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Processo : 2021/2208(INI)
Ciclo de vida em sessão
Ciclo relativo ao documento : A9-0195/2022

Textos apresentados :

A9-0195/2022

Debates :

PV 05/07/2022 - 19
CRE 05/07/2022 - 18
CRE 05/07/2022 - 19

Votação :

PV 06/07/2022 - 11.9
Declarações de voto

Textos aprovados :

P9_TA(2022)0287

Textos aprovados
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Quarta-feira, 6 de Julho de 2022 - Estrasburgo
A questão da segurança alimentar nos países em desenvolvimento
P9_TA(2022)0287A9-0195/2022

Resolução do Parlamento Europeu, de 6 de julho de 2022, sobre a questão da segurança alimentar nos países em desenvolvimento (2021/2208(INI))

O Parlamento Europeu,

–  Tendo em conta o artigo 25.º da Declaração Universal dos Direitos Humanos e o artigo 11.º do Pacto Internacional sobre os Direitos Económicos, Sociais e Culturais, que reconhecem o direito à alimentação como parte do direito a um nível de vida suficiente,

–  Tendo em conta o artigo 21.º do Tratado da União Europeia,

–  Tendo em conta o artigo 208.º do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE), que reitera que, na execução das políticas suscetíveis de afetar os países em desenvolvimento, a União tem em conta os objetivos da cooperação para o desenvolvimento,

–  Tendo em conta o artigo 214.º do TFUE, que estabelece os princípios e os objetivos das ações da UE no domínio da ajuda humanitária,

–  Tendo em conta o Regulamento (UE) 2021/947 do Parlamento Europeu e do Conselho, de 9 de junho de 2021, que cria o Instrumento de Vizinhança, de Cooperação para o Desenvolvimento e de Cooperação Internacional – Europa Global, e que altera e revoga a Decisão n.º 466/2014/UE e revoga o Regulamento (UE) 2017/1601 e o Regulamento (CE, Euratom) n.º 480/2009(1),

–  Tendo em conta o Regulamento (CE) n.º 1257/96 do Conselho, de 20 de junho de 1996, relativo à ajuda humanitária(2),

–  Tendo em conta as comunicações da Comissão, de 31 de março de 2010, sobre a ajuda alimentar humanitária (COM(2010)0126) e sobre um quadro estratégico da UE para ajudar os países em desenvolvimento a enfrentarem os desafios no domínio da segurança alimentar (COM(2010)0127),

–  Tendo em conta a comunicação da Comissão, de 3 de outubro de 2012, intitulada «A abordagem da UE em matéria de resiliência: aprender com as crises de segurança alimentar» (COM(2012)0586),

–  Tendo em conta a comunicação da Comissão, de 12 de março de 2013, intitulada «Melhorar a nutrição materna e infantil no âmbito da assistência externa: quadro estratégico da UE» (COM(2013)0141),

–  Tendo em conta a comunicação da Comissão, de 10 de março de 2021, sobre «a ação humanitária da UE, novos desafios e os mesmos princípios» (COM(2021)0110), que prevê, nomeadamente, ações-chave para reforçar a ligação entre ajuda humanitária, desenvolvimento e paz em prol de uma melhor articulação entre assistência rápida e soluções a longo prazo, e a Resolução do Parlamento Europeu, de 15 de dezembro de 2021, sobre as novas orientações para a ação humanitária da UE(3),

–  Tendo em conta a comunicação da Comissão, de 23 de março de 2022, intitulada «Preservar a segurança alimentar e reforçar a resiliência dos sistemas alimentares» (COM(2022)0133),

–  Tendo em conta o Plano de Ação da UE em Matéria de Igualdade de Género e o Empoderamento das Mulheres na Ação Externa da UE 2021-2025 (GAP III) sobre o mesmo(4),

–  Tendo em conta o plano de ação da Comissão em matéria de nutrição, de 3 de julho de 2014, destinado a reduzir em 7 milhões, até 2025, o número de crianças de idade inferior a cinco anos que apresentam atrasos de crescimento (SWD(2014)0234) e o sexto relatório intercalar sobre esta matéria, de 12 de agosto de 2021 (SWD(2021)0229),

–  Tendo em conta as suas resoluções sobre segurança alimentar e nutrição, em particular as de 27 de novembro de 2014 sobre a subnutrição e a malnutrição infantis nos países em desenvolvimento(5), de 7 de junho de 2016 sobre a Nova Aliança para a Segurança Alimentar e Nutricional(6) e de 5 de outubro de 2016 sobre os próximos passos para atingir os objetivos globais e os compromissos da UE em matéria de nutrição e segurança alimentar no mundo(7),

–  Tendo em conta a sua resolução, de 24 de março de 2022, sobre a necessidade de um plano de ação urgente para garantir a segurança alimentar dentro e fora da UE à luz da invasão russa da Ucrânia(8),

–  Tendo em conta as conclusões do Conselho, de 28 de maio de 2013, sobre segurança alimentar e nutricional no âmbito da ajuda externa,

–  Tendo em conta as conclusões do Conselho de 26 de novembro de 2018 sobre o fortalecimento da segurança alimentar e nutricional mundial, de 25 de novembro de 2019, sobre o quarto relatório intercalar sobre o Plano de Ação em matéria de Nutrição, de 20 de maio de 2021 relativamente às prioridades da UE para a Cimeira das Nações Unidas sobre os Sistemas Alimentares de 2021 e de 14 de junho de 2021 sobre o reforço do empenhamento da Equipa Europa no desenvolvimento humano, e de 19 de novembro de 2021, sobre a água na ação externa,

–  Tendo em conta a Declaração conjunta do Conselho e dos Representantes dos Governos dos Estados-Membros reunidos no Conselho, do Parlamento Europeu e da Comissão Europeia sobre o Consenso Europeu em matéria de Ajuda Humanitária de 2008(9), e o Consenso Europeu sobre o Desenvolvimento de 2017,

–  Tendo em conta os seis objetivos globais fixados pela Assembleia Mundial da Saúde em 2012 em matéria de nutrição materna, dos lactentes e das crianças de tenra idade para 2025, a saber (i) uma redução de 40 % do número de crianças com idade inferior a cinco anos que apresentam atrasos de crescimento, (ii) uma redução de 50 % dos casos de anemia em mulheres em idade fértil, (iii) uma redução de 30 % dos casos de baixo peso à nascença, (iv) nenhum aumento do excesso de peso na infância, (v) um aumento de, pelo menos, 50 % da taxa de amamentação materna exclusiva nos primeiros seis meses de vida e (vi) uma redução para menos de 5 % da percentagem de crianças que sofrem de emaciação,

–  Tendo em conta os relatórios sobre o estado da segurança alimentar e da nutrição no mundo, o Relatório Mundial sobre Crises Alimentares e o Relatório sobre a Nutrição Mundial, incluindo as suas edições de 2021, as diretrizes sobre o direito à alimentação da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), as orientações voluntárias sobre sistemas alimentares e nutrição do Comité da Segurança Alimentar Mundial da FAO, os 10 elementos da agroecologia, orientando a transição para um sistema alimentar e agrícola sustentável (FAO), e o quadro de ação de 2014 para a segurança alimentar e a nutrição em crises prolongadas,

–  Tendo em conta o relatório de 2020 intitulado «The State of World Fisheries and Aquaculture» [A situação mundial das pescas e da aquicultura], publicado pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO)(10),

–  Tendo em conta os acordos de parceria no domínio da pesca sustentável entre a UE e países terceiros,

–  Tendo em conta a Rede Mundial contra as Crises Alimentares, uma aliança de intervenientes no domínio humanitário e do desenvolvimento, que, através da partilha de análises e conhecimentos, trabalham em prol do reforço da coordenação da ligação entre ajuda humanitária, desenvolvimento e paz,

–  Tendo em conta a Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas (UNDRIP), de 13 de setembro de 2007, e a Declaração sobre os direitos dos camponeses e outras pessoas que trabalham nas zonas rurais, de 28 de setembro de 2018,

–  Tendo em conta a resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 25 de setembro de 2015, intitulada «Transformar o nosso mundo: a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável»,

–  Tendo em conta a resolução da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 1 de abril de 2016, intitulada «Década de Ação das Nações Unidas sobre Nutrição (2016-2025)», que visa intensificar as ações para erradicar a fome e a malnutrição no mundo, bem como assegurar o acesso universal a uma alimentação mais saudável e mais sustentável a todas as pessoas, independentemente de quem são e de onde vivem,

–  Tendo em conta os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) das Nações Unidas e a forma como estão estreitamente relacionados e integrados, em particular o ODS 1, que visa erradicar a pobreza em todas as suas formas em todos os lugares, o ODS 2, que visa acabar com a fome, alcançar a segurança alimentar, melhorar a nutrição e promover uma agricultura sustentável, o ODS 3, que visa assegurar uma vida saudável e promover o bem-estar para todos em todas as idades, o ODS 5, que visa alcançar a igualdade de género e capacitar todas as mulheres e raparigas, o ODS 6, que visa garantir o acesso à água e saneamento para todos, o ODS 10, que visa reduzir a desigualdade tanto entre os países como no seu interior, o ODS 12, que visa garantir padrões de consumo e de produção sustentáveis, o ODS 13, que visa tomar medidas urgentes para combater as alterações climáticas e os seus impactos, e o ODS 17, que visa reforçar os meios de execução e revitalizar a parceria mundial para o desenvolvimento sustentável,

–  Tendo em conta a Resolução 2417 do Conselho de Segurança das Nações Unidas de 2018, que condena a imposição da fome a civis como tática de guerra e a recusa ilegal de acesso humanitário às populações civis,

–  Tendo em conta o relatório de junho de 2020 da Plataforma Intergovernamental Científica e Política sobre a Biodiversidade e os Serviços Ecossistémicos (IPBES) e do Painel Intergovernamental sobre as Alterações Climáticas (PIAC)(11), que salienta a ligação entre o combate às alterações climáticas e a conservação da biodiversidade,

–  Tendo em conta as orientações voluntárias do CSA sobre a governação responsável da propriedade fundiária, das pescas e das florestas no contexto da segurança alimentar nacional (2012) e os princípios do CSA para o investimento responsável nos sistemas agrícola e alimentar (2015),

–  Tendo em conta o Movimento «Reforçar a Nutrição» (Scaling Up Nutrition) e o trabalho que desenvolve para pôr termo à malnutrição em todas as suas formas, através do apoio a iniciativas lideradas por governos e às prioridades dos países envolvidos, em colaboração com a sociedade civil, as Nações Unidas, os doadores, as empresas e os investigadores,

–  Tendo em conta o compromisso assumido pela Comissão na Cimeira «Nutrição para o Crescimento», realizada em Tóquio, em dezembro de 2021, de atribuir 2,5 mil milhões de EUR para combater a malnutrição durante o período de 2021-2024, bem como o atual compromisso da UE de reduzir em, pelo menos, 7 milhões o número de crianças que sofrem de atrasos de crescimento até 2025,

–  Tendo em conta o Pacto sobre a Prevenção da Fome e das Crises Humanitárias, aprovado na Cimeira do G7 na Cornualha, em 13 de junho de 2021, mediante o qual os membros do G7 se comprometeram a combater e evitar a fome através de ações conjuntas,

–  Tendo em conta o artigo 54.º do seu Regimento,

–  Tendo em conta o parecer da Comissão da Agricultura e do Desenvolvimento Rural,

–  Tendo em conta o relatório da Comissão do Desenvolvimento (A9-0195/2022),

A.  Considerando que a insegurança alimentar moderada ou grave tem aumentado lentamente desde 2014 e que, em 2020, quase uma em cada três pessoas – 2,37 milmilhões – não teve acesso a uma alimentação adequada(12);

B.  Considerando que a gravidade e a magnitude das crises alimentares aumentaram desde 2020 devido a conflitos, choques económicos e condições climáticas extremas, ou a uma combinação destes fatores, com cerca de 193 milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar aguda em 2021 e necessitadas de assistência alimentar urgente, o maior número de pessoas em situação de insegurança alimentar aguda a nível mundial registado nos seis anos de existência do Relatório Mundial sobre Crises Alimentares; considerando que entre 720 e 811 milhões de pessoas são afetadas pela fome e que cinco países foram considerados em risco de fome, nomeadamente o Sudão do Sul, a Etiópia, Madagáscar, a Nigéria (16 Estados e Território da Capital Federal) e o Iémen(13);

C.  Considerando que o direito à alimentação refere-se à dimensão de disponibilidade, de acessibilidade e de adequação (quantidade suficiente e estabilidade de acesso);

