O financiamento da PAC

O financiamento da política agrícola comum foi tradicionalmente assegurado por um único fundo, o Fundo Europeu de Orientação e de Garantia Agrícola, (FEOGA), substituído em 1 de janeiro de 2007 pelo Fundo Europeu Agrícola de Garantia (FEAGA) e pelo Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER).

Base jurídica

Artigo 40.º, n.º 3, do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia (TFUE);

Regulamentos (UE) n.º 1306/2013 e Regulamento (UE, Euratom) n.º 1311/2013 (JO L 347 de 20.12.2013).

Evolução do Quadro Financeiro Agrícola

Criada em janeiro de 1962, a política agrícola comum (PAC) estava organizada em torno do FEOGA. Em 1964, este dividiu-se em duas secções, a saber, a secção «Garantia» e a secção «Orientação», regidas por regras diferentes.

  • A secção «Garantia», de longe a mais importante, tinha por objeto o financiamento das despesas decorrentes da aplicação da política dos mercados e dos preços. Estas despesas caracterizam-se pela sua imprevisibilidade e, por conseguinte, são objeto de adaptações que visam ajustar as previsões de dotações às necessidades reais, através de orçamentos retificativos. Regra geral, o FEOGA-Garantia financiava integralmente as medidas de intervenção nos mercados.
  • A secção «Orientação» contribuía para o financiamento das operações da política estrutural e do desenvolvimento das zonas rurais. Ao contrário do FEOGA-Garantia, o FEOGA-Orientação assentava no princípio do cofinanciamento.

Desde 1988, para travar o aumento das despesas da PAC, as suas dotações são submetidas a uma disciplina orçamental rígida, através da instauração de uma linha diretriz agrícola de caráter plurianual (Decisão 88/377/CEE, completada pelo Acordo Interinstitucional de 22 de junho de 1988, no âmbito do pacote «Delors I») (ver ficha 1.4.3).

Após o Tratado de Maastricht e o Conselho Europeu de Edimburgo (dezembro de 1992), o quadro financeiro foi reformulado (pacote «Delors II»). O Acordo Interinstitucional de 1988 deu lugar a um novo acordo de disciplina orçamental para o período 1993-1999 (JO C 331 de 7.12.1993). Por seu turno, a Decisão 88/377/CEE deu lugar à Decisão 94/729/CE (JO L 293 de 12.11.1994), que confirmou o princípio segundo o qual a disciplina financeira se aplicaria ao conjunto das políticas comuns. A Agenda 2000 (ver ficha 3.2.4) retomou a linha diretriz agrícola nas perspetivas financeiras 2000-2006 (JO C 172 de 18.6.1999). Paralelamente, as modalidades de financiamento da PAC foram definidas pelo novo Regulamento (CE) n.º 1258/1999 (JO L 160 de 26.6.1999, p. 103).

O Quadro Financeiro Plurianual para o período 2007-2013 foi aprovado em 2006 (JO C 139 de 14.6.2006) (ver ficha 1.4.3). A respetiva rubrica 2, «Conservação e gestão dos recursos naturais», compreendia o orçamento agrícola e rural, o ambiente e a pesca (413 mil milhões de EUR a preços correntes, ou seja, 42,3 % das dotações de autorização globais para a UE-27). A revisão das disposições de financiamento da PAC inscreveu-se também nos debates de preparação das perspetivas financeiras 2007-2013.

  • O Regulamento (CE) n.º 1290/2005 (JO L 209 de 11.8.2005, p. 1) dividiu o FEOGA em dois fundos distintos, a saber, o Fundo Europeu Agrícola de Garantia (FEAGA) e o Fundo Europeu Agrícola de Desenvolvimento Rural (FEADER). O FEAGA financia ou, por vezes, cofinancia com os Estados-Membros as despesas da organização comum de mercado (OCM) (ver ficha 3.2.5), os apoios diretos às explorações (ver ficha 3.2.6), a contribuição da União para as ações de informação e promoção dos produtos agrícolas no mercado interno e nos países terceiros, bem como diversas despesas pontuais da União, tais como as ações veterinárias e de recolha e utilização de recursos genéticos.
  • O Regulamento (CE) n.º 1290/2005 foi acompanhado pelo Regulamento (CE) n.º 1698/2005 (JO L 277 de 21.10.2005) relativo ao apoio ao desenvolvimento rural pelo FEADER, devido às especificidades financeiras e de programação do segundo pilar da PAC (ver ficha 3.2.7). O FEADER cofinancia o reforço da competitividade dos setores agrícola e florestal, as medidas agroambientais, a melhoria da qualidade de vida nas zonas rurais e o incentivo à diversificação da economia rural, bem como a constituição de capacidades locais (Iniciativa «Leader») (ver ficha 3.2.7).

A secção «Garantia» figurou sempre entre as despesas obrigatórias (DO) do orçamento comunitário que decorrem diretamente do Tratado ou dos atos adotados por força deste. Por outro lado, as despesas do FEOGA-Orientação estavam classificadas na sua totalidade como não obrigatórias (DNO). Até à entrada em vigor do Tratado de Lisboa (ver ficha 3.2.1), o Conselho, primeiro ramo da autoridade orçamental da UE, teve tradicionalmente a última palavra sobre as DO no processo de elaboração do orçamento anual. Em contrapartida, o Parlamento Europeu detinha o poder de decisão sobre as DNO no limite de um limiar máximo de aumento, o qual é calculado pela Comissão com base em parâmetros económicos. De acordo com o TFUE (ver ficha 3.2.1), esta distinção foi eliminada e, a partir de agora, os dois ramos da autoridade orçamental (Parlamento Europeu e Conselho) decidem conjuntamente sobre a totalidade das despesas agrícolas.

No que diz respeito ao período 2014-2020, o Parlamento Europeu aprovou, em 19 de novembro de 2013 (resoluções P7_TA(2013)0455 e P7_TA(2013)0456, JO C 436 de 24.11.2016], o regulamento sobre o novo Quadro Financeiro Plurianual [Regulamento (UE, Euratom) n.º 1311/2013, JO L 347 de 20.12.2013] e o Acordo Interinstitucional sobre a boa gestão financeira (JO C 373 de 20.12.2013). O Quadro Financeiro Plurianual 2014-2020 fixou um orçamento total para a rubrica «Preservação e gestão dos recursos naturais» (incluindo a PAC) de 373,17 mil milhões de EUR expressos a preços de 2011, ou seja, 38,9 % das dotações de autorização globais para a UE-28. O Quadro Financeiro Agrícola 2014-2020 foi modificado em 2015, na sequência das transferências entre os dois pilares da PAC acordados pelos Estados-Membros [Regulamento de execução (UE) n.º 2015/141 (JO L 24 de 30.1.2015)]. O orçamento da PAC para 2014-2020 finalmente estabelecido afetou 291,273 mil milhões de EUR aos pagamentos diretos (71,3 % do total da PAC), 99,587 mil milhões de EUR ao desenvolvimento rural (24,4 %) e 17,453 mil milhões de EUR às medidas de mercado (OCM) (4,3 % do total). No total, as despesas agrícolas ascenderam a 408,313 mil milhões de EUR para o período 2014-2020.

No que diz respeito ao período 2021-2027, os colegisladores aprovaram, em dezembro de 2020, o regulamento sobre o novo Quadro Financeiro Plurianual (Regulamento (UE, Euratom) n.º 2020/2093) e o Acordo Interinstitucional sobre a boa gestão financeira (JO L 433 I de 22.12.2020). Consequentemente, a partir de 1 de janeiro de 2021, são disponibilizados 378 532,3 milhões de EUR (a preços correntes) aos beneficiários da PAC, o que representa 31 % do orçamento total da UE [ver quadro infra — linhas 3) e 5)]. As medidas de desenvolvimento rural da PAC beneficiarão de recursos adicionais provenientes do programa «Next Generation EU» (NGEU) para financiar a recuperação económica e social na sequência da crise da COVID-19 (8 070,5 milhões de EUR) [ver quadro infra — linha 2.b)]. O montante total das autorizações da PAC para o período 2021-2027 ascende, por conseguinte, a 386 602,8 milhões de EUR [ver quadro infra — linha 6)].

ORÇAMENTO DA PAC UE-27 (Dotações de autorização – milhões de EUR a preços correntes) (A)
Ano de 2021
(B)
Quadro Financeiro Plurianual
2021-2027 (QFP)
 
% (B)
 
1) PILAR I DA PAC
Pagamentos diretos (DP) e medidas nos mercados agrícolas
 
40 368,0
 
290 534,0
 
76,8
2) PILAR II DA PAC
2.a) Medidas de desenvolvimento rural (DR) ao abrigo do QFP
2.b) Medidas adicionais de desenvolvimento rural ao abrigo do Next Generation EU (NGEU, instrumento temporário de recuperação)
 
15 345,0
 
2 387,7
 
87 998,3
 
8 070,5
 
23,2
 
---
 
3) TOTAL DA PAC 2021-2027 UE - 27 [1) + 2.a.)] 55 713,0 378 532,3 100
4) TOTAL DAS AUTORIZAÇÕES DA UE 168 496,0 1 221 719,5 ---
5) % da PAC [3) / 4)] 33,1 31,0 ---
6) TOTAL PAC: QFP 2021-2027 + NGEU 2021-2022 [1) + 2.a) + 2.b)] 58 100,7 386 602,8 ---
7) TOTAL QFP 2021-2027 + NGEU 2021-2022 333 108,9 1 642 788,7 ---
8) % da PAC [5) / 6)] 17,4 23,5 ---

A. Panorâmica

O orçamento da União para 2021 prevê um total de 168,5 mil milhões de EUR de dotações de autorização. Em 2021, a PAC representa 33,1 % do orçamento da UE-27 (55,71 mil milhões de EUR). Os pagamentos diretos e as medidas de mercado (primeiro pilar da PAC) representam 76,8 % das dotações agrícolas (40,4 mil milhões de EUR) e as medidas de desenvolvimento rural (segundo pilar) 23,2 % (15,3 mil milhões de EUR [ver quadro supra — coluna A)].

A parte das despesas agrícolas no orçamento da União Europeia tem registado um decréscimo desde há vários anos. Enquanto no início dos anos 1980 a PAC representava 66 % do orçamento da União, no período 2014-2020 ascendeu a apenas 37,8 % e, no último período relativo a 2021-2027, representa 31 %. A partir de 1992, data da primeira grande reforma da PAC e do aumento em flecha das ajudas diretas, as despesas agrícolas mantiveram-se estáveis em termos reais, à exceção dos anos 1996 e 1997 (devido à crise das «vacas loucas» e à adesão de três novos Estados-Membros). Por conseguinte, o custo orçamental da PAC relativamente ao rendimento nacional bruto (RNB) da União diminuiu de 0,54 % em 1990 para 0,32 % previstos para os anos compreendidos entre 2021 e 2027.

B. Repartição das despesas por categoria e por setor

As despesas do primeiro pilar (43,9 mil milhões de EUR, segundo o último relatório financeiro publicado em 2019) são compostas, até 94 %, por ajudas diretas atribuídas aos agricultores (41,33 mil milhões de EUR) [ver ficha 3.2.3, quadro V, coluna 1, alíneas a) e b)]. O aumento exponencial das ajudas diretas a partir de 1992 tem por contrapartida uma redução paralela das outras despesas do FEOGA-Garantia/FEAGA: os subsídios à exportação praticamente desapareceram em 2019 e as demais intervenções no mercado (armazenamento, ações de promoção e de informação, programas de distribuição a favor das escolas) não ultrapassam os 2,6 mil milhões de EUR (6 % do total) (ver ficha 3.2.5, quadro 1).

C. Repartição por país e por tipos de explorações

Como se pode ver no quadro V relativo ao exercício orçamental de 2019 (ver ficha 3.2.3), a França é a primeira beneficiária da PAC (17,3 %), seguida da Espanha (12,4 %), da Alemanha (11,2 %) e da Itália (10,4 %). No que diz respeito ao FEADER, os principais beneficiários são a França e a Itália (14,9 % e 10,4 %, respetivamente, dos pagamentos efetivos em 2019), seguindo-se-lhes a Alemanha (9,2 %) e a Espanha (8,4 %). Convém assinalar a influência relativa dos novos Estados-Membros (UE-13) no FEAGA (26,8 % em 2019). Em contrapartida, estes países recebem já uma parte assinalável do FEADER (32,2 %), no âmbito da prioridade atribuída à modernização das estruturas agrícolas e ao desenvolvimento das zonas rurais.

O quadro V, coluna 2 (ver ficha 3.2.3) ilustra também a distribuição desigual das ajudas diretas da PAC ao nível das explorações: 74,9 % dos beneficiários da PAC da UE-28 receberam em 2019 menos de 5 000 EUR anuais, com um montante total equivalente a 15,1 % do total das ajudas diretas pagas pelo FEAGA. Em contrapartida, uma percentagem mínima de explorações (121 844 de um total de 6,3 milhões, ou seja, 1,93 %) recebe mais de 50 000 EUR, totalizando um montante que equivale a 12,67 mil milhões de EUR (30,6 % do total das ajudas diretas pagas em 2019). Os países com uma percentagem mais acentuada de grandes explorações (ou empresas) agrícolas que beneficiam da PAC são a Dinamarca, o Reino Unido, a República Checa, a Eslováquia e a França. Esta situação suscita problemas quanto à legitimidade da ajuda à luz dos princípios aplicados a todos os cidadãos (progressividade fiscal, luta contra as desigualdades e recuperação económica e social devido à pandemia).

O papel do Parlamento Europeu

Os Acordos Interinstitucionais de 1988, de 1993, de 1999 e de 2006 permitiram ao Parlamento Europeu ter maior influência nas despesas obrigatórias. As longas negociações sobre o Regulamento relativo ao Quadro Financeiro Plurianual para 2014-2020 levaram à conclusão de um acordo em novembro de 2013. Tirando partido da influência que lhe confere a necessidade de dar a sua aprovação em plenário, o Parlamento pôde aumentar a flexibilidade na gestão das rubricas, reforçar a unidade do orçamento, assegurar a mobilização imediata pelos Estados-Membros das dotações por liquidar do orçamento de 2013 ou aumentar as dotações afetadas à rubrica 1 (Competitividade) [resoluções P7_TA (2013) 0455 e P7_TA (2013) 0456]. Por seu turno, a Comissão da Agricultura e do Desenvolvimento Rural melhorou alguns aspetos financeiros da nova PAC, na sequência dos últimos trílogos que tiveram lugar em setembro de 2013.

A primeira proposta de quadro financeiro plurianual para o período pós-2020 (sem o Reino Unido) foi apresentada em 2 de maio de 2018. Este projeto de orçamento de longo prazo foi substituído, em maio de 2020, por uma segunda proposta, reforçada pelo plano «Next Generation EU», de molde a assegurar que os fundos da UE possam contribuir de forma mais eficaz para reparar os danos económicos e sociais causados pela pandemia de COVID-19. O Parlamento Europeu definiu a sua posição nas suas resoluções de 14 de novembro de 2018 (P8_TA (2018) 0449), de 23 de julho de 2020 (P9_TA (2020) 0206) e de 17 de dezembro de 2020 (P9_TA (2020) 0360). Após um longo processo de negociação entre os dois ramos da autoridade orçamental, foi alcançado um acordo em 17 de dezembro de 2020.

 

Vera Milicevic / Stephanie DUPONT