º, primeiro parágrafo, alínea a), do Protocolo n.º 7 relativo aos Privilégios e Imunidades da União Europeia para que possam ser tomadas medidas no território de Espanha;
N. Considerando que não compete ao Parlamento Europeu interpretar as normas nacionais relativas aos privilégios e imunidades dos deputados do Parlamento;
O. Considerando que o artigo 9.º, primeiro parágrafo, alínea b), do Protocolo n.º 7 relativo aos Privilégios e Imunidades da União Europeia prevê que os deputados ao Parlamento Europeu gozam, no território de qualquer outro Estado‑Membro, da não sujeição a qualquer medida de detenção e a qualquer procedimento judicial;
P. Considerando que, em 4 de novembro de 2019, a Segunda Secção do Supremo Tribunal espanhol ordenou que fosse emitido, «com vista à instauração de um processo penal [...] conforme o caso: um mandado de detenção nacional, um mandado de detenção europeu ou um mandado de detenção internacional para efeitos de extradição» relativo a, entre outros, Clara Ponsatí Obiols, a qual foi declarada em situação de desobediência ao tribunal; considerando que, tal como explicado no pedido de levantamento da imunidade, em 3 de fevereiro de 2020, foi confirmada a decisão relativa à emissão do mandado nacional de busca, detenção e prisão, bem como do mandado de detenção europeu e do mandado de busca e detenção internacional contra Clara Ponsatí Obiols para efeitos da sua extradição, e que, ao mesmo tempo, foi apresentado um pedido de levantamento da sua imunidade a fim de prosseguir com a execução do mandado de detenção europeu emitido;
Q. Considerando que, nos termos do artigo 9.º, n.º 8, do Regimento, a Comissão dos Assuntos Jurídicos não pode, em caso algum, pronunciar‑se sobre a culpabilidade ou não culpabilidade do deputado, nem sobre se se justifica ou não processar penalmente o deputado pelas opiniões ou atos que lhe são imputados, mesmo que a apreciação do pedido proporcione à Comissão um conhecimento aprofundado do assunto;
R. Considerando que, nos termos do artigo 5.º, n.º 2, do Regimento, a imunidade parlamentar não é um privilégio pessoal dos deputados, mas sim uma garantia da independência do Parlamento como um todo e dos seus membros;
S. Considerando que o objetivo da imunidade parlamentar é proteger o Parlamento e os seus deputados contra processos judiciais que visem atividades realizadas no exercício das funções parlamentares e que sejam indissociáveis dessas funções;
T. Considerando que é manifesto que a acusação não tem qualquer relação com a posição de Clara Ponsatí Obiols enquanto deputada ao Parlamento Europeu, mas sim com a sua antiga função de Ministra Regional da Educação do Govern (Governo Regional da Catalunha);
U. Considerando que Clara Ponsatí Obiols pertence a um grupo de pessoas que se encontram numa situação semelhante, ou seja, são objeto de ação penal e acusados dos crimes em causa, com a única diferença de que Clara Ponsatí Obiols goza atualmente de imunidade enquanto deputada ao Parlamento Europeu; considerando que, por conseguinte, há que ter em conta que Clara Ponsatí Obiols não é a única pessoa acusada no caso em apreço;
V. Considerando que os factos imputados foram cometidos em 2017 e que o processo penal em questão tenha sido instaurado contra Clara Ponsatí Obiols em 2018; considerando que, nesta base, não se pode alegar que o processo judicial foi instaurado com a intenção de impedir a futura atividade política de Clara Ponsatí Obiols enquanto deputada ao Parlamento Europeu, quando, nessa altura, o seu estatuto de deputada ao Parlamento Europeu ainda era hipotético e futuro;
W. Considerando que, no caso em apreço, o Parlamento não conseguiu demonstrar a existência de fumus persecutionis, ou seja, elementos factuais que indiquem que a intenção subjacente ao processo judicial em causa possa ser a de prejudicar a atividade política de um deputado e, assim, o Parlamento Europeu;
1. Decide levantar a imunidade de Clara Ponsatí Obiols, nos termos do artigo 9.º, primeiro parágrafo, alínea b), do Protocolo n.º 7 relativo aos Privilégios e Imunidades da União Europeia;
2. Encarrega o seu Presidente de transmitir de imediato a presente decisão, bem como o relatório da sua comissão responsável, às autoridades espanholas e a Clara Ponsatí Obiols.
Acórdão do Tribunal de Justiça de 21 de outubro de 2008, Marra/De Gregorio e Clemente, C‑200/07 e C‑201/07, ECLI:EU:C:2008:579; acórdão do Tribunal Geral de 19 de março de 2010, Gollnisch/Parlamento Europeu, T‑42/06, ECLI:EU:T:2010:102; acórdão do Tribunal de Justiça de 6 de setembro de 2011, Patriciello, C‑163/10, ECLI: EU:C:2011:543; acórdão do Tribunal Geral de 17 de janeiro de 2013, Gollnisch/Parlamento Europeu, T‑346/11 e T‑347/11, ECLI:EU:T:2013:23; acórdão do Tribunal de Justiça de 19 de dezembro de 2019, Junqueras Vies, C‑502/19, ECLI:EU:C:2019:1115.