D.  Considerando que, de acordo com a Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO), a segurança alimentar existe quando todas as pessoas têm sempre acesso físico e económico a alimentos suficientes, seguros e nutritivos que satisfaçam as suas necessidades e preferências alimentares para uma vida ativa e saudável(14);

E.  Considerando que a guerra de agressão ilegal, não provocada e injustificável da Rússia na Ucrânia desestabilizou ainda mais os mercados agrícolas já frágeis, exacerbou a já grave situação causada pela pandemia de COVID-19 e exerceu uma pressão adicional sobre as crises alimentares em curso e a segurança alimentar global, provocando uma subida dos preços internacionais dos alimentos para consumo humano e animal bem acima dos seus níveis já elevados; considerando que esta situação poderá aumentar a insegurança alimentar, a pobreza, a agitação social e a instabilidade em muitos países em desenvolvimento que são altamente dependentes das importações de trigo da Ucrânia e da Rússia, uma vez que 40 % das exportações de trigo e milho da Ucrânia têm como destino o Médio Oriente e a África;

F.  Considerando que, de acordo com a FAO, aproximadamente 50 países dependem da Rússia e da Ucrânia para, pelo menos, 30 % das suas necessidades em matérias de importação de trigo e que destes, 26 países têm ambos os países como a origem de mais de 50 % das suas importações de trigo; considerando que o Programa Alimentar Mundial estava a comprar cerca de metade do seu abastecimento de trigo à Ucrânia e que sublinhou que as atuais crises alimentares em países tais como o Afeganistão, a Etiópia, a Síria e o Iémen serão as mais afetadas;

G.  Considerando que tanto a Ucrânia como a Rússia são exportadores líquidos de produtos agrícolas, e que ambos os países desempenham papéis principais no abastecimento global dos mercados de géneros alimentícios e de fertilizantes, nos quais os excedentes para exportação estão muitas vezes concentrados num pequeno grupo de países; considerando que esta concentração pode expor estes mercados a vulnerabilidade e volatilidade crescentes; considerando que a Rússia é um dos principais exportadores de adubos sintéticos azotados e dos seus componentes e que a Bielorrússia é um importante exportador de adubos à base de potássio; considerando que os preços dos adubos azotados dependem fortemente dos preços do gás natural, um produto em relação ao qual a Rússia detém uma posição dominante no mercado; considerando que muitos dos países em vias de desenvolvimento, ainda antes do conflito, já lidavam com os efeitos negativos dos elevados preços internacionais de alimentos e de fertilizantes;

H.  Considerando que o Índice da FAO dos preços dos géneros alimentícios, que acompanha os preços internacionais dos itens dos géneros alimentícios e da alimentação animal atingiu um máximo histórico e que as subidas de preço adicionais e a inflação alimentar estão provavelmente bem acima dos seus já elevados níveis;

I.  Considerando que o Índice da FAO dos preços dos géneros alimentícios atingiu um recorde máximo em fevereiro de 2022; considerando que enuncia que os fatores responsáveis pela inflação alimentar não estão limitados às condições das colheitas e às disponibilidades de exportação, mas que um muito maior impulso para a inflação dos preços alimentares advém de setores externos à produção alimentar, em particular os da energia, dos fertilizantes e da alimentação animal;

J.  Considerando que África tem a maior prevalência de insegurança alimentar, com 60 % da população africana (799 milhões de pessoas) afetada por insegurança alimentar moderada ou severa em 2020(15);

K.  Considerando que a União Europeia deve prestar particular atenção aos países que enfrentam situações de fome, agravadas por desastres naturais, como no caso da República de Madagáscar, recentemente atingida por ciclones violentos e na qual dois em cada cinco habitantes são afetados por insegurança alimentar aguda, especialmente na região do grande sul, onde mais de 300 000 crianças estão a sofrer de malnutrição severa;

L.  Considerando que muitos pequenos agricultores em países em vias de desenvolvimento não conseguem ter acesso a dietas saudáveis, nutritivas e sustentáveis devido a localizações remotas, baixo rendimento e falta de acesso a fontes diversas de alimentação; considerando que os factos demonstram que os investimentos no setor dos pequenos proprietários e das estruturas regionais geram os melhores resultados em termos de crescimento e da redução da pobreza, consequentemente enfatizando a necessidade de centrar os esforços na melhoria dos rendimentos dos pequenos proprietários agrícolas, e em especial das mulheres pequenas proprietárias, e de reforçar a resiliência de comunidades vulneráveis;

M.  Considerando que, em 2020, uma alimentação saudável era incomportável para cerca de 3 mil milhões de pessoas no mundo e que a obesidade aumenta acentuadamente em todas as regiões(16);

N.  Considerando que a malnutrição é uma condição fisiológica anormal causada pela subnutrição, bem como pelo excesso de peso e obesidade; considerando que a saúde das mulheres e das raparigas está intimamente associada à saúde física e mental, bem como à situação nutricional, das suas futuras crianças; considerando que a subnutrição entre as mulheres grávidas e as mães aumenta o risco de complicações durante a gravidez, a mortalidade materna e a subnutrição e mortalidade infantis; considerando que um número inaceitavelmente elevado de crianças continua a ser afetado pela malnutrição: que 22 % das crianças de idade inferior a cinco anos apresentam atrasos de crescimento devido a malnutrição crónica, 6,7 % sofrem de emaciação – uma forma de malnutrição aguda – e 5,7 % têm excesso de peso(17) e que se espera que os dados concretos relativos aos atrasos de crescimento e de emaciação sejam mais elevados devido aos efeitos da pandemia;

O.  Considerando que a salvaguarda do acesso seguro e garantido à água está intimamente relacionada com as melhorias da segurança alimentar e da nutrição; considerando que os efeitos da escassez de água afetam mais de 40 % da população global, com mais de 2 mil milhões de pessoas sem acesso direto e garantido a água potável segura a nível mundial de acordo com o último Relatório Mundial das Nações Unidas sobre o Desenvolvimento dos Recursos Hídricos (2021);

P.  Considerando que a sobrevivência de mais de 10 % da população global depende das pescas e da aquicultura(18), e que, de acordo com a ONU, mais de 3 mil milhões de pessoas dependem dos oceanos para as suas principais fontes de proteína, primariamente peixes e produtos do mar; considerando que as pequenas pescas totalizam mais de 90 % dos pescadores por captura e dos trabalhadores das pescas a nível mundial;

Q.  Considerando que os sistemas de saúde que não são muito resilientes e fortes estão a ser desafiados pelo surgimento regular de epidemias, particularmente na sua capacidade de assegurar a continuidade dos cuidados mais básicos; considerando que no decorrer dos últimos dois anos, os recursos dos sistemas de saúde foram desviados de uma gama de funções nutricionalmente importantes e de serviços de saúde essenciais relacionados com a subnutrição - incluindo os cuidados pré-natais, suplementação de micronutrientes, e prevenção e tratamento da diarreia infantil, de infeções e da malnutrição aguda - no sentido de combater a COVID-19, que o tratamento e os serviços preventivos para a subnutrição continuam insuficientemente integrados nos pacotes de cuidados essenciais dos sistemas de saúde nacionais, e que o acesso equitativo aos cuidados de saúde permanece insuficiente;

R.  Considerando que a pobreza crónica, os níveis elevados e persistentes de desigualdade e sistemas alimentares insustentáveis em conjunção com catástrofes naturais cada vez mais frequentes, em particular as relacionadas com as alterações climáticas, são as causas subjacentes à insegurança alimentar e à malnutrição;

S.  Considerando que de acordo com o sexto relatório do PIAC de 2022, as alterações climáticas, incluindo aumentos na frequência e intensidade dos extremos, reduzem a segurança alimentar e da água, diminuem os rendimentos das colheitas, modificam as pastagens e trilhos de transumância, e diminuem o valor nutricional dos alimentos, prejudicando desse modo os esforços para concretizar a Agenda 2030 e os seus Objetivos de Desenvolvimento Sustentável;

T.  Considerando que as alterações climáticas expõem adicionalmente as mulheres a riscos e vulnerabilidades; considerando que as alterações climáticas exacerbam os desafios existentes, como uma súbita perda de produção alimentar e acesso à comida, e as vulnerabilidades subjacentes, incluindo o agravamento da pobreza e da insegurança alimentar, forçando as comunidades a lidar com crises complexas. que o decréscimo da diversidade alimentar teve como consequência o aumento da malnutrição em muitas comunidades, especialmente para os povos indígenas, pequenos agricultores e agregados familiares de baixo rendimento, tendo as crianças, os idosos e as mulheres grávidas como os principais afetados;

U.  Considerando que a FAO estima que, em todo o mundo, se perdeu cerca de 75 % da diversidade genética vegetal; considerando que a erosão genética em grande escala aumenta a vulnerabilidade às alterações climáticas e ao aparecimento de novas pragas e doenças;

V.  Considerando que a biodiversidade e os seus serviços associados - polinização, predadores de pragas, uma acrescida resiliência dos agroecossistemas à erosão, secas e cheias, formação dos solos e sumidouros de carbono - são essenciais para fornecer uma produção alimentar sustentável;

W.  Considerando que desenvolver a resiliência da biodiversidade e apoiar a integridade dos ecossistemas pode trazer benefícios às pessoas, incluindo meios de subsistência, saúde e bem-estar humanos e o fornecimento de alimentos;

X.  Considerando que está a aumentar o número de pessoas que necessitam urgentemente de ajuda alimentar e nutricional e de meios de subsistência(19); considerando que as principais causas da insegurança alimentar e nutricional e da malnutrição, que estão a deteriorar, são os conflitos, a variabilidade climática e os eventos climáticos extremos, a degradação do ambiente, o aumento dos preços da energia, o acesso limitado à água, os choques económicos, a pobreza crónica e os níveis elevados e persistentes de desigualdade, incluindo a desigualdade de género, a falta de acesso aos serviços sociais e de saúde básicos, o crescimento da população mundial e uma governação deficiente, que podem consequentemente levar a uma necessidade de migrar;

Y.  Considerando que os conflitos perturbam o acesso aos alimentos e aos serviços sociais básicos, que afetam a saúde estável, incluindo serviços de nutrição, a água, o saneamento e a higiene e que danificam os recursos naturais, a infraestrutura, os meios de produção e os rebanhos; considerando que a insegurança alimentar pode ser uma fonte de conflito entre as comunidades afetadas, exacerbando desse modo as tensões e os desafios existentes relacionados com a escassez de recursos;

Z.  Considerando que a COVID-19 levou à perturbação das cadeias de valor, da produção aos transportes, desde o armazenamento à venda de alimentos, e as restrições à circulação reduziram o acesso aos mercados para agricultores e consumidores, inibindo ainda mais o acesso equitativo a alimentação e nutrição adequadas e para todos e expondo a não resiliência dos sistemas alimentares com base na importação bem como a importância de sistemas agro-alimentares sustentáveis;

AA.  Considerando que a COVID-19 levou a um aumento da pobreza na ausência de bases de proteção social universais; considerando que as restrições afetaram as atividades económicas diárias das quais muitos agregados familiares dependem, levando a dificuldades no acesso a uma alimentação saudável e nutritiva, ou a satisfazer as necessidades de saúde; considerando que o acesso a cuidados de saúde de qualidade é extremamente limitado em muitos países em vias de desenvolvimento, em especial para as pessoas mais vulneráveis e marginalizadas;

AB.  Considerando que os sistemas alimentares inclusivos, eficientes, resilientes e sustentáveis são cruciais na concretização da Agenda 2030 e dos seus Objetivos de Desenvolvimento Sustentável; considerando que a pandemia de COVID-19 expôs as fragilidades dos sistemas alimentares mundiais, exacerbando as desigualdades e ameaçando as vidas e os meios de subsistência dos mais vulneráveis; considerando que a Década da Ação para o Desenvolvimento Sustentável das Nações Unidas insta a um acelerar das soluções que alterem o curso das coisas de modo a abordar os desafios globais às pessoas e ao planeta, desde pobreza, a género, às alterações climáticas, à desigualdade e a colmatar a lacuna de financiamento;

AC.  Considerando que a nutrição é uma questão importante que subjaz e conduz à concretização de pelos menos 12 dos 17 ODS e que está inextricavelmente relacionada com outras questões chave para o desenvolvimento sustentável, seja porque depende delas (por exemplo água, saneamento e higiene, e agricultura), porque as viabiliza (por exemplo saúde e emprego), ou ambas (por exemplo igualdade de géneros, e educação);

AD.  Considerando que o Acordo de Marraquexe de 1994 e, em particular, o Acordo da Organização Mundial de Comércio (OMC) sobre a Agricultura contribuíram para a especialização das regiões agrícolas; considerando que esta especialização criou regiões com níveis elevados de exportação e outras que dependem quase totalmente das importações; considerando que esta situação não resiste a crises, como as guerras, e é um dos fatores subjacentes à atual instabilidade alimentar mundial;

AE.  Considerando que uma elevada dependência em importações alimentares expõe, em larga medida, as populações às volatilidades do mercado global, em especial as pessoas que gastam uma parte considerável do seu rendimento nas suas necessidades alimentares diárias;

AF.  Considerando que a instabilidade dos mercados internacionais conduz à insegurança alimentar em países que não têm políticas agrícolas robustas, uma vez que períodos de baixos preços têm um impacto negativo nas capacidades de produção e conduzem a um aumento das importações, o que torna as populações urbanas vulneráveis aquando das subidas acentuadas dos preços globais;

AG.  Considerando que as politicas agrícolas são as principais políticas macroeconómicas e que, devido a uma falta de proteção contra a extrema volatilidade dos preços globais, o dano causado pela inflação é devastador para as economias emergentes;

AH.  Considerando que a soberania alimentar é o direito do povo e dos países a definir as suas próprias políticas agrícolas e alimentares; considerando que este conceito visa permitir que cada país possa alimentar a sua própria população e ser autossuficiente e autónomo; considerando que o objetivo da Estratégia do Prado ao Prato de reduzir a dependência dos agricultores da produção externa está em consonância com esta definição;

AI.  Considerando que o Pacto Ecológico Europeu e a Estratégia do Prado ao Prato adotam abordagens holísticas em matéria de agricultura, com vista não só a prevenir uma crise climática e de biodiversidade na Europa, mas também a garantir a segurança alimentar e a melhorar a nutrição e a saúde pública; considerando que estas estratégias funcionam como modelo de investimentos no âmbito do financiamento do desenvolvimento, de modo a tirar partido da resiliência e da autossuficiência alimentar dos países em desenvolvimento;

AJ.  Considerando que a Estratégia do Prado ao Prato visa reduzir a utilização de fatores de produção agrícolas e, nomeadamente, reduzir a utilização total de pesticidas químicos em 50 %, a utilização dos pesticidas mais perigosos em 50 % e a utilização dos fertilizantes em, pelo menos, 20 % até 2030;

AK.  Considerando que a nutrição é um investimento importante, uma vez que uma boa nutrição durante os primeiros mil dias de vida de uma criança é fundamental para o desenvolvimento de todo o seu potencial físico, intelectual e humano; considerando que a fome e a subnutrição afetam negativamente a aprendizagem das crianças e influenciam o abandono escolar, representando um fardo para as pessoas ao longo de toda a sua vida e as sociedades, com impactos negativos no desenvolvimento dos seres humanos e da economia nacional; considerando que uma boa nutrição é, por conseguinte, a pedra angular da prosperidade das sociedades;

AL.  Considerando que, durante o pico da pandemia de COVID-19, 370 milhões de crianças ficaram sem acesso a refeições escolares devido ao encerramento das escolas, as quais, muitas vezes, eram a única refeição quente que comiam ao longo do dia; considerando que os programas de refeições escolares constituem um elemento importante no combate à fome infantil e a todas as formas de subnutrição; considerando que, por outro lado, a insegurança alimentar perturba o funcionamento da sociedade, incluindo a capacidade de as famílias mandarem os seus filhos para a escola e representando uma fonte de tensão para as famílias, podendo constituir um fator de violência doméstica e violência de género; considerando que, por cada dólar investido em ações de nutrição, pode ser gerado um lucro de 16 dólares;

AM.  Considerando que, tal como noutros domínios da ajuda humanitária e da ajuda ao desenvolvimento, as necessidades cada vez maior não são acompanhadas por recursos adequados, o que provoca um défice de financiamento cada vez mas rápido, que, por sua vez, exige abordagens mais inteligentes e sistemáticas, uma transformação sistemática rumo a sistemas alimentares socialmente justos, à medida que os nossos sistemas alimentares atuais aumentam as desigualdades socioeconómicas e de género que impedem o acesso a uma nutrição saudável, justa e sustentável;

AN.  Considerando que as mulheres desempenham um papel fundamental na alimentação da população mundial enquanto agricultoras, cuidadoras e produtoras, produzindo entre 60 a 80 % dos alimentos nos países em desenvolvimento, mas têm um acesso desigual a alimentos, recursos, serviços e bens que aumentam os seus rendimentos; considerando que as mulheres assumem 75 % da prestação de cuidados e do trabalho doméstico não remunerados, e que as mulheres que residem nas comunidades rurais e nos países de baixo rendimento despendem até 14 horas por dia na prestação de cuidados;

AO.  Considerando que a desigualdade de género influencia a distribuição do trabalho e sobrecarrega de forma desigual as mulheres e as raparigas com a prestação de cuidados não remunerados;

AP.  Considerando que é necessário assegurar a proteção dos direitos das mulheres e das raparigas a todos os níveis e integrá-las nos processos de tomada de decisões; considerando que as mulheres e as raparigas são as mais afetadas pelas alterações climáticas e as catástrofes, o que aumenta a vulnerabilidade face aos riscos;

AQ.  Considerando que as desigualdades de género têm um impacto direto na nutrição, moldando a dinâmica alimentar nos agregados familiares e nas comunidades e afetando a produção de alimentos, bem como o acesso e a capacidade de adquirir e fornecer os mesmos, e a prestação de cuidados e de serviços de saúde e de higiene de mulheres e raparigas, e pode ainda colocá-las em maior risco de violência de género e de violência nas relações íntimas;

AR.  Considerando que a diminuição da disparidade entre agricultoras e agricultores pode aumentar entre 2,5 a 4 % o rendimento agrícola nas regiões mais pobres e reduzir em 17 % a fome em todo o mundo;

AS.  Considerando que as mulheres constituem 43 % da mão de obra agrícola nos países parceiros e que esta percentagem aumenta para 50 % ou mais em alguns países da Ásia e da África Subsariana, as mulheres apenas representam menos de 20 % dos exploradores agrícolas;

AT.  Considerando que existem 608 milhões de explorações agrícolas familiares em todo o mundo, que ocupam entre 70 a 80 % das explorações agrícolas mundiais, representando mais de 90 % do total das explorações agrícolas em todo o mundo, e produzindo cerca de 80 % dos alimentos de todo o mundo;

AU.  Considerando que um terço dos alimentos produzidos em todo o mundo se perdem ou são desperdiçados; considerando que, para diminuir a insegurança alimentar, a subnutrição e proteger a biodiversidade em todo o mundo, é fundamental envidar mais esforços para reduzir a perda e o desperdício alimentares através da aplicação da economia circular nos sistemas de produção agrícola, a fim de aumentar a sustentabilidade e a eficiência na utilização dos recursos da produção agrícola;

AV.  Considerando que, para fazer face à segurança alimentar e nutricional, são necessários não só mais recursos financeiros, mas também uma atenção e esforços decisivos a nível político;

AW.  Considerando que alguns países terceiros criaram vários projetos inovadores, como a iniciativa africana «Grande Muralha Verde», que promove os projetos agroecológicos;

AX.  Considerando que o Comité da Segurança Alimentar Mundial é a plataforma internacional e intergovernamental mais inclusiva de partes interessadas concebida para coordenar esforços com vista a alcançar o objetivo comum de assegurar a segurança alimentar e nutricional para todos;

AY.  Considerando que, em 20 de dezembro de 2017, a Assembleia Geral das Nações Unidas adotou um projeto através do qual declarou o período de 2019-2028 como a Década das Nações Unidas para a Agricultura Familiar;

AZ.  Considerando que os direitos dos agricultores foram estabelecidos em 2004 no Tratado Internacional da FAO sobre os Recursos Fitogenéticos para a Alimentação e a Agricultura, mas as normas em matéria de propriedade intelectual têm colidido frequentemente com esses direitos, colocando em risco os sistemas locais, tradicionais e autóctones em matéria de sementes;

BA.  Considerando que é essencial que a UE assuma um papel ativo no combate à insegurança alimentar, desde que preste quase metade da ajuda pública ao desenvolvimento (APD) em todo o mundo;

Segurança alimentar e nutrição no centro da recuperação pós-COVID-19

1.  Manifesta-se alarmado com o facto de não estarmos no bom caminho e de ser altamente improvável alcançar os objetivos em matéria de nutrição até 2025 ou erradicar a fome até 2030, que é a ambição estabelecida no ODS 2 «Erradicar a Fome»; recorda que a fome e a insegurança alimentar estão novamente a aumentar em todo o mundo; observa com preocupação que cerca de 660 milhões de pessoas podem continuar a viver situações de fome até 2030, também devido às consequências da pandemia de COVID-19; recorda que é necessário aplicar medidas fortes, sobretudo no que diz respeito à desigualdade no acesso a alimentos, de modo a acelerar os progressos alcançados na concretização do objetivo de «Erradicar a Fome»; recorda que a erradicação de todas as formas de subnutrição e o ODS 2 devem representar as prioridades de todas as políticas, prestando especial atenção às pessoas que se encontram em situações mais vulneráveis;

2.  Sublinha que os sistemas alimentares desempenham um papel fundamental na erradicação da pobreza e na realização do ODS 1, bem como no combate à subnutrição e à coexistência da sobrenutrição e da subnutrição, que serão cruciais para a concretização do ODS 3; sublinha que será impossível gerir de forma sustentável os recursos hídricos de modo a realizar o ODS 6, sem que a agricultura desempenhe um papel central, e que a gestão sustentável das pescas é fundamental para a preservação e a utilização sustentável dos oceanos e dos mares, de modo a concretizar o ODS 14; relembra, consequentemente, que os sistemas alimentares devem refletir ainda os compromissos em matéria de produção e consumo sustentáveis assumidos no ODS 12, de atenuação das alterações climáticas e de adaptação às mesmas estabelecidas no ODS 13 e de proteção, restauração e gestão sustentável dos ecossistemas terrestres estabelecidas no ODS 15; 

3.  Recorda o papel fundamental da pesca artesanal em termos de segurança alimentar e nutrição; salienta que os acordos de parceria no domínio da pesca sustentável devem ser coerentes com os melhores pareceres científicos disponíveis e não devem comprometer a segurança alimentar a nível local, nem ameaçar a pesca artesanal em países terceiros colocando-os em concorrência direta com os navios da UE; solicita que os acordos sejam coerentes com a Agenda 2030 para o Desenvolvimento Sustentável, com as obrigações da UE em matéria de ambiente e com os objetivos da Política Comum das Pescas, mediante o aumento do apoio setorial e das disposições em matéria de sustentabilidade aplicáveis aos excedentes, às devoluções e à abordagem de precaução;

4.  Sublinha que a pandemia de COVID-19 e a crise económica, bem como o encerramento das fronteiras daí resultantes, e o atual conflito na Ucrânia expôs as vulnerabilidades do sistema alimentar mundial; destaca e recorda a Comissão Europeia e os Estados-Membros da importância de criar relações mais fortes entre as políticas a curto, médio e longo prazo, a fim de assegurar a inclusividade dos planos de recuperação da COVID-19, prestando especial atenção aos grupos mais vulneráveis, como as crianças, os jovens, as mulheres, os idosos e os povos indígenas;

5.  Apela à UE que salvaguarde o direito à alimentação dos países em desenvolvimento e o direito à autossuficiência, como forma de alcançar a segurança nutricional, a redução da pobreza e cadeias de abastecimento mundiais inclusivas, sustentáveis e justas e sistemas alimentares mais sustentáveis; bem como de apoiar os mercados locais e regionais, prestando especial atenção à agricultura feminina e familiar, com o objetivo de garantir o abastecimento de alimentos a preços comportáveis e acessíveis e redes de segurança social mais fortes, com vista a assegurar que os cidadãos mais vulneráveis continuam a ter acesso a alimentos mesmo em situações de emergência ou de crise;

6.  Recorda que a Ucrânia e a Rússia são intervenientes importantes no mercado mundial de exportações alimentares; consequentemente, alguns países com níveis elevados de fome sofreram um impacto mais significativo com a guerra entre a Ucrânia e a Rússia, uma vez que importam uma quantidade substancial de trigo destes países;

7.  Sublinha que, neste contexto, os governos devem evitar proibições de exportação e identificar medidas para apoiar a reestruturação dos mercados agrícolas e a respetiva regulamentação, mediante o reforço da transparência e a criação de novas regras que visam prevenir a especulação financeira excessiva provocada pela volatilidade dos preços dos alimentos, que, em especial no contexto da guerra, podem inflacionar de forma artificial os preços por grosso e conduzir à volatilidade do mercado e, em especial, afetar os países em desenvolvimento e as populações mais vulneráveis;

8.  Lamenta a especulação financeira nos produtos de base agrícolas e alimentares e apela à Comissão para que apresente propostas com caráter de urgência para pôr termo a esta especulação, sobretudo no contexto da guerra, de modo a assegurar a estabilidade do mercado e da produção agrícolas; neste contexto, recorda que a instabilidade estrutural dos mercados agrícolas internacionais constitui uma ameaça à segurança alimentar a nível mundial e à estabilidade política em inúmeros países em desenvolvimento; insta a Comissão e os Estados-Membros a apoiarem as regras internacionais que visam travar a especulação financeira dos produtos de base agrícolas e alimentares e as práticas especulativas;

9.  Relembra que o direito à alimentação é um direito do ser humano; apela a ações abrangentes e sólidas da UE que acompanhem a aplicação plena e progressiva deste direito como forma de garantir a segurança alimentar para todos; manifesta forte preocupação com o aumento acentuado da insegurança alimentar nos últimos anos;

10.  Destaca que a crise energética e os acontecimentos climáticos adversos anteriores à guerra na Ucrânia provocaram um aumento acentuado dos preços dos produtos de base agrícolas no mercado mundial e, neste contexto, solicita uma ajuda alimentar reforçada e mais eficiente, de modo a associar a ajuda alimentar urgente e a mais longo prazo; em especial, solicita à Comissão Europeia e aos Estados-Membros da UE que aumentem as suas contribuições para o Programa Alimentar Mundial e para as ações que visam transformar os nossos sistemas alimentares, mediante o apoio da diversidade e da qualidade da produção e da transformação agrícolas nos países parceiros e de medidas destinadas a combater a pobreza estrutural e as desigualdades persistentes que constituem causas subjacentes da insegurança alimentar;

11.  Observa com preocupação que a invasão da Ucrânia pela Rússia terá impactos massivos num sentido mais amplo, uma vez que exacerbará ainda mais a insegurança alimentar existente e os impactos da pandemia de COVID-19; observa ainda com maior preocupação que a Ucrânia é um produtor chave de géneros alimentícios básicos como o trigo, o milho e os óleos vegetais; exorta a Comissão a desenvolver medidas de longo alcance para a segurança alimentar e a implementá-las a curto, médio e longo prazo; recorda que a UE deve assegurar que o direito à alimentação para todos não é um produto de mercado; recorda ainda que a escassez de víveres é uma das consequências potenciais que deve ser seriamente considerada como resultado da guerra, caso os líderes globais não adotem as necessárias contramedidas;

12.  Sublinha que a guerra da Ucrânia mostra o quanto os países de rendimento baixo dependem do mercado mundial para o seu abastecimento alimentar básico, baseando a sua segurança alimentar num número reduzido de países exportadores de cereais, o que torna estes países ainda mais vulneráveis às perturbações do mercado e aos aumentos de preços; recorda que para alimentar a sua população, 14 países de baixo ou médio-baixo rendimento importam mais de 50 % do seu trigo da Rússia e da Ucrânia, alguns dos quais já enfrentam condições semelhantes às da fome;

13.  Sublinha que para absorver os choques induzidos pelo conflito e permanecer resistentes, os países que dependem das importações de alimentos da Ucrânia e da Federação da Rússia devem diversificar as fontes do seu abastecimento alimentar, confiando noutros países exportadores, nas reservas alimentares existentes ou aumentando a diversidade das suas bases de produção interna;

14.  Apela à UE e aos seus Estados-Membros para que cubram imediatamente a lacuna de financiamento nos apelos humanitários da ONU de 2022 para a África Oriental e o Médio Oriente, porque o apoio a estas duas regiões está atualmente 99 por cento subfinanciado; recorda que o PAM já teve de reduzir as rações para os refugiados e outras populações vulneráveis em toda a África Oriental e Médio Oriente devido à falta de financiamento, ao aumento dos preços e à redução da oferta de bens nos mercados, também devido à guerra na Ucrânia;

15.  Salienta que a programação alimentar e nutricional ambiciosamente financiada deve estar no centro dos planos de recuperação pós-pandemia;

16.  Insta a UE a dar prioridade aos alimentos e à agricultura sustentável na sua programação de desenvolvimento internacional e a assegurar o acesso ao financiamento para as comunidades e organizações locais; insta a UE a investir em medidas e intervenções em parcerias com países em desenvolvimento que deem acesso a produtos alimentares diversos, a preços comportáveis, seguros, sustentáveis e suficientemente nutritivos, porque investir em alimentos e nutrição é um elemento crucial para a construção do capital humano, bem como para a competitividade e realização dos ODS;

17.  Destaca a necessidade de as políticas serem adaptadas aos países, baseadas nas necessidades e adequadas a cada contexto, dada a grande diversidade dos sistemas alimentares; recorda que deve ser dada prioridade à produção local de géneros alimentícios através do financiamento dos pequenos agricultores, da proteção dos direitos humanos, do reforço dos sistemas de agricultura familiar, cooperativas e cadeias de abastecimento regionais;

18.  Salienta que os pequenos agricultores são os principais produtores de alimentos nos países em desenvolvimento, desempenhando um papel fundamental na segurança alimentar e na nutrição desses países; insta a UE a apoiar e fortalecer especificamente a agricultura em pequena escala, a agricultura familiar e as cooperativas na sua ajuda ao desenvolvimento, sem deixar de dar ênfase às condições de trabalho digno; salienta que o aumento da produção agrícola dos pequenos agricultores se traduz em mais produtos alimentares no mercado global, levando a preços mais baixos dos alimentos e a melhores dietas;

19.  Recorda que as tradições agrícolas locais complementadas por tecnologia moderna podem melhorar a produção de alimentos saudáveis e nutritivos; considera que os países em desenvolvimento devem ser capazes de proteger as suas políticas agrícolas públicas;

20.  Salienta que a produção local de géneros alimentícios e o consumo local que apoiam a agricultura em pequena escala e garantem preços justos para produtores e consumidores, reduzem a dependência dos países em relação às importações e a sua vulnerabilidade às flutuações de preços internacionais;

21.  Sublinha que os investimentos estratégicos em práticas agrícolas sustentáveis podem desempenhar um papel fundamental para garantir sistemas agroalimentares mais resilientes e sustentáveis; insiste em que os investimentos da UE estão integrados na Agenda 2030, no Acordo de Paris sobre o Clima e na Convenção sobre a Diversidade Biológica; congratula-se e incentiva os investimentos da UE, em parceria com os países em desenvolvimento, em agroecologia, diversificação agroflorestal e de culturas, e reitera que o investimento apoiado pela UE na agricultura, silvicultura ou pescas ou em empresas que tenham impacto no solo, pastagens, florestas, recursos hídricos ou marítimos, precisa de estar em conformidade, nomeadamente, com as diretrizes voluntárias da FAO/CFS sobre a gestão responsável da posse da terra, pescas e florestas no contexto da segurança alimentar nacional e os princípios da FAO/CFS para o Investimento Responsável na Agricultura e Sistemas Alimentares; apoia o financiamento europeu para produtores e empresas agroalimentares, para que possam realizar os investimentos necessários para estarem em conformidade com os requisitos da Análise de Perigos e Pontos Críticos de Controlo, através da adoção de medidas para eliminar eventuais riscos para a segurança alimentar.

22.  Salienta que as cadeias de abastecimento curtas têm um grande potencial para colmatar as atuais deficiências do sistema alimentar e recorda que a agricultura respeitadora do clima implica, nomeadamente, reduzir a dependência face às energias fósseis, incluindo a utilização de pesticidas químicos e fertilizantes;

23.  Congratula-se com todas as iniciativas destinadas a implementar ou reforçar as políticas agrícolas a nível nacional ou regional e que tenham por objetivo garantir uma maior autossuficiência alimentar e defende a transição dos países em desenvolvimento no sentido de se tornarem mais autossuficientes, conferindo aos agricultores responsabilidade, propriedade e independência na criação de sistemas agroalimentares sustentáveis e de sistemas de produção mais autossuficientes; solicita que se concentrem os esforços no domínio da agricultura para salvaguardar o direito dos países em desenvolvimento à segurança alimentar, em complemento do direito à soberania alimentar(20), bem como para reforçar a sua capacidade de satisfazer as necessidades nutricionais das suas populações;

24.  Salienta a importância da proteção e da promoção do direito das comunidades locais ao acesso e ao controlo dos recursos naturais, como a terra e a água; lamenta que a apropriação ilegal de terras seja um problema generalizado em muitos países em desenvolvimento; salienta que se trata de uma prática brutal que compromete a segurança e a soberania alimentares - e ameaça as comunidades rurais;

25.  Observa que, por exemplo, os direitos de pastagem e o pastoreio coletivo são direitos tradicionais de uso da terra assentes no direito consuetudinário e não em direitos de propriedade formais; salienta, porém, a importância fundamental para as populações rurais de proteger estes direitos consuetudinários;

26.  Apela à atenuação das tensões sociais entre as populações agrícolas estabelecidas e as comunidades pastoris nómadas, nomeadamente nas regiões em que se verificam conflitos étnicos e religiosos concomitantes;

27.  Manifesta profunda preocupação com a elevada dependência dos países em desenvolvimento das importações de produtos alimentares, especialmente das provenientes da União Europeia, sobretudo quando essas importações são constituídas por produtos subsidiados, cujo preço baixo representa uma concorrência prejudicial para a agricultura local de minifúndio;

28.  Salienta a necessidade de proteger os direitos dos agricultores de manter os recursos genéticos para efeitos de segurança alimentar e adaptação às alterações climáticas; convida a Comissão, no âmbito das suas políticas de ajuda ao desenvolvimento, comércio e investimento, a apoiar sistemas agrícolas que estejam de acordo com as disposições do Tratado Internacional sobre os Recursos Fitogenéticos para a Alimentação e a Agricultura (ITPGRFA), que salvaguarda os direitos dos camponeses de manter, controlar, proteger e desenvolver as suas próprias sementes e conhecimentos tradicionais;

29.  Sublinha a necessidade de trabalhar de forma consistente com países, organizações internacionais e regionais do setor privado, agricultores e pequenos agricultores independentes, bem como com a sociedade civil local e as comunidades locais, de modo a apoiar a conceção, a aplicação e o acompanhamento de objetivos nutricionais nacionais específicos, exequíveis e sólidos; reconhece o papel chave da sociedade civil, especialmente em alcançar os pequenos agricultores, ligando-os à formação, recursos, mercados e cadeias de valor;

30.  Considera que dar prioridade às necessidades de nutrição materna e infantil é crucial para garantir uma segurança alimentar sólida e resistente e apela à Comissão e aos Estados-Membros para apoiarem as autoridades nacionais dos países em desenvolvimento na integração dos serviços de nutrição nos sistemas de saúde, a fim de abordar a desnutrição em todas as suas formas e assegurar a continuidade dos serviços de nutrição, particularmente a deteção precoce e a gestão comunitária da desnutrição aguda e da alimentação de lactentes e crianças pequenas, bem como os programas de nutrição materna relacionados; a este respeito congratula-se com as realizações e o trabalho do movimento SUN [do inglês Scaling Up Nutrition];

31.  Exorta a UE a proteger o acesso dos pequenos produtores à terra e outros recursos, incluindo as sementes dos agricultores, o acesso aos recursos hídricos, bem como o acesso às infraestruturas para ligar as comunidades rurais aos mercados territoriais, incluindo as áreas urbanas;

32.  Insta a UE a assegurar o financiamento adequado e a cocriação de conhecimentos e inovações técnicas através da investigação liderada pelos agricultores, incluindo o apoio a organizações de pequenos produtores e associações de mulheres e às suas atividades coletivas de transformação e comercialização;

33.  Convida a Comissão a estabelecer laços estreitos com os países parceiros com o objetivo de trocar informação e conhecimentos sobre práticas agrícolas; sublinha os conhecimento especializados do setor agrícola europeu e salienta a necessidade de dar prioridade às parcerias no domínio da investigação e da inovação na agricultura, nomeadamente através do Horizonte Europa, e de promover inovações responsáveis e éticas para promover práticas agrícolas sustentáveis, a fim de aumentar as colheitas e a produtividade das explorações; solicita, neste contexto, que se tenha mais em conta o contributo dos conhecimentos tradicionais locais para uma transição justa, especialmente no que diz respeito às práticas agrícolas, às pescas e à proteção das florestas, capacitando assim a população e as comunidades locais;

34.  Toma nota dos resultados positivos do apoio orçamental demonstrado pelo 6.º relatório intercalar sobre o Plano de Ação da UE em matéria de nutrição como um mecanismo para um investimento sustentável de maior impacto e relevante para o país no que respeita a nutrição;

35.  Insta a UE a integrar os objetivos mundiais e nacionais em matéria de nutrição nos programas de desenvolvimento e nas estratégias por país pertinentes; solicita à UE e aos seus Estados-Membros que mobilizem investimentos financeiros a longo prazo na segurança alimentar e nutricional e na agricultura, nas pescas e na aquacultura sustentáveis, de modo a encorajar os países parceiros a investir mais nestes setores por meio dos seus orçamentos nacionais;

36.  Insta a UE a dar prioridade à segurança alimentar, à proteção da biodiversidade e agricultura sustentável, nos seus programas de desenvolvimento internacional com os países parceiros, considerando as suas necessidades locais específicas, assegurando ao mesmo tempo o acesso ao financiamento para as comunidades locais e organizações que as apoiam; apela à UE e aos seus Estados-Membros para que avaliem e acompanhem, com a participação da sociedade civil, os seus investimentos, a fim de assegurar que estes combatem efetivamente a pobreza e a insegurança alimentar;

37.  Salienta o papel da UE enquanto facilitador da transformação dos sistemas alimentares mundiais, para que possam ser mais resilientes, sustentáveis e justos; sublinha que a Estratégia do Prado ao Prato é um quadro estratégico ambicioso da UE que promove um sistema agroalimentar da UE mais sustentável e resiliente e apoia uma transição global justa para sistemas agroalimentares sustentáveis que beneficiam as pessoas, a natureza e o crescimento económico e preservam os recursos naturais, em conformidade com os objetivos da Estratégia de Biodiversidade; recorda o objetivo da Estratégia do Prado ao Prato de reduzir a dependência dos agricultores da produção externa;

38.  Insta a UE e os seus Estados-Membros a permanecerem plenamente empenhados no seu compromisso internacional em matéria de clima e biodiversidade, no Pacto Ecológico e na Estratégia do Prado ao Prato, bem como a porem em prática, em conformidade, as recomendações do PIAC para se adaptarem às alterações climáticas, especialmente num contexto em que a crise pandémica e a guerra na Ucrânia tornaram evidente a vulnerabilidade à perturbação do mercado alimentar global;

39.  Exorta a Comissão a acelerar os esforços para ajudar os países parceiros a reduzir em 7 milhões, até 2025, o número de crianças de idade inferior a cinco anos que apresentam atrasos de crescimento, tal como se comprometeu a fazer no Plano de Ação da UE em matéria de nutrição;

40.  Exorta a União Europeia a continuar a apoiar os países parceiros a restabelecer a disponibilidade de uma alimentação diversificada e nutritiva para as crianças em idade escolar através de programas de refeições escolares, promovendo ao mesmo tempo os alimentos produzidos localmente e de forma sustentável e prestando especial atenção às crianças mais vulneráveis; salienta, além disso, a utilidade dos programas de contratação pública para promover o apoio público a aquisições de produtos alimentares de alta qualidade junto de pequenos agricultores e de produtores locais destinados a distribuição;

41.  Congratula-se com o apoio dado pela Comissão Europeia e por vários Estados-Membros à «School Meals Coalition» (coligação para a alimentação escolar) no seguimento da Cimeira sobre Sistemas Alimentares; assinala a importância de assegurar que as abordagens que têm em conta a nutrição estejam ligadas a intervenções no domínio da nutrição e a outras intervenções no domínio da saúde nos países em desenvolvimento;

42.  Recorda que até 811 milhões de pessoas no mundo passam fome e que cerca de 2 mil milhões de pessoas sofrem de subnutrição crónica, em especial na África Subsariana e na Ásia, carecendo de vitaminas e minerais importantes; recorda que estes efeitos são particularmente devastadores para as crianças nos seus primeiros 1 000 dias de vida, uma vez que, se forem privadas de micronutrientes essenciais como a vitamina A, o ferro ou o zinco, estes efeitos duram toda a vida, o que provoca uma redução do crescimento e uma diminuição das faculdades mentais, afetando não só nas pessoas, mas também em economias inteiras; sublinha que a fome e a subnutrição são, portanto, um dos maiores obstáculos ao desenvolvimento;

43.  Congratula-se com o compromisso assumido pela UE na Cimeira «Nutrição para o Crescimento» de investir 2,5 mil milhões de EUR durante o período de 2021-2024 na luta contra a malnutrição; insta a UE a dar provas de liderança na consecução deste objetivo;

44.  Observa que a pandemia de COVID-19 evidenciou as interligações entre a saúde humana, a saúde das plantas e dos animais, a saúde do ambiente e a segurança alimentar; salienta que as doenças que afetam os animais e as plantas continuam igualmente a perturbar a segurança alimentar, interrompendo o fornecimento de alimentos em todo o mundo; exorta a Comissão Europeia e os Estados-Membros a unirem esforços com a comunidade internacional em torno do princípio de «Uma Só Saúde» para redesenhar os sistemas alimentares, melhorar a sua resiliência e lograr uma melhor saúde e segurança alimentar para todos;

45.  Recorda que a investigação sugere que a transformação dos sistemas alimentares poderia libertar os 12 biliões de dólares americanos que o mundo gasta nos custos ocultos dos alimentos e que o redireccionamento de parte destes fundos poderia evitar futuros danos para o ambiente e a saúde das pessoas, e poderia, em vez disso, ajudar a reforçar os compromissos a favor do financiamento da adaptação, como solicitado pelos Estados-Membros e pelos líderes durante a COP 26 em Glasgow;

46.  Recorda que as alterações climáticas exercerão uma pressão cada vez maior sobre a produção e o acesso aos alimentos, especialmente nas regiões vulneráveis, comprometendo a segurança alimentar e a nutrição; destaca as conclusões do relatório de 2022 do PIAC, segundo as quais o aquecimento global enfraquecerá progressivamente a saúde dos solos e os serviços ecossistémicos como a polinização, aumentará a pressão causada pelas pragas e doenças e reduzirá a biomassa animal marinha, comprometendo assim a produtividade alimentar em muitas regiões em terra e nos oceanos; congratula-se com as suas recomendações para a adaptação às alterações climáticas através da promoção de princípios e práticas agroecológicos, da agrossilvicultura, da adaptação a nível comunitário, da gestão baseada nos ecossistemas nos setores da pescas e da aquacultura, bem como de outras abordagens assentes em processos naturais para reforçar a segurança alimentar, a nutrição, a saúde e os bem-estar;

Reforçar a resiliência a choques futuros

47.  Recorda que o reforço da resiliência deve ter em conta a crescente frequência e intensidade dos conflitos e das catástrofes naturais, nomeadamente as secas, os ciclones e as inundações, bem como as crises sanitárias, a perda da biodiversidade, as desigualdades estruturais e os choques económicos, que, muitas vezes, têm múltiplos impactos agravantes nos mais vulneráveis; sublinha que os investimentos estratégicos em práticas agrícolas sustentáveis podem desempenhar um papel fundamental para garantir sistemas agroalimentares mais resilientes e sustentáveis;

48.  Insta a UE a promover um financiamento previsível, específico e orientado para a ação preventiva e precoce com o objetivo de prevenir a insegurança alimentar, reduzir os seus impactos e aumentar a atenção e o financiamento para a adaptação e a resiliência geridas a nível local; exorta a UE a reforçar os programas de subsistência para apoiar a segurança alimentar e assegurar a capacidade das pessoas para gerar e manter os seus meios de vida, melhorar o seu próprio bem-estar, bem como o das gerações futuras; insta a UE a proteger o acesso e o controlo, por parte dos pequenos produtores, relativamente à terra e a outros recursos, incluindo as sementes dos camponeses, bem como às infraestruturas para ligar as comunidades rurais aos mercados territoriais, incluindo as zonas urbanas;

49.  Salienta que a segurança alimentar influencia positivamente a resiliência da população em geral e ajuda as pessoas a enfrentar com mais eficácia os choques, os eventos extremos e as crises prolongadas;

50.  Exorta a Comissão a rever os planos existentes em matéria de gestão de crises, nomeadamente no que respeita à produção alimentar;

51.  Salienta que as estratégias de adaptação às alterações climáticas devem ter como objetivo reduzir a perda e o desperdício de alimentos; recorda que os países menos desenvolvidos e os países de baixo rendimento apresentam um grande potencial de redução do desperdício alimentar através de um maior investimento em infraestruturas de armazenamento, embalagem e transporte; salienta a importância de aplicar a economia circular nos sistemas de produção agrícola, a fim de aumentar a sua sustentabilidade e eficiência em termos de utilização dos recursos e de diminuir o máximo possível as perdas e o desperdício de alimentos; exorta a Comissão Europeia e todos os Estados-Membros a criarem e porem em prática programas de prevenção do desperdício alimentar que incluam a promoção de cadeias de abastecimento alimentar curtas, que reduzem o risco de gerar desperdício de alimentos; salienta a importância de desenvolver e atualizar uma base de dados mundial, acessível pelas autoridades competentes, que mantenha registos das reservas de abastecimento, em especial das reservas de cereais, a fim de lançar as bases para um sistema que garanta, de forma contínua, um nível adequado de segurança alimentar e minimize o desperdício de alimentos;

52.  Sublinha que a segurança alimentar depende da consecução dos objetivos climáticos, da luta contra a perda da biodiversidade e da boa saúde dos ecossistemas terrestres, costeiros e marinhos e que, por conseguinte, a luta contra a poluição plástica e difusa é crucial;

53.  Salienta que a produção de biocombustíveis tem impacto na segurança alimentar, uma vez que desvia da produção de alimentos matérias-primas agrícolas como os cereais, a soja, o óleo de colza, o milho e a cana-de-açúcar; considera que garantir uma maior flexibilização e uma melhor coordenação das políticas em matéria de biocombustíveis a nível internacional é crucial para otimizar as utilizações alimentares, beneficiando ao mesmo tempo do potencial estabilizador desta oportunidade alternativa; exorta a UE a dar prioridade à produção de alimentos em detrimento da produção de biocombustíveis produzidos a partir de culturas alimentares, respeitando a hierarquia dos resíduos e tendo em conta o princípio da utilização em cascata, a fim de assegurar abastecimentos alimentares adicionais e estabilizar os mercados mundiais de produtos alimentares;

54.  Observa a importância das ligações estratégicas entre a África e a Europa, tirando partido dos progressos realizados na agenda de ação de transformação rural União Africana (UA)-UE; recorda a resolução do Parlamento Europeu, de 16 de setembro de 2020, sobre a cooperação UE‑África em matéria de segurança na região do Sael, na África Ocidental e no Corno de África, que recordava que a insegurança alimentar é, com frequência, uma das causas profundas do terrorismo e dos conflitos armados; apela, por conseguinte, à plena integração da abordagem assente no nexo entre a ajuda humanitária, o desenvolvimento e a consolidação da paz nas estratégias de segurança dos países terceiros, o que requer o apoio à prestação de serviços básicos, incluindo a segurança alimentar, com a participação das comunidades locais;

55.  Recorda que, até 2030, a iniciativa Grande Muralha Verde na região africana do Sahel pretende restaurar 100 milhões de hectares de terras atualmente degradadas, capturar 250 milhões de toneladas de carbono e criar 10 milhões de postos de trabalho nas zonas rurais, o que, em conjunto, deverá apoiar 15 dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, reduzir a pobreza e a fome, aumentar a resiliência local às alterações climáticas, melhorar a saúde e o bem-estar, criar postos de trabalho e impulsionar o crescimento económico;

56.  Convida a UE a alargar o apoio aos sistemas nacionais de proteção social, incluindo a assistência social baseada no dinheiro para responder a choques, a fim de combater as desigualdades em termos de rendimentos de uma forma que tenha em conta os riscos de conflitos e em conformidade com o princípio de «não prejudicar», e para proteger o acesso dos mais vulneráveis aos alimentos através do aumento do seu poder de compra;

57.  Apoia o estabelecimento de um mecanismo financeiro para ajudar os países africanos a colmatar o atual défice de financiamento para desenvolver urgentemente planos de proteção social, seja através do futuro Acelerador Global para o Emprego e a Proteção Social ou através da criação de um fundo mundial para a proteção social;

58.  Sublinha a importância de apoiar e promover a partilha de conhecimentos e a aprendizagem entre pares, seja entre agricultores ou entre empresas, nos domínios da produção, da transformação e da comercialização; chama a atenção para a importância que o setor agrícola e alimentar tem para a economia em termos de criação de oportunidades de emprego digno e sustentável nas zonas rurais; sublinha que, na maioria dos casos, se trata de pequenas explorações e de explorações agrícolas familiares; assinala a importância de promover e reforçar as medidas e as ferramentas destinadas a apoiar o aumento da qualidade dos produtos, a diversificação dos produtos, a modernização sustentável das práticas agrícolas, condições de trabalho seguras e medidas para reforçar a resiliência dos agricultores;

59.  Observa que as desigualdades de género limitam a produtividade agrícola e a eficiência e, por conseguinte, comprometem o desenvolvimento; relembra que a emancipação das mulheres e das raparigas é crucial para a nutrição, a preservação da saúde, a segurança alimentar e o reforço da resiliência; salienta que o reforço do papel das mulheres e das raparigas continua a constituir um desafio para a agricultura e para a segurança alimentar e nutricional; exorta a Comissão Europeia e os Estados-Membros a apoiarem o empreendedorismo, o emprego e a representação política das mulheres, a garantirem a inclusão da perspetiva de género na gestão da segurança alimentar e a assegurarem a participação das mulheres nos processos de tomada de decisão neste domínio, incluindo as mulheres pertencentes a minorias discriminadas;

60.  Insta a UE e os seus Estados-Membros a esforçarem-se, nomeadamente através da ajuda ao desenvolvimento, por ajudar a combater as discriminações com que as mulheres são confrontadas, nomeadamente no que respeita ao acesso das mulheres agricultoras à terra, aos recursos produtivos e aos serviços financeiros; recorda que em África, por exemplo, quase metade do trabalho agrícola em África é feito por mulheres, embora as mulheres agricultoras sejam, na sua maioria, pequenas agricultoras ou agricultoras de subsistência que não têm o acesso necessário à informação, ao crédito, à terra, aos recursos ou à tecnologia; incentiva a promoção dos direitos sucessórios das mulheres e das raparigas e insta a UE a apoiar os países parceiros, em particular no que diz respeito ao seu reconhecimento do pleno direito das mulheres aos direitos fundiários; insta a Comissão Europeia e os Estados-Membros a promoverem abordagens transformadoras do ponto de vista do género para a agricultura, a pesca e os sistemas alimentares através do reforço das capacidades das mulheres rurais, de reformas políticas específicas para dispor de leis mais justas sobre a posse da terra, bem como de iniciativas específicas centradas na emancipação económica e no acesso ao financiamento, tal como estabelecido no terceiro Plano de Ação da UE em matéria de igualdade de género;

61.  Observa que as mulheres rurais produzem mais de metade dos alimentos do mundo, apesar das desvantagens estruturais; salienta a urgência de melhorar o acesso e o controlo das mulheres rurais sobre a terra, os recursos produtivos, os ativos e os mercados como condição necessária para melhorar a segurança alimentar a nível mundial; insta a União Europeia a prestar especial atenção às mulheres rurais e ao seu empoderamento económico, social e político; recorda as diretrizes voluntárias do CSA para uma governação responsável dos regimes fundiários da terra como um bom instrumento para combater as barreiras nos sistemas de herança consuetudinários e tradicionais e assegurar um melhor conhecimento das mulheres sobre os seus direitos legais(21);

62.  Recorda a importância estratégica de investir na biodiversidade agrícola a nível da exploração, a fim de garantir uma alimentação saudável, de qualidade e diversificada, bem como a ingestão adequada de nutrientes; salienta, em particular, que as mulheres e raparigas têm mais probabilidades de conseguir uma alimentação minimamente diversificada e adequada em termos de micronutrientes através da diversificação agrícola e da produção de subsistência de diversas culturas alimentares(22);

63.  Salienta a importância da transformação rural e de reforçar as cadeias de valor locais e regionais, bem como de as tornar mais transparentes, a fim de criar empregos sustentáveis, evitar violações dos direitos humanos e atenuar as alterações climáticas; salienta a necessidade de apoiar os jovens e as mulheres, nomeadamente disponibilizando formação, acesso ao crédito e acesso os mercados; solicita que os jovens e as mulheres participem na formulação das políticas agrícolas e que seja prestado apoio à ação coletiva através de pequenas organizações de produtores;

64.  Recorda que, face à desnutrição, a educação e a sensibilização constituem um pré-requisito essencial para um estilo de vida sustentável e uma sociedade de sucesso;

65.  Congratula-se com o trabalho em curso do Comité da Segurança Alimentar Mundial sobre as suas diretrizes voluntárias para a igualdade de género e o empoderamento das mulheres e das raparigas no contexto da segurança alimentar e da nutrição;

66.  Recorda que as alterações climáticas e a perda de biodiversidade, entre outros fatores, ameaçam a nossa capacidade de garantir a segurança alimentar mundial e exercem uma pressão adicional sobre os sistemas alimentares já de si frágeis; apela a uma produção alimentar respeitadora do ambiente, nomeadamente a agroecologia e a adaptação resistente às alterações climáticas, bem como à conservação e recuperação dos ecossistemas naturais, a fim de reduzir os riscos climáticos, enfrentar a crise climática e travar a perda de biodiversidade, reforçando assim a resiliência dos sistemas agroalimentares sustentáveis; neste contexto, solicita à Comissão e aos Estados-Membros que apoiem os países parceiros na adoção de práticas agrícolas sustentáveis e de soluções inovadoras, incluindo a utilização das receitas obtidas com os leilões de licenças de emissão e os certificados CBAM para aumentar as suas capacidades de resiliência e adaptação às alterações climáticas, e de atenuação das mesmas, com o objetivo de disporem de sistemas alimentares mais sustentáveis;

67.  Insta a Comissão e os Estados-membros a assegurarem que o financiamento ao abrigo do novo IVCDCI inclua uma abordagem baseada nos direitos humanos que coloque as comunidades locais e os povos indígenas no centro dos esforços em matéria de clima, ambiente e desenvolvimento; considera importante prestar especial atenção aos pequenos agricultores que geralmente têm uma menor capacidade de adaptação aos efeitos das alterações climáticas; congratula-se, a este respeito, com o próximo plano de ação da ONU para alcançar uma cobertura universal dos serviços de alerta precoce contra fenómenos meteorológicos extremos e alterações climáticas nos próximos cinco anos, que será apresentado pela Organização Meteorológica Mundial durante a Conferência das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas (COP 27) no Egipto; recorda que o Enviado Especial para a Cimeira das Nações Unidas sobre Sistemas Alimentares sublinhou a intersecção entre o clima e a alimentação como sendo profunda;

68.  Exorta a Comissão a prestar apoio aos países em desenvolvimento, a fim de desenvolver e salvaguardar as suas indústrias sensíveis e emergentes, de promover a segurança alimentar, de apoiar a atenuação das alterações climáticas para a agricultura e de satisfazer as normas de sustentabilidade da UE e internacionais para a exportação dos seus produtos agrícolas;

69.  Considera que é importante ajudar os países em desenvolvimento a adotarem políticas públicas no domínio da agricultura e da alimentação que possam satisfazer as necessidades das suas populações em rápido crescimento; salienta que uma política de segurança alimentar deve ter como objetivo principal fornecer aos seus cidadãos alimentos suficientes, nutritivos, seguros e a preços acessíveis ao longo do ano de forma sustentável, garantindo ao mesmo tempo um rendimento e um nível de vida justos para os agricultores; observa que, ao longo da história da política agrícola comum, o levantamento dos subsídios à exportação e a dissociação dos pagamentos diretos reduziram significativamente o risco de práticas de dumping nos mercados dos países terceiros; convida a Comissão e os Estados-Membros a proporcionarem mais apoio ao desenvolvimento agrícola capaz de garantir a segurança alimentar nos países em desenvolvimento e a aumentarem de forma decisiva o seu investimento no desenvolvimento rural territorial;

70.  Realça que os sistemas alimentares são importantes motores das emissões de GEE; observa que o reforço da resiliência climática dos sistemas alimentares necessitará da integração da adaptação às alterações climáticas e da redução e gestão dos riscos de catástrofes nas políticas a curto, médio e longo prazo; exorta a Comissão e os Estados-Membros a acompanharem os países em desenvolvimento neste processo;

71.  Insta a UE a proteger o acesso e controlo dos pequenos agricultores à terra e a outros recursos, incluindo sementes, infraestruturas e água;

72.  Apela à UE para que assegure contratos públicos que privilegiem a produção agroecológica local, regras de segurança alimentar adequadas à produção em pequena escala, a proteção dos mercados internos contra importações a baixo preço, bem como a educação dos consumidores e a proteção social para aumentar o consumo de alimentos locais nutritivos;

73.  Insta a UE a adaptar a sua programação no âmbito do Instrumento de Vizinhança, de Cooperação para o Desenvolvimento e de Cooperação Internacional – Europa Global, de modo a apoiar ativamente uma transformação mundial a favor de sistemas alimentares sustentáveis passíveis de proporcionar uma alimentação saudável e nutritiva a preços acessíveis, que sejam justos, resilientes, baseados em direitos e sustentáveis do ponto de vista ambiental, que tenham em particular atenção as necessidades das mulheres e que reduzam a pressão da produção alimentar sobre a utilização dos solos e dos recursos hídricos;

74.  Sublinha que os efeitos das alterações climáticas têm um impacto negativo crítico na segurança alimentar nos países em desenvolvimento e que a adaptação às alterações climáticas é essencial para assegurar sistemas alimentares resilientes e sustentáveis; lamenta a violação do compromisso assumido pelos países desenvolvidos no Acordo de Copenhaga de 2009 no sentido de fornecer um financiamento previsível e adequado para a ação climática nos países em desenvolvimento, especialmente para as necessidades de adaptação, que deveria ter atingido os 100 mil milhões de dólares em 2020; exorta a UE a aumentar o financiamento das medidas contra as alterações climáticas para além do quadro do IVCDCI – Europa Global, nomeadamente através de uma utilização ambiciosa das receitas obtidas com os leilões de licenças de emissão e os certificados CBAM;

75.  Insta a Comissão a apoiar a transição agroecológica nos países parceiros a fim de garantir alimentos nutritivos, seguros, diversificados e a preços acessíveis para todos ao longo do ano, preservando a biodiversidade, aumentando a resiliência climática e reforçando a coesão social através da redução das desigualdades sociais; exorta a Comissão a apoiar o desenvolvimento de redes alimentares locais com vista a garantir produção e consumo locais, que promovam a criação de postos de trabalho locais, garantam preços justos para produtores e consumidores, diminuam a dependência dos países em relação às importações e reduzam a sua vulnerabilidade face a flutuações de preços no mercado internacional;

76.  Salienta que os investimentos e as ações da UE devem basear-se em avaliações prévias rigorosas, transparência total e na inclusão dos intervenientes afetados pelos investimentos e ações, incluindo organizações da sociedade civil, a fim de desenvolver ações equitativas e reforçar as capacidades a nível nacional e local, incluindo dos intervenientes não estatais; insiste em reconhecer a necessidade de medidas adaptadas ao contexto para alcançar sistemas agrícolas e alimentares mais sustentáveis nos países parceiros;

77.  Apela à revisão do plano de ação da UE em matéria de nutrição para que sejam abordadas todas as formas de desnutrição em contextos humanitários e de desenvolvimento, respetivamente, e incluídos novos compromissos políticos e financeiros ambiciosos;

78.  Observa que 45 milhões de crianças com menos de cinco anos sofrem de emaciação, que é definida como peso baixo para a estatura, devido a desnutrição aguda nos primeiros anos de vida; recorda que o excesso de peso e a obesidade entre adultos, adolescentes e crianças estão a aumentar para níveis nunca antes vistos, afetando 2 mil milhões de pessoas a nível mundial, 70 % das quais vivem em países de baixo e médio rendimento; recorda que o excesso de peso e a obesidade estão associados a um risco de doenças relacionadas com a alimentação, incluindo doenças não transmissíveis, uma vez que a desnutrição é um desafio para todas as nações, independentemente da sua fase de desenvolvimento; por conseguinte, muitos países enfrentam atualmente um «duplo fardo» de, pelo menos, dois tipos de desnutrição, onde a subnutrição e o excesso de peso e a obesidade coexistem; convida a Comissão Europeia a rever o quadro político de 2010 para a segurança alimentar e o quadro político de 2013 para a nutrição, tal como solicitado pelos Estados-Membros da UE nas conclusões do Conselho de 2018 sobre o fortalecimento da segurança alimentar e nutricional mundial;

79.  Insta a Comissão a assegurar que a nutrição seja plenamente tida em conta sempre que a UE investir na agricultura, no desenvolvimento económico, na proteção do clima e na adaptação às alterações climáticas, na proteção da saúde, na saúde e noutros setores; apoia a revisão da estratégia global em matéria de saúde de 2010 e apela à inclusão da luta contra a desnutrição no documento revisto; apela a um maior apoio financeiro para construir sistemas de saúde fortes e resilientes, a fim de quebrar o círculo vicioso intergeracional da desnutrição e da subnutrição;

Uma resposta complementar da UE em matéria de política humanitária e de desenvolvimento

80.  Insiste na intensificação da assistência humanitária aos países que enfrentam crises alimentares ou que são afetados por conflitos; observa que a comunidade internacional, incluindo a União Europeia, deve procurar reduzir o fosso crescente entre as necessidades humanitárias e os recursos disponíveis a nível mundial; condena quaisquer ações em que o acesso aos alimentos seja utilizado como instrumento de opressão ou arma de guerra e recorda os quatro princípios humanitários: humanidade, neutralidade, imparcialidade e independência;

81.  Sublinha que a ajuda humanitária pode ser mobilizada para fazer face a situações de perigo imediato para a vida quando as capacidades existentes sejam ultrapassadas, embora se devam procurar simultaneamente soluções financiadas por outros tipos de ajuda para prevenir e enfrentar as causas de insegurança alimentar e de subnutrição;

82.  Congratula-se com a celebração do primeiro Fórum Humanitário Europeu para aumentar ainda mais o impacto da resposta humanitária e assegurar a eficácia e eficiência na prestação da ajuda e celebra a decisão de o tornar um evento anual no calendário humanitário; sublinha a importância de trabalhar em conjunto como uma Equipa Europa no sentido de fazer face à crise humanitária mundial de segurança alimentar;

83.  Exorta os governos dos Estados-Membros da UE a prevenir diplomaticamente os conflitos, a erradicar todas as formas de desnutrição e a investir mais na prevenção de conflitos com particular incidência nas mulheres e nas raparigas, aplicando ao mesmo tempo a Resolução 1325 do Conselho de Segurança das Nações Unidas; recorda que a ajuda humanitária deve ser isenta de sanções internacionais; salienta a necessidade de encontrar soluções sustentáveis a médio e longo prazo no que respeita à cooperação para o desenvolvimento, a fim de combater as causas profundas da insegurança alimentar;

84.  Recorda que a Ucrânia e a Rússia representam aproximadamente 30 % do comércio mundial de trigo, 32 % de cevada, 17 % de milho, mais de 50 % de óleo de sementes de girassol e 20 % de sementes de girassol; salienta que a redução ou perda das exportações ucranianas afetará países fortemente dependentes da sua produção, incluindo países já em situação de insegurança alimentar que são vulneráveis a choques de abastecimento e a aumentos de preços, como no caso de África; insta a Comissão e os Estados-Membros a avaliarem urgentemente, em coordenação com os seus parceiros internacionais e as instituições internacionais competentes, todos os meios disponíveis para evitar um incumprimento na balança de pagamentos dos países importadores de produtos alimentares, incluindo financiamentos diretos e a reestruturação das suas dívidas; salienta a importância de dar prioridade ao financiamento baseado em subvenções como opção predefinida, sobretudo para os países menos desenvolvidos;

85.  Apoia o trabalho em curso para correlacionar ajuda humanitária, desenvolvimento e consolidação da paz; sublinha que este princípio deve continuar a ser incluído na assistência humanitária, bem como na programação para a segurança alimentar e a nutrição, apoiada por orientações claras sobre boas práticas comprovadas;

86.  Congratula-se com o trabalho da UE e das agências da ONU sedeadas em Roma, designadamente a FAO, o PAM e o FIDA, no sentido de prosseguir uma ação de antecipação para prevenir crises antes que elas se desenvolvam e proteger os grupos mais vulneráveis de catástrofes climáticas e provocadas pelo Homem; apela ao reforço dos mecanismos de coordenação com os intervenientes locais no terreno e à procura de maiores interligações entre ações de antecipação a curto prazo e programas governamentais a mais longo prazo; recorda que as ações de antecipação inclusivas devem ser específicas do contexto e conduzidas localmente e assegurar que os mais vulneráveis tenham também uma voz ao nível da tomada de decisões para abordar as suas necessidades específicas;

87.  Apoia o papel ativo desempenhado pela UE na Rede Mundial contra as Crises Alimentares e apela a que esta rede continue operacional, especialmente em contextos regionais e nacionais; insta os Estados-Membros a reforçarem a Rede Mundial contra as Crises Alimentares no seu trabalho de resposta às crises alimentares, através de intervenções multifacetadas e multissetoriais, do reforço da capacidade de resiliência e aquisição de conhecimentos e da aplicação da ligação entre ajuda humanitária, desenvolvimento e consolidação da paz; neste contexto, exorta a Comissão Europeia e os Estados-Membros a trabalharem com os países em desenvolvimento na conceção e aplicação de políticas e estratégias inovadoras conduzidas pelos países para combater a insegurança alimentar, impulsionar a inclusão económica e alcançar sistemas alimentares mais sustentáveis;

88.  Apela à necessidade de melhorar os sistemas de alerta precoce, os protocolos de intervenção rápida e os mecanismos de fiscalização, a fim de assegurar respostas suficientemente atempadas para atenuar o impacto de eventuais perigos na segurança alimentar e passar de intervenções reativas para intervenções pró-ativas de salvamento de vidas através de ações humanitárias de antecipação; apoia o Comité da Segurança Alimentar enquanto principal plataforma política internacional e intergovernamental inclusiva em matéria de segurança alimentar e nutrição;

89.  Insta a Comissão a assegurar uma abordagem multissetorial da nutrição e a dar prioridade à integração da segurança alimentar e da nutrição nas ações nos domínios da saúde, da educação, da água, do saneamento e da higiene, a fim de assegurar que pelo menos 20 % da ajuda pública ao desenvolvimento ao abrigo do Instrumento de Vizinhança, de Cooperação para o Desenvolvimento e de Cooperação Internacional – Europa Global se destine à inclusão social e ao desenvolvimento humano;

90.  Apela à integração da nutrição na cobertura universal de saúde, uma vez que é fundamental para acabar com a desnutrição e a cobertura universal de saúde não será alcançada a menos que as ações essenciais de nutrição sejam efetivamente integradas como serviços essenciais de saúde e consideradas prioritárias nos sistemas de saúde; recorda que a cobertura universal de saúde é fundamental para as pessoas ao longo da sua vida, com especial destaque para os mais desfavorecidos e marginalizados, e deve ser adaptada às necessidades de saúde da população; recorda que pode ser apoiada assegurando uma alimentação ótima e segura para os lactentes e as crianças pequenas, incluindo através da amamentação, procurando assegurar uma alimentação equilibrada e saudável, nomeadamente através das refeições escolares, proporcionando educação nutricional qualificada e aconselhamento para as mudanças de comportamento conexas, colocando a nutrição no orçamento do setor da saúde, desenvolvendo sistemas de informações sobre saúde, com vista a tomar medidas atempadas, e promovendo o acesso a produtos eficazes e a preços acessíveis relacionados com a nutrição, reduzindo ao mesmo tempo a comercialização de alimentos não saudáveis;

91.  Reconhece que a nutrição deve estar no centro das estratégias, dos planos e dos orçamentos dos sistemas de saúde, a fim de alcançar a cobertura universal de saúde; apela a um maior apoio financeiro à saúde, com vista à criação de sistemas de saúde sólidos e resilientes para quebrar o círculo vicioso intergeracional da subnutrição e para prevenir e responder às crises de saúde; apoia a integração do tratamento da subnutrição e dos serviços de prevenção, bem como das intervenções em matéria de saúde, nomeadamente o planeamento familiar, a saúde mental e os cuidados pré e pós-natais nos pacotes de cuidados essenciais dos sistemas de saúde nacionais para alcançar a cobertura universal de saúde;

92.  Observa que a segurança alimentar está estreitamente relacionada com o acesso à água; solicita, por conseguinte, à Comissão Europeia que integre o direito à água e o desenvolvimento de infraestruturas de abastecimento de água e saneamento nas suas medidas de segurança alimentar nos países em desenvolvimento;

93.  Observa que a biodiversidade alimentar e agrícola aumenta a resistência aos choques e facilita a adaptação, mantém a estabilidade e apoia a recuperação; relembra que a capacidade da agroecologia de conciliar as dimensões económica, ambiental e social da sustentabilidade foi amplamente reconhecida em relatórios de referência publicados pelo PIAC e pelo IPBES, designadamente na Avaliação Internacional da Ciência e da Tecnologia Agrícolas para o Desenvolvimento (IAASTD) conduzida pelo Banco Mundial e pela FAO; salienta a importância de – tanto nas políticas nacionais como nos fóruns internacionais – promover a agroecologia, a agrossilvicultura, a produção local e os sistemas alimentares sustentáveis, centrados no desenvolvimento de cadeias de abastecimento curtas, a fim de garantir a segurança alimentar e nutricional para todos, bem como de aumentar a produtividade sustentável do setor agrícola e a sua resiliência às alterações climáticas;

94.  Insta a Comissão a apoiar os países parceiros no desenvolvimento de práticas agrícolas sustentáveis, incluindo a agroecologia, com o objetivo de aumentar a fertilidade dos solos, maximizar a biodiversidade e melhorar a eficiência da utilização da água como elementos-chave para uma melhor segurança alimentar; regista os desafios colocados pelas alterações climáticas e a perda de biodiversidade e os seus impactos adversos na segurança alimentar e nutricional, bem como a necessidade de disponibilizar os recursos necessários para a adaptação às alterações climáticas e atenuação das mesmas;

95.  Observa que existem muitas abordagens agronómicas e agroecológicas que podem beneficiar outros climas e situações, como a mistura de culturas, as «policulturas» e a agrossilvicultura, incluindo a utilização de árvores leguminosas, que são especialmente adequadas para proporcionar sombra e proteção a outras culturas e animais, bem como para melhorar e/ou aumentar a reciclagem e/ou a retenção de água;

96.  Salienta que a destruição das florestas tropicais resulta numa perda irreversível de biodiversidade e de sumidouros de carbono, bem como das casas e dos modos de vida das comunidades indígenas que vivem nas florestas; recorda que as florestas contribuem significativamente para alcançar as metas em matéria de clima, proteger a biodiversidade e prevenir a desertificação e a erosão extrema dos solos; considera que é necessário intensificar os esforços de conservação centrados, por exemplo, nas florestas, na vida selvagem e nos ecossistemas marinhos e costeiros, recorrendo a quadros regulamentares, recursos suficientes e dados científicos e acompanhados de ações de recuperação e gestão dos ecossistemas;

97.  Solicita que se tenha em conta a ligação entre a saúde pública e a biodiversidade, em conformidade com a abordagem «Uma Só Saúde»; exorta a UE e todos os países parceiros a reconhecerem e protegerem os direitos dos povos indígenas à propriedade e ao controlo consuetudinários das suas terras e dos seus recursos naturais – tal como estabelecido na Declaração das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas e na Convenção n.º 169 da Organização Internacional do Trabalho – e a respeitarem o princípio do consentimento livre, prévio e informado;

98.  Recorda que as práticas insustentáveis de intensificação da agricultura são as principais causas da degradação da biodiversidade em todo o mundo, incluindo a erosão genética das variedades de culturas e de efetivos pecuários; recorda que a estratégia «do prado ao prato» visa reduzir gradualmente, até 2030, a utilização e o risco global dos pesticidas químicos e perigosos da agricultura e promover práticas alternativas; salienta que os países pobres são os destinatários de uma parte importante de substâncias perigosas; congratula-se, por conseguinte, com a intenção da Comissão de apresentar uma proposta para acabar com essa prática no âmbito da Estratégia da UE para a Sustentabilidade dos Produtos Químicos; exorta, contudo, a Comissão a promover a procura por alternativas sustentáveis e a preços acessíveis à utilização desses pesticidas, a fim de evitar perturbações graves da segurança alimentar nos países em desenvolvimento, o que agravaria a fome entre as populações mais vulneráveis; solicita medidas de apoio específicas em matéria de educação e formação sobre as abordagens sustentáveis de proteção fitossanitária e as alternativas aos pesticidas, bem como a minimização da exposição às substâncias perigosas;

99.  Denuncia a dualidade de critérios da União em relação aos pesticidas, uma vez que permite a exportação de substâncias perigosas cuja utilização está proibida na UE; sublinha que a utilização de alguns pesticidas na agricultura intensiva nos países em desenvolvimento tem impacto na saúde dos trabalhadores, para além de causar danos ambientais; solicita que seja disponibilizada educação e formação sobre proteção fitossanitária sustentável e práticas agroecológicas e orgânicas;

100.  Recorda que, segundo relatórios recentes, os sistemas alimentares são atualmente responsáveis por até um terço das emissões de gases com efeito de estufa e até 80 % da perda de biodiversidade e utilizam até 70 % da água doce; sublinha, contudo, que os sistemas de produção alimentar sustentável devem ser reconhecidos como uma solução essencial para estes desafios existentes e que é possível alimentar uma população mundial em crescimento, protegendo ao mesmo tempo o nosso planeta;

101.  Insta a UE a cumprir ativamente os compromissos do Ano de Ação para a Nutrição 2021, nomeadamente os decorrentes da Cimeira das Nações Unidas sobre os Sistemas Alimentares e da Cimeira «Nutrição para o Crescimento» e a desempenhar um papel central na cooperação com as comunidades indígenas nestes esforços, em conformidade com a sua própria Estratégia do Prado ao Prato; congratula-se com a decisão da Comissão Europeia de ser um parceiro importante em oito coligações da Cimeira das Nações Unidas sobre Sistemas Alimentares;

102.  Solicita à Comissão e aos Estados-Membros que colaborem com a União Africana no sentido de assegurar um maior empenho e investimentos para fazer face aos atuais desafios nutricionais na região e para apoiar o Ano da Nutrição da União Africana: «Reforço da resiliência em matéria de nutrição e segurança alimentar no continente africano: reforço dos sistemas agroalimentares, de saúde e de proteção social com vista à aceleração do desenvolvimento do capital humano, social e económico»;

103.  Sublinha que as tecnologias digitais e a agricultura inteligente e de precisão oferecem oportunidades consideráveis para o desenvolvimento de sistemas agroalimentares sustentáveis e para fomentar o crescimento económico justo e inclusivo nas zonas rurais dos países em desenvolvimento;

104.  Chama a atenção para a necessidade de melhorar a segurança alimentar e a nutrição nos países em desenvolvimento através de uma abordagem holística e sustentável dos sistemas alimentares; insta a Comissão a adotar uma estratégia multilateral inclusiva baseada em direitos; exorta a Comissão Europeia a assegurar que os investimentos da UE na agricultura, no desenvolvimento económico, na adaptação às alterações climáticas e atenuação das mesmas, na água, saneamento e higiene, na saúde e em outros setores tenham plenamente em conta a nutrição, incorporando resultados mensuráveis em matéria de nutrição na fase de planeamento;

105.  Salienta a necessidade de a UE defender os direitos humanos e o direito a uma alimentação adequada enquanto princípio central e prioridade dos sistemas alimentares, bem com garantir o direito de acesso que assiste às pessoas mais marginalizadas a alimentos nutritivos, e reconhece a importância de aplicar a Declaração das Nações Unidas sobre os direitos dos camponeses e outras pessoas que trabalham nas zonas rurais;

106.  Apoia o desenvolvimento de oportunidades de comércio entre a UE e os países em desenvolvimento, que têm potencial para reforçar a agricultura local; recorda que os agricultores familiares e os pequenos agricultores demonstraram a sua capacidade de fornecer produtos diversificados e de aumentar a produção alimentar de forma sustentável;

107.  Salienta a necessidade de reconhecer o papel de liderança dos agricultores, das organizações de produtores e dos seus representantes nas estratégias de reforço da segurança alimentar e sublinha que deve ser apoiada a criação de cooperativas e de agrupamentos de produtores nos países em desenvolvimento, a fim de reforçar a sua capacidade coletiva de se organizarem mais eficazmente e de beneficiarem de uma melhor posição nas cadeias alimentares, bem como da partilha do valor acrescentado dos produtos de exportação;

108.  Salienta que a liberalização do comércio poderia ter um impacto na desflorestação, nas alterações climáticas e na perda de biodiversidade, bem como na produção de alimentos e no acesso aos alimentos; considera que a política comercial e de investimento da UE em relação aos países em desenvolvimento deve basear-se numa política comercial que privilegia a defesa das florestas e da biodiversidade e o desenvolvimento da agricultura local e dos produtores e agricultores locais, a fim de promover a plena soberania alimentar e reduzir o fenómeno da usurpação de terras e da desflorestação para fins de exportação agrícola;

109.  Considera que a União e os Estados-Membros devem incentivar as várias iniciativas de «comércio equitativo» e integrar os objetivos ambientais e sociais de forma abrangente e holística nas disposições de todos os acordos comerciais;

110.  Recorda que a diversidade de sementes é vital para reforçar a resiliência da agricultura às alterações climáticas; recorda que se estima que as sementes produzidas nas próprias explorações representem mais de 80 % das necessidades totais de sementes de alguns países africanos; em conformidade, solicita que a UE apoie regimes de direitos de propriedade intelectual em acordos comerciais que promovam o desenvolvimento de variedades de sementes adaptadas localmente e de sementes produzidas nas próprias explorações, mas que se abstenha de influenciar a reforma da lei das sementes, nomeadamente em África, através da aplicação de disposições da Convenção UPOV de 1991, na medida em que sejam incompatíveis com as disposições do Tratado Internacional sobre os Recursos Fitogenéticos para a Alimentação e a Agricultura;

111.  Sublinha que os produtos da pesca e da aquicultura são alguns dos alimentos mais saudáveis e com menor impacto no ambiente natural; salienta que podem ajudar a alcançar vários ODS, especialmente o objetivo 2, de «Erradicar a fome»; solicita, por conseguinte, à Comissão que integre os produtos da pesca e da aquicultura ao adotar estratégias de segurança alimentar, incluindo para os países em desenvolvimento;

112.  Incentiva a UE a continuar a trabalhar no sentido da conclusão das negociações multilaterais sobre subsídios à pesca na Organização Mundial do Comércio, implementando o Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 14.6, de «proibir subsídios à pesca que contribuem para a sobrecapacidade e a sobrepesca», a eliminar os subsídios que contribuem para a pesca INN e a abster-se de introduzir novos subsídios deste tipo, em total coerência com os objetivos estabelecidos no Pacto Ecológico Europeu, no 8.º Programa de Ação em matéria de Ambiente e no Acordo de Paris;

113.  Solicita que a dimensão global da Estratégia de Biodiversidade apoie o direito a alimentação adequada, implemente a Declaração das Nações Unidas sobre os direitos dos camponeses e outras pessoas que trabalham nas zonas rurais, para abordar medidas destinadas a melhorar em todo o mundo as condições de trabalho dos trabalhadores agrícolas e os rendimentos dos pequenos agricultores que fazem parte das cadeias de abastecimento alimentar a nível mundial, e para assegurar que o princípio da precaução é incluído em todos os requisitos de segurança alimentar; insta ainda a UE a alinhar a sua política comercial com os objetivos das estratégias «do prado ao prato» e de biodiversidade, bem como com o objetivo de neutralidade carbónica do Pacto Ecológico Europeu;

114.  Salienta que, para que os objetivos de sustentabilidade sejam alcançados, é indispensável que os países terceiros que atuam na cena mundial também contribuam;

115.  Sublinha o valor dos alimentos, que devem ser entendidos não só como muito mais do que simples mercadorias, mas como um direito das pessoas que deve ser realizado, e saliente que o impacto económico, social e ambiental, bem como as externalidades devem ser mais bem avaliados e atenuados ou alavancados, conforme necessário;

116.  Apela a uma ação reforçada a nível internacional para assegurar que a tomada de decisões políticas tenha a segurança alimentar no seu centro, a fim de evitar a escassez e garantir a segurança nutricional nos países mais vulneráveis;

117.  Apela à prossecução dos esforços para assegurar a coerência das políticas da UE, em conformidade com o princípio da coerência das políticas para o desenvolvimento sustentável; exorta a que se assegure que as exportações europeias não prejudiquem o desenvolvimento da produção local e dos mercados locais; salienta que os acordos de comércio livre da UE não devem perturbar a agricultura local, prejudicar os pequenos agricultores ou agravar a dependência de importações de produtos alimentares; solicita apoio à produção e ao consumo locais, que podem garantir a criação de emprego local, preços justos e a proteção da saúde e da segurança dos trabalhadores e reduzir a dependência dos países em relação às importações e a sua vulnerabilidade às flutuações internacionais dos preços;

118.  Refere que são necessárias orientações claras sobre como alcançar coerência nas políticas para o desenvolvimento a nível da UE, ao mesmo tempo que se resolve a questão dos objetivos políticos potencialmente contraditórios; insta a UE a garantir a coerência das políticas agrícolas e comerciais europeias para apoiar a segurança alimentar e a soberania alimentar, bem como para proteger os mercados locais e regionais;

o
o   o

119.  Encarrega a sua Presidente de transmitir a presente resolução ao Conselho e à Comissão.

(1) JO L 209 de 14.6.2021, p. 1.
(2) JO L 163 de 2.7.1996, p. 1.
(3) Textos Aprovados, P9_TA(2021)0505.
(4) https://www.europarl.europa.eu/doceo/document/TA-9-2022-0073_PT.html
(5) JO C 289 de 9.8.2016, p. 71.
(6) JO C 86 de 6.3.2018, p. 10.
(7) JO C 215 de 19.6.2018, p. 10.
(8) Textos Aprovados, P9_TA(2022)0099.
(9) JO C 25 de 30.1.2008, p. 1.
(10) «The State of World Fisheries and Aquaculture» [A situação mundial das pescas e da aquicultura], relatório de 2020 da FAO, https://www.fao.org/3/ca9231en/CA9231EN.pdf
(11) Relatório do ateliê copatrocinado pela IPBES e pelo PIAC sobre a biodiversidade e as alterações climáticas.
(12) «The State of Food Security and Nutrition in the World» [A segurança alimentar e a nutrição no mundo], relatório de 2021.
(13) Relatório Global sobre Crises Alimentares de 2021, atualizado em setembro.
(14) Orientações Facultativas para apoiar a concretização progressiva do direito a uma alimentação adequada no contexto da segurança alimentar nacional.
(15) «The State of Food Security and Nutrition in the World» (A segurança alimentar e a nutrição no mundo), relatório de 2021: https://www.fao.org/3/cb4474en/cb4474en.pdf
(16) «The State of Food Security and Nutrition in the World» (A segurança alimentar e a nutrição no mundo), relatório de 2021.
(17) Estimativas conjuntas da UNICEF, da Organização Mundial da Saúde e do Banco Mundial sobre a malnutrição infantil, «Levels and trends in child malnutrition» (Níveis e tendências da malnutrição infantil), 2021.
(18) «The State of World Fisheries and Aquaculture» [A situação mundial das pescas e da aquicultura], relatório de 2020 da FAO, https://www.fao.org/3/ca9231en/CA9231EN.pdf
(19) Relatório Global sobre Crises Alimentares de 2021.
(20) A soberania alimentar definida pela organização internacional Via Campesina como sendo o direito dos povos a alimentos saudáveis e culturalmente apropriados produzidos através de métodos ecologicamente corretos e sustentáveis, e o seu direito a definir os seus próprios sistemas alimentares e agrícolas. A segurança alimentar, segundo definição do Comité de Segurança Alimentar Mundial das Nações Unidas, existe quando todas as pessoas, em qualquer momento, têm acesso físico e económico a alimentos suficientes, seguros e nutritivos para satisfazer as suas necessidades alimentares e preferências alimentares necessários a uma vida ativa e saudável.
(21) https://www.oxfam.org/en/empowering-women-farmers-end-hunger-and-poverty
(22) Andrew D. Jones, Hilary Creed-Kanashiro, Karl S. Zimmerer, Stef de Haan, Miluska Carrasco, Krysty Meza, Gisella S. Cruz-Garcia, Milka Tello, Franklin Plasencia Amaya, R. Margot Marin, e Lizette Ganoza. 2018. «Farm-level agricultural biodiversity in the Peruvian Andes is associated with greater odds of women achieving a minimally diverse and micronutrient adequate diet» [A biodiversidade agrícola a nível da exploração nos Andes peruanos está associada a maiores probabilidades de as mulheres conseguirem uma alimentação minimamente diversificada e adequada em termos de micronutrientes]. Journal of Nutrition 148(10): 1625-1637.

Última actualização: 7 de Dezembro de 2022Aviso legal - Política de privacidade