Resolução do Parlamento Europeu, de 18 de maio de 2021, sobre garantir os objetivos da obrigação de desembarcar, nos termos do artigo 15.º da Política Comum das Pescas (2019/2177(INI))
O Parlamento Europeu,
– Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 7 de junho de 2019, relativa à situação da política comum das pescas e à consulta sobre as possibilidades de pesca para 2020 (COM(2019)0274),
– Tendo em conta a Comunicação da Comissão, de 16 de junho de 2020, intitulada «Para uma pesca mais sustentável na UE: ponto da situação e orientações para 2021» (COM(2020)0248),
– Tendo em conta o Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia, nomeadamente o artigo 43.º, n.º 2,
– Tendo em conta o Regulamento (UE) n.º 1380/2013 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 11 de dezembro de 2013, relativo à política comum das pescas(1),
– Tendo em conta o Regulamento (UE) 2019/1241 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 20 de junho de 2019, relativo à conservação dos recursos haliêuticos e à proteção dos ecossistemas marinhos através de medidas técnicas(2),
– Tendo em conta os relatórios da Agência Europeia de Controlo das Pescas (AECP) que avaliam o cumprimento da obrigação de desembarcar no mar do Norte (2016-2017), nas águas ocidentais norte (2016-2017) e para a sarda no mar do Norte e nas águas ocidentais norte (2015-2017),
– Tendo em conta os relatórios de plenário do Comité Científico, Técnico e Económico das Pescas (CCTEP) (PLEN 20-01, 19-01, 18-01 e 17-01), e os seus relatórios «Avaliação dos relatórios anuais dos Estados-Membros sobre a obrigação de desembarque (relativos a 2019)» (Adhoc-20-02), «Acompanhamento do desempenho da política comum das pescas» (Adhoc-20-01) e «Avaliação das recomendações comuns relativas à obrigação de desembarque e ao Regulamento Medidas Técnicas» (CCTEP‑20-04),
– Tendo em conta a Diretiva (UE) 2017/159 do Conselho, de 19 de dezembro de 2016, que aplica o Acordo relativo à aplicação da Convenção sobre o Trabalho no Setor das Pescas, de 2007, da Organização Internacional do Trabalho(3),
– Tendo em conta o artigo intitulado «The unintended impact of the European discard ban» [O impacto imprevisto da proibição europeia de devoluções], publicado no ICES Journal of Marine Science(4),
– Tendo em conta o estudo intitulado «Implementation of the EU fisheries control system by Member States (2014-19)» [Aplicação do sistema de controlo das pescas da UE pelos Estados-Membros (2014-2019)], solicitado pela Comissão das Pescas,
– Tendo em conta os estudos solicitados pela Comissão das Pescas sobre a obrigação de desembarque e as espécies bloqueadoras nas pescarias multiespécies e mistas no mar do Norte(5), nas águas do Noroeste(6) e nas águas do Sudoeste(7), bem como os estudos sobre a proibição das devoluções, a obrigação de desembarque e o rendimento máximo sustentável (RMS) no Mediterrâneo Ocidental(8)(9),
– Tendo em conta a obra intitulada «The European Landing Obligation, Reducing discards in complex, multi-species and multi-jurisdictional fisheries»(10) [A obrigação de desembarque europeia e a redução das devoluções em pescarias complexas, multiespécies e plurijurisdicionais], publicada em 2019,
– Tendo em conta o relatório intitulado «A third assessment of global marine fisheries discards» [Uma terceira avaliação das devoluções da pesca marítima mundial], publicado pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) em 2019,
– Tendo em conta o artigo 54.º do seu Regimento,
– Tendo em conta o relatório da Comissão das Pescas (A9-0147/2021),
A. Considerando que a meta 14.4 do Objetivo 14 da Agenda 2030 das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável insta a comunidade internacional a regular eficazmente a captura, a pôr termo à sobrepesca, à pesca ilegal, não declarada e não regulamentada (pesca INN) e às práticas de pesca destrutivas e a aplicar planos de gestão baseados em dados científicos, até 2020, a fim de restabelecer as unidades populacionais, o mais rapidamente possível, por forma a atingir, no mínimo, níveis que permitam produzir o MSY determinado pelas suas características biológicas;
B. Considerando que o volume das devoluções anuais na pesca marítima mundial é estimado em 9,1 milhões de toneladas, que representam 10,8 % da captura média anual no período de 2010 a 2014; considerando que a pesca dirigida às espécies de atum e outras espécies pelágicas registou as taxas de devolução mais baixas e que a pesca dirigida aos crustáceos registou as taxas mais elevadas; qconsiderando ue a pesca dirigida às espécies de peixes demersais produziu os maiores volumes de devoluções e que a pesca dirigida aos moluscos (excluindo os cefalópodes) produziu os volumes mais baixos; considerando que as devoluções anuais a nível mundial atingiram um máximo de cerca de 18,8 milhões de toneladas em 1989 e diminuíram gradualmente para menos de 10 milhões de toneladas em 2014(11);
C. Considerando que as devoluções são uma prática pesqueira comum de devolver ao mar as capturas indesejadas, mortas ou vivas, seja por os exemplares estarem danificados ou terem um tamanho inferior ao tamanho mínimo de referência (restrições de tamanho mínimo), seja por razões de viabilidade comercial, ausência de quotas ou regras sobre a composição das capturas; considerando que, antes da introdução da obrigação de desembarque, não era permitido ter a bordo ou desembarcar peixes de tamanho inferior ao tamanho mínimo de referência;
D. Considerando que as capturas indesejadas e as devoluções constituem um desperdício considerável de recursos naturais para consumo humano e podem repercutir-se negativamente na exploração sustentável dos recursos biológicos marinhos e nos ecossistemas marinhos, bem como na viabilidade financeira das pescarias; considerando que um certo nível de capturas acessórias indesejadas e de devoluções é inevitável, sobretudo nas pescarias mistas;
E. Considerando que os níveis historicamente elevados de devoluções em algumas pescarias da UE representam um grave problema para a sustentabilidade a longo prazo das pescas da UE, pondo em causa a credibilidade da política das pescas da União;
F. Considerando que a proibição da prática da sobrepesca de seleção (devolução de peixes comercializáveis), introduzida na UE em 2010, tem sido mal aplicada;
G. Considerando que a política comum das pescas (PCP), reformada em 2013, deverá permitir minimizar os impactos negativos das atividades de pesca no ecossistema marinho e introduziu os seguintes objetivos: (a) «eliminar gradualmente as devoluções tendo em conta as circunstâncias de cada caso e os melhores pareceres científicos disponíveis, evitando e reduzindo tanto quanto possível as capturas indesejadas e assegurando gradualmente que as capturas de espécies comerciais regulamentadas sejam desembarcadas», e (b) «se necessário, tirar o máximo partido das capturas indesejadas, sem criar um mercado para as capturas cujo tamanho se encontra abaixo dos tamanhos mínimos de referência para efeitos de conservação»;
H. Considerando que não existem dados fiáveis sobre as devoluções nem elementos científicos que sugiram que a aplicação da obrigação de desembarque tenha conduzido a uma redução drástica das capturas indesejadas; considerando que a sua aplicação deficiente pode ter conduzido a uma perda de visibilidade das capturas em algumas pescarias e a uma degradação dos pareceres científicos e da qualidade dos dados;
I. Considerando que o setor das pescas realizou progressos no sentido da consecução do objetivo de RMS; considerando que, em 2020, 99 % dos desembarques no mar Báltico, no mar do Norte e no Atlântico, geridos exclusivamente pela UE e para os quais estão disponíveis as respetivas avaliações científicas, eram provenientes de uma pesca gerida de forma sustentável; considerando que no Atlântico Nordeste, a biomassa das unidades populacionais totalmente avaliadas, em 2018, era 48 % mais elevada do que em 2003; considerando que subsistem importantes desafios, especialmente no mar Mediterrâneo e no mar Negro, onde cerca de 75 % das unidades populacionais que são avaliadas cientificamente são sobre‑exploradas;
J. Considerando que a obrigação de desembarque, introduzida gradualmente ao longo de quatro anos (2015-2019), torna obrigatório desembarcar e deduzir das quotas aplicáveis todas as capturas de espécies sujeitas a limites de captura e, no mar Mediterrâneo, as capturas de espécies sujeitas a tamanhos mínimos nas águas da UE ou, em determinados casos, efetuadas por navios da UE em águas internacionais, e proíbe a utilização de peixes de tamanho inferior ao tamanho mínimo de referência para fins de consumo humano direto;
K. Considerando que, segundo o CCTEP(12), não foi fornecida qualquer informação sobre a aplicação da obrigação de desembarque para as frotas de longa distância que operam fora das águas da União; considerando que o Conselho Consultivo para a Frota de Longa Distância (LDAC) salientou que a obrigação de desembarque não se aplica, na prática, aos navios da UE que pescam fora das águas da União;
L. Considerando que o pescado desembarcado com tamanho inferior ao tamanho mínimo de referência de conservação continua a ser utilizado para a produção de farinha de peixe, de alimentos para animais de estimação ou como isco para a pesca com nassas, com baixos rendimentos económicos; considerando que estas utilizações alternativas são economicamente viáveis quando existe uma unidade de produção próxima do porto de desembarque, mas que a viabilidade diminui (ou desaparece) quando é necessário dispor de logística e de infraestrutura para o transporte de longa distância ou investir em novas instalações de produção(13);
M. Considerando que vários Estados-Membros propõem que a legislação seja alterada para permitir que o pescado com tamanho inferior ao tamanho mínimo de referência de conservação pertinente, sujeito a uma obrigação de desembarque, seja utilizado para fins de beneficência;
N. Considerando que a obrigação de desembarque não é uma proibição total das devoluções, uma vez que apenas se aplica às espécies regulamentadas (totais admissíveis de capturas (TAC) e pescarias para as quais o esforço de pesca está regulamentado e foi definido um tamanho mínimo) e inclui isenções para o peixe com danos causados por predadores e para as capturas que demonstrem uma elevada capacidade de sobrevivência e uma isenção de minimis de até 5 % nos casos em que seja difícil aumentar a seletividade ou em que a manipulação das capturas indesejadas implique custos desproporcionados; considerando que a aplicação da obrigação de desembarque depende da utilização extensiva de isenções temporárias que requerem uma revisão baseada na avaliação científica, o que exige tempo e esforço por parte dos decisores e do setor da pesca;
O. Considerando que os níveis de devoluções variam substancialmente de acordo com as regiões e as espécies, visto que as devoluções são mínimas ou nulas nas pescarias em que todas ou a maior parte das capturas têm valor comercial e são exploradas, como ocorre nas pescarias de pequena escala ou tradicionais ou nos produtos da pesca destinados ao consumo humano direto;
P. Considerando que a pequena pesca emprega mais operadores e utiliza artes mais seletivas, causando menos danos ao ambiente e desempenhando um papel social e económico fundamental, tal como salientado no relatório da Comissão Geral das Pescas do Mediterrâneo (CGPM) sobre o estado da pesca no mar Mediterrâneo e no mar Negro, de 2018;
Q. Considerando que as devoluções da pesca contribuem para a alimentação de uma série de espécies necrófagas, desde as comunidades aviárias às mesopelágicas e bentónicas, as quais são importantes para a cadeia trófica; considerando que a literatura científica conclui que a redução das devoluções através da obrigação de desembarque pode afetar as populações de algumas espécies em determinadas zonas, mas que, de um modo geral, tal é pouco provável;
R. Considerando que as «espécies bloqueadoras» são espécies ou unidades populacionais de peixes para as quais um determinado Estado-Membro, frota ou navio tem menos possibilidades de pesca (quota) em comparação com outras espécies; considerando que o cumprimento total e estrito da obrigação de desembarque, especialmente nas pescarias mistas, implicaria o encerramento da pescaria correspondente («bloqueio»), uma vez esgotada a quota (limitada) de uma espécie para evitar mais capturas da mesma; considerando que as potenciais situações de bloqueio nas pescarias mistas continuam a ser um problema grave, que poderá ter contribuído para a baixa taxa de aplicação da obrigação de desembarque e restringido as trocas de quotas entre os Estados-Membros, incentivando, por sua vez, a subutilização das possibilidades de pesca;
S. Considerando que a seletividade não resolverá totalmente os problemas nestas pescarias e que poderá ser difícil, do ponto de vista técnico, reduzir as capturas das unidades populacionais de espécies bloqueadoras pertinentes sem causar perdas importantes de outras capturas comercializáveis, o que criará graves dificuldades económicas para as frotas afetadas; considerando que, a fim de evitar as situações que envolvem espécies bloqueadoras, foram adotadas recentemente quotas comuns para as capturas acessórias, cuja eficácia ainda não foi avaliada;
T. Considerando que a quantidade de peixe indesejado capturado na rede e recolhido a bordo pode ser significativamente reduzida, em primeiro lugar através de medidas sazonais e temporárias para evitar capturas e de seletividade técnica, reduzindo assim o tempo de manipulação, o consumo de combustível e as necessidades de armazenamento;
U. Considerando que o CCTEP salienta que as recomendações conjuntas dos grupos regionais dos Estados-Membros para a aplicação da obrigação de desembarque em 2021 contêm relativamente poucas medidas destinadas a aumentar a seletividade; considerando que o número de projetos-piloto para testar artes mais seletivas ou estratégias para evitar capturas, de acordo com o artigo 14.º da PCP, tem vindo a diminuir;
V. Considerando que o Conselho retirou várias espécies da lista dos TAC nos últimos anos, as quais deixaram, assim, de estar também sujeitas à obrigação de desembarque;
W. Considerando que a obrigação de desembarque é um instrumento para alcançar o objetivo de seletividade da PCP e não um objetivo em si mesmo;
X. Considerando que foram recentemente adotadas reservas comuns de quotas para as capturas acessórias, a fim de combater as situações que envolvem espécies bloqueadoras;
Y. Considerando que a devolução de capturas indesejadas é um fenómeno que existe em todas as pescarias do mundo e não um problema exclusivo da Europa; considerando que as águas da UE se caracterizam por uma abundância de pescarias mistas; considerando que vários países terceiros e territórios autónomos adotaram diferentes proibições das devoluções, incluindo o Canadá, as Ilhas Faroé, a Noruega, a Islândia, o Chile e a Nova Zelândia; considerando que outros países terceiros, como os Estados Unidos da América, não proibiram as devoluções, já que a sua legislação em matéria de pescas utiliza outras abordagens para reduzir as capturas indesejadas; considerando que a proibição das devoluções na Noruega e na Islândia foi alterada ao longo de 30 anos para dar resposta a problemas específicos; considerando que o impacto da proibição das devoluções no Chile ainda não é totalmente conhecido, pois está a começar a ser aplicada; considerando que as devoluções continuam a ser um grande problema na gestão de pescas da Nova Zelândia;
Z. Considerando que o princípio da estabilidade relativa, estabelecido pela primeira vez no regulamento de base da PCP de 1983 e posto em prática pelo Regulamento sobre TAC e quotas do mesmo ano, define uma chave para a distribuição dos TAC por Estado‑Membro com base nos princípios de atribuição das capturas históricas (1973‑1978), na dependência incluída nas preferências da Haia de 1976 e nas perdas jurisdicionais (1973-1976);
AA. Considerando que foram publicados perto de 4 000 documentos científicos sobre as devoluções, dos quais mais de 3 700 estão relacionados com a pesca industrial e menos de 200 dizem respeito à pesca costeira de pequena escala;
AB. Considerando que, desde cerca de 1950, muitas espécies marinhas de vários grupos sofreram mudanças na sua área de distribuição geográfica e nas suas atividades sazonais em consequência do aquecimento dos oceanos e das alterações biogeoquímicas, como a perda de oxigénio, que afetam os seus habitats, o que deu origem a mudanças na composição das espécies, na abundância e na produção de biomassa dos ecossistemas, desde o equador aos polos; considerando que a alteração na distribuição dos recursos haliêuticos tem impacto na futura gestão das pescas e, consequentemente, também na aplicação da obrigação de desembarque;
AC. Considerando que a Comissão realizou uma avaliação de impacto socioeconómico das políticas de redução das devoluções antes da apresentação da sua proposta para um novo regulamento de base da PCP, em julho de 2011, mas, até à data, não analisou exaustivamente o seu impacto socioeconómico e os seus efeitos na segurança a bordo, nem deu resposta às preocupações suscitadas pelos Conselhos Consultivos e pelos Estados-Membros no que respeita à aplicação;
AD. Considerando que ainda se desconhece em que medida as devoluções foram reduzidas; considerando que um total de cinco Estados-Membros não responderam ao questionário da Comissão sobre a aplicação da obrigação de desembarque em 2019 e que dois destes Estados não o fizeram nos últimos três anos;
AE. Considerando que as diferenças no controlo e na aplicação da obrigação de desembarque podem dar origem a condições de concorrência desiguais dentro dos Estados-Membros e entre estes; considerando que, nos seus relatórios de avaliação do cumprimento da obrigação de desembarque, a AECP constatou uma aplicação insuficiente por parte dos Estados-Membros e formulou recomendações para melhorar o controlo;
AF. Considerando que a Comissão deve apresentar um relatório ao Parlamento Europeu e ao Conselho sobre a aplicação da PCP, incluindo a obrigação de desembarque, antes de 31 de dezembro de 2022;
1. Afirma o objetivo geral da UE de assegurar a exploração sustentável dos recursos haliêuticos e a proteção dos ecossistemas marinhos; salienta que a redução das devoluções e a minimização das capturas indesejadas são uma prioridade da política pública que nasceu da resposta às preocupações em matéria de responsabilização, conservação e desperdício dos recursos naturais, bem como da necessidade científica de ter plenamente em conta todas as fontes de mortalidade por pesca;
2. Lamenta que os relatórios anuais da Comissão sobre a situação da PCP contenham muito pouca informação sobre a aplicação da obrigação de desembarque e não tenham, até à data, fornecido dados que reflitam o nível de redução das devoluções ao abrigo da obrigação, nem uma análise do impacto socioeconómico da obrigação de desembarque ou dos efeitos da sua aplicação na segurança a bordo dos navios de pesca;
3. Reconhece que a introdução da obrigação de desembarque representa uma mudança de paradigma e um dos maiores desafios na história da gestão das pescas da UE (passando do registo dos desembarques, impondo, por vezes, a obrigação de devolução, para um sistema que regista a totalidade das capturas) que, juntamente com a introdução da política de RMS, teve inevitavelmente uma série de consequências ecológicas e económicas profundas a curto e a longo prazo; salienta a necessidade de avaliar o impacto socioeconómico da obrigação de desembarque;
4. Observa que a política de RMS não implica que não haja devoluções e que as devoluções não significam que não seja possível alcançar o RMS, tal como se verifica no caso de muitas unidades populacionais, incluindo as espécies de captura acessória;
5. Destaca os progressos realizados em termos de cooperação entre as partes interessadas e as medidas tomadas para aumentar a seletividade; observa, no entanto, que, segundo a Comissão e o CCTEP, a obrigação de desembarque continua a ser pouco aplicada e que o número de devoluções continua comparável ao dos anos anteriores à introdução desta obrigação;
6. Reconhece que, desde 2010, existe a obrigação de registar as devoluções no diário de bordo, em conformidade com o Regulamento Controlo das Pescas; lamenta que, apesar da introdução da obrigação de desembarque, os dados e os conhecimentos fiáveis sobre o volume das devoluções continuem a ser limitados, o número de TAC de precaução tenha aumentado, em contraste com a redução das quantidades dos TAC analíticos, e que a disponibilidade de informações científicas sobre o estado das unidades populacionais não tenha melhorado substancialmente;
7. Observa que a obrigação de desembarque continua a suscitar preocupações tanto no setor das pescas como na comunidade científica, devido a obstáculos de natureza diversa; assinala que as preocupações do setor das pescas dizem respeito à falta de infraestruturas adequadas nos portos, ao aumento dos custos de exploração, à falta de incentivos ao cumprimento por parte das autoridades e às dificuldades em alcançar uma maior seletividade em determinadas pescarias sem comprometer a rentabilidade da atividade pesqueira, sobretudo nas pescarias mistas que correm um elevado risco de exposição a situações de bloqueio da pesca, as quais conduzem a uma subutilização das quotas disponíveis e ao encerramento antecipado das pescarias, criando graves dificuldades económicas para as frotas em causa; verifica que, até à data, apenas foram comunicados dois casos: linguado (Bélgica) e atum-patudo (França);
8. Lamenta que as dificuldades encontradas na aplicação da proibição das devoluções tenham transmitido uma imagem negativa dos pescadores e dos esforços envidados pelo setor das pescas, apesar dos progressos realizados na consecução do objetivo de RMS;
9. Toma nota das medidas tomadas até à data (trocas de quotas e quotas comuns para as capturas acessórias), apesar de, na sua maioria, não terem um caráter permanente e estarem sujeitas a negociações entre os Estados-Membros e de a sua eficiência ainda não ter sido avaliada de forma aprofundada; sublinha a necessidade de eliminar os obstáculos administrativos à aplicação efetiva da obrigação de desembarque, de fomentar o desenvolvimento e a aceitação de novas artes seletivas e de continuar a desenvolver planos eficazes de redução das capturas acessórias, a fim de reconstituir as unidades populacionais vulneráveis;
10. Salienta o potencial e a necessidade do uso das exceções (elevadas taxas de sobrevivência e isenção de minimis) previstas no regulamento para facilitar a sua aplicação e combater a possível ocorrência de situações que envolvem espécies bloqueadoras; recorda a necessidade de apresentar dados fiáveis e exatos e recomenda a simplificação do processo de concessão de isenções, incluindo uma melhor recolha de dados;
11. Salienta que o CCTEP reconheceu uma melhoria geral da qualidade das declarações em apoio das isenções desde que as primeiras recomendações conjuntas foram apresentadas em 2014; reconhece que o fornecimento de dados e informações em apoio das isenções pode ser difícil devido à natureza dos dados necessários; observa com preocupação, no entanto, que o CCTEP salientou o facto de haver muitos casos em que as informações e os dados fornecidos não são específicos da espécie e/ou da pescaria e em que os mesmos estudos e pressupostos são utilizados para apoiar múltiplas isenções; sublinha que, na ausência de dados e informações específicos da espécie e da pescaria, se torna difícil avaliar o impacto provável da isenção proposta ou se a mesma cumpre as condições para uma isenção de minimis ou uma isenção baseada na elevada capacidade de sobrevivência;
12. Manifesta a sua preocupação pelo facto de a redução progressiva de algumas flexibilidades, como a isenção de minimis, poder causar ou agravar o efeito de bloqueio e o encerramento de pescarias; insiste na necessidade de continuar a desenvolver planos eficazes de redução das capturas acessórias em pescarias com seletividade limitada, como o arrasto pelágico;
13. Recorda que a obrigação de desembarque não constitui um objetivo em si mesmo, mas sim um instrumento para melhorar a pesca e o comportamento operacional, incentivar o desenvolvimento e a utilização de artes mais seletivas para minimizar as capturas indesejadas, e melhorar a documentação das capturas com vista a uma melhor compreensão e avaliação científica das unidades populacionais de peixes; observa que muitos pescadores não concordam com a ligação entre os objetivos da obrigação de desembarque e a respetiva aplicação, o que tende a dificultar o cumprimento; reconhece que a prossecução deste objetivo final exige tempo e conhecimentos suficientes e que, simultaneamente, são necessários mais esforços para promover um entendimento comum deste objetivo e para pôr em prática os resultados dos estudos realizados pelos cientistas e pescadores com vista a melhorar a seletividade e reduzir as capturas indesejadas; insta a Comissão a continuar a apoiar planos destinados a melhorar a seletividade, incluindo, quando apropriado, a utilização de incentivos para a adoção de artes de pesca mais seletivas;
14. Salienta as especificidades das regiões ultraperiféricas, nomeadamente no que respeita aos navios, às frotas de pesca envelhecidas, aos portos cuja capacidade de armazenamento e transformação é reduzida, o que pode tornar impraticável a obrigação de desembarque;
15. Observa que os níveis das devoluções variam fortemente consoante as pescarias e as bacias marítimas, levando à perceção de que a abordagem «uma regra para todos» pode não ser a estratégia ideal para incentivar os pescadores a tornarem-se mais seletivos; insta a Comissão a identificar as principais deficiências e a propor soluções adaptadas e por medida para as pescarias específicas para cada bacia marítima, prestando especial atenção à pesca artesanal de pequena escala, nomeadamente nas regiões ultraperiféricas;
16. Recorda que o atual quadro jurídico constitui a base jurídica para os Estados-Membros colaborarem ativamente numa definição mais flexível das regras da pesca seletiva e utilizarem instrumentos de mitigação cientificamente demonstrados; insta os Estados‑Membros a reforçarem a sua cooperação através de uma abordagem regional, que inclua a participação das partes interessadas e dos Conselhos Consultivos pertinentes, e a utilizarem plenamente as subvenções disponíveis para o efeito; reitera a necessidade de assegurar condições de concorrência equitativas no cumprimento da obrigação de desembarque;
17. Congratula-se com os resultados de estudos científicos recentes (por exemplo, DescardLess, MINOUW e LIFE iSEAS) sobre a seletividade das artes de pesca inovadoras, estratégias de evasão e modificações dos navios para gerir as capturas indesejadas a bordo; considera necessário prosseguir os esforços de investigação para melhorar a seletividade das artes de pesca, as estratégias de evasão e a manipulação das capturas indesejadas; congratula-se com a proposta «Missão Starfish 2030: recuperar o nosso oceano e as nossas águas» e considera que uma missão no domínio da saúde dos oceanos, dos mares e das águas costeiras e interiores ajudará a desenvolver soluções que são urgentemente necessárias e que têm um impacto direto no setor das pescas e na utilização e gestão sustentáveis dos recursos dos oceanos;
18. Realça que os sistemas de gestão das pescas eficientes, incluindo a possibilidade de utilizar todos os elementos para aplicar corretamente a obrigação de desembarque e alcançar os objetivos da PCP, se devem apoiar em documentação de captura e dados científicos exatos e fiáveis; insta a Comissão e os Estados-Membros a intensificarem os esforços com vista à implementação plena da legislação aplicável da UE, se necessário, e a adotarem novas medidas para assegurar a plena documentação e a recolha de dados, proporcionalmente à sua capacidade de pesca no caso da frota costeira artesanal;
19. Manifesta a sua preocupação com a falta de controlo adequado e de cumprimento da obrigação de desembarque e sublinha o impacto negativo destas deficiências na sustentabilidade, também devido à fixação de TAC com base nas capturas totais, incluindo os chamados «top ups» (aumentos de quota com o fim de refletir a introdução da obrigação de desembarque das devoluções) para cobrir os peixes anteriormente devolvidos;
20. Assinala que a existência de inúmeras regras, isenções e derrogações adotadas nos últimos anos complica a aplicação da obrigação de desembarque e a avaliação do cumprimento pela AECP, tornando mais difícil a realização dos objetivos de proteção e melhoria da sustentabilidade das pescas; realça que o recurso às isenções previstas na PCP é da maior importância para a aplicação da obrigação de desembarque;
21. Apela a uma melhor utilização das novas tecnologias e soluções digitais desenvolvidas em cooperação com o setor das pescas e as autoridades dos Estados-Membros para melhorar o acompanhamento, o controlo e a vigilância, no pleno respeito dos direitos de privacidade e do sigilo comercial;
22. Destaca o papel fundamental dos pescadores e das outras partes interessadas na execução das políticas, promovendo assim uma cultura de conformidade e mudanças graduais e adaptáveis na regulamentação da obrigação de desembarque a longo prazo; sublinha os benefícios adicionais de regimes voluntários e associados a incentivos para melhorar a participação dos pescadores;
23. Salienta que, embora o aumento da seletividade deva continuar a ser altamente prioritário, a aplicação da obrigação de desembarque exige uma abordagem intersetorial e também a criação de incentivos claros para estimular a mitigação através da utilização das melhores práticas; recomenda as seguintes medidas de acompanhamento e instrumentos de gestão:
a)
maior utilização e otimização dos instrumentos baseados em quotas, em conformidade com os princípios da PCP e desde que sejam aplicadas medidas de controlo eficazes, tais como:
–
distribuição de quotas de acordo com a composição das capturas prevista;
–
ajustamentos através da troca de quotas com outros Estados-Membros e países terceiros vizinhos com os quais a UE partilha unidades populacionais, realizada de forma flexível e eficiente, a fim de evitar uma subutilização das quotas, nomeadamente transitando para a aplicação de mecanismos permanentes e não apenas renováveis anualmente após a fixação dos TAC e das quotas, em conformidade com os melhores pareceres científicos disponíveis;
–
atribuição das quotas de devoluções estimadas aos pescadores, nomeadamente da pesca de pequena escala, que optem por utilizar artes mais seletivas;
b)
estudo da viabilidade da implementação de uma abordagem de ordenamento do espaço marinho e de gestão por zona destinada a evitar devoluções, dirigindo os pescadores para zonas onde é menos provável a presença de peixes de tamanho inferior ao tamanho mínimo de referência, assegurando ao mesmo tempo que essas medidas não conduzam à não utilização extensiva de outras espécies de tamanho comercial;
c)
garantia de maior flexibilidade no que toca à escolha das artes de pesca pelos pescadores, a par de uma maior responsabilidade pela documentação (documentação completa das capturas);
d)
disponibilização de mecanismos flexíveis para a aprovação de novos tipos de artes seletivas, a fim de incentivar as partes interessadas a candidatarem-se e a realizarem projetos-piloto;
e)
concessão de acesso exclusivo a locais de pesca ou por períodos de tempo, a fim de incentivar a seletividade;
f)
adoção de estratégias para tirar o máximo proveito das capturas indesejadas para outros fins que não o consumo humano, sem gerar uma procura de capturas de tamanho inferior ao regulamentar, desde que tal seja viável do ponto de vista económico e operacional para os pescadores;
g)
desenvolvimento de um atlas de devoluções como inventário das capturas indesejadas nas diferentes pescarias e zonas, a fim de melhor desenvolver planos regionais de capturas acessórias envolvendo os Estados-Membros e o setor das pescas e com o apoio do Fundo Europeu dos Assuntos Marítimos, das Pescas e da Aquicultura;
h)
utilização e desenvolvimento de ferramentas de inteligência artificial para uso voluntário e associado a incentivos, a fim de aumentar a seletividade e o controlo e melhorar a identificação de espécies, em colaboração com o setor das pescas e as autoridades dos Estados-Membros;
i)
introdução progressiva da obrigação de cumprimento da mesma política de devoluções para as importações de produtos da pesca provenientes de países terceiros, a fim de eliminar a desvantagem comparativa e a concorrência desleal em relação à frota europeia, avançando ao mesmo tempo para uma melhor proteção dos recursos haliêuticos mundiais;
j)
renovar a obrigação da Comissão de apresentar relatórios anuais sobre o ponto da situação da PCP e a aplicação da obrigação de desembarque, bem como de fornecer mais informações sobre a sua aplicação no que respeita ao impacto socioeconómico e, entre outros aspetos, ao consumo de combustível, ao espaço de armazenamento, aos efeitos sobre a segurança e as condições de trabalho a bordo dos navios de pesca, à redução das devoluções e das capturas indesejadas e à melhoria do estado das unidades populacionais (RMS);
24. Insta, em particular, a Comissão, no âmbito do relatório de avaliação da aplicação da PCP previsto para 2022, a:
a)
avaliar em que medida foi alcançada a redução das devoluções ao abrigo da obrigação de desembarque e se contribuiu para melhorar o estado das unidades populacionais (RMS) e para reduzir o impacto no ecossistema marinho;
b)
avaliar o impacto socioeconómico da obrigação de desembarque, o sistema de remuneração, o número de tripulantes e as condições de segurança e de trabalho a bordo, em conformidade com as recomendações da FAO e da OIT;
c)
identificar e monitorizar as pescarias relativamente às quais existem dados científicos que indicam que, atualmente, é difícil aumentar a seletividade;
d)
avaliar a eficácia e a aplicabilidade do sistema de quotas comuns recentemente adotado para as capturas acessórias, enquanto instrumento eficiente e aplicável para evitar as situações que envolvem espécies bloqueadoras;
e)
avaliar o impacto na sustentabilidade das espécies retiradas pelo Conselho da lista de unidades populacionais sujeitas a TAC nos últimos anos e avaliar as potenciais consequências da sua reintrodução no âmbito do regime de TAC;
f)
identificar e eliminar as dificuldades administrativas enfrentadas no desenvolvimento e na execução de projetos-piloto de seletividade, as quais prejudicam os esforços dos pescadores no sentido de serem mais seletivos;
g)
identificar oportunidades comerciais e/ou caritativas, num esforço para fazer a melhor utilização possível das capturas abaixo do tamanho mínimo de referência de conservação desembarcadas de forma inevitável e das capturas indesejadas, a fim de evitar o desperdício de recursos naturais e de não comprometer os objetivos de sustentabilidade da PCP;
h)
verificar se a atual política de obrigação de desembarque é adequada à sua finalidade e avaliar a viabilidade de adaptar a obrigação de desembarque caso a caso, por pescaria e/ou unidade populacional;
i)
avaliar as vias para uma melhor adaptação e simplificação do artigo 15.º da PCP, a fim de facilitar a sua aplicação e compreensão por todas as partes interessadas e, em particular, a utilização pelos Estados-Membros dos instrumentos gerais disponíveis que o quadro jurídico em vigor prevê para melhorar a seletividade e reduzir as capturas indesejadas;
25. Insta a Comissão a apresentar uma proposta legislativa, com base nesta avaliação e se for caso disso, a fim de melhor atingir os objetivos de reduzir as devoluções e melhorar as unidades populacionais;
26. Reitera a sua preocupação pelo facto de as unidades populacionais partilhadas com países terceiros não estarem sempre sujeitas às mesmas disposições relativas às devoluções; salienta a necessidade de uma convergência progressiva no que diz respeito aos principais objetivos da gestão das pescas, a fim de garantir os mais elevados padrões para a obtenção de um bom estado ambiental do ecossistema marítimo partilhado, a sustentabilidade da atividade da pesca e a manutenção da igualdade de condições de concorrência relativamente aos países terceiros, em particular o Reino Unido;
27. Encarrega o seu Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho, à Comissão, ao Comité das Regiões, ao Comité Económico e Social Europeu, bem como aos governos e parlamentos dos Estados-Membros.
Borges, L., The unintended impact of the European discard ban, ICES Journal of Marine Science, volume 78, número 1, janeiro-fevereiro de 2021, pp. 134-141, https://doi.org/10.1093/icesjms/fsaa200
Uhlmann, Sven & Ulrich, Clara & Kennelly, Steven, 2019. The European Landing Obligation Reducing Discards in Complex, Multi-Species and Multi-Jurisdictional Fisheries: Reducing Discards in Complex, Multi-Species and Multi-Jurisdictional Fisheries